ASCO GU 2018

STAMPEDE: quimioterapia, terapia hormonal e qualidade de vida no câncer de próstata

Denis Jardim NET OKUma nova análise do estudo clínico STAMPEDE demonstrou que a adição do quimioterápico docetaxel à terapia hormonal para câncer de próstata avançado melhora a qualidade de vida e diminui a necessidade de terapias subsequentes. Os resultados foram apresentados no 2018 Genitourinary Cancers Symposium, em San Francisco, Califórnia. O oncologista Denis Jardim (foto), médico do Hospital Sírio Libanês e membro do LACOG GU, comenta o trabalho.

“Esse estudo complementa as análises prévias do estudo STAMPEDE com o braço experimental de docetaxel adicionado à deprivação androgênica. Anteriormente, os autores haviam demonstrado o ganho em sobrevida global para a população M0 e em sobrevida livre de progressão tanto para a população M0 quanto M1. Nessa análise, demonstrou-se também o ganho em qualidade de vida ajustada bem como a custo-efetividade para ambas as populações com a adoção precoce de docetaxel”, afirma Jardim.

Uma análise em 2016 mostrou que os 592 homens do estudo que receberam docetaxel viveram, em média, 10 meses mais do que os homens submetidos ao tratamento padrão. Este relatório atual é uma análise econômica da saúde que avaliou a qualidade de vida relacionada à saúde e a relação custo-benefício da adição de docetaxel e prednisolona à terapia hormonal, em comparação com a terapia hormonal isolada (padrão de cuidados).

"Para os homens com câncer de próstata que não tinham metástase, a adição de docetaxel à terapia hormonal reduziu o risco de recorrência em 40%, o que melhora a qualidade de vida e economiza custos para o tratamento da recorrência do câncer", disse o autor principal do estudo, Nicholas D. James, professor de oncologia clínica da Universidade de Birmingham, Reino Unido.

Métodos

Os resultados e custos de saúde no National Health Service do Reino Unido foram modelados usando o EuroQol (EQ-5D) e os dados de uso de recursos coletados no estudo STAMPEDE, que inscreveu homens com câncer de próstata avançado iniciando a terapia hormonal de primeira linha. O padrão de cuidados foi terapia hormonal por ≥2 anos e radioterapia em alguns pacientes. Docetaxel (75 mg/m2) foi administrado juntamente com o padrão de cuidados por seis ciclos de três semanas com prednisolona 10 mg por dia.

Os pesquisadores solicitaram aos participantes que classificassem, em uma escala de cinco pontos, cinco aspectos de sua saúde: mobilidade, capacidade de cuidar de si mesmos, capacidade de realizar suas atividades diárias usuais, seus níveis de dor e desconforto e seus níveis de ansiedade e depressão. Com base nesses relatórios, os autores foram capazes de modelar mudanças na duração da sobrevida prevista; nos anos de vida ajustados à qualidade (QALY); e os índices incrementais de custo-efetividade, que também se baseia em QALY, pois avalia o custo-benefício de um tratamento.

Resultados

Comparado com os pacientes alocados ao padrão de cuidados, a sobrevida prevista com docetaxel em pacientes com doença metastática que se espalhou para órgãos fora da pelve (doença M1) foi 0,89 anos mais longa em comparação com homens que receberam apenas terapia hormonal, e a qualidade de vida foi preservada por mais 0,51 anos. Em pacientes M0, a sobrevida prevista foi 0,78 mais longa, e a qualidade de vida foi preservada por mais 0,39 anos com docetaxel. Os ganhos de QALY em pacientes M0 foram conduzidos pelo efeito benéfico do atraso e redução da recidiva.

Docetaxel também foi considerado custo-efetivo tanto em pacientes M1 (ICER = £ 5.514/QALY vs. Padrão de cuidados) como M0 (QALYs mais altos, custos mais baixos versus padrão de cuidados). A análise de sensibilidade probabilística indicou uma probabilidade muito alta (> 99%) de que o docetaxel é custo-efetivo em pacientes com M0 e M1. Docetaxel manteve-se custo-efetivo em pacientes M0 mesmo quando nenhuma vantagem de sobrevida foi assumida devido a reduções e atrasos na recidiva.

Os autores concluíram que docetaxel melhora a QVRS global, atrasa o tempo e reduz a necessidade de terapia posterior, além de ser custo-efetivo entre pacientes com doença não metastática e metastática.

Os pesquisadores observam que o docetaxel ainda é obrigado a ser utilizado pelo National Health Service, mas em outros países, incluindo os Estados Unidos, a escolha entre o uso de abiraterona ou docetaxel é menos clara, especialmente porque a abiraterona é mais fácil de administrar. Um curso de docetaxel custa por paciente, em média, 5 mil libras/ano, em comparação com 24 mil libras/ano para abiraterone.

Segundo Jardim, uma importante limitação da análise é que os cálculos de custo-efetividade estão baseados no sistema de saúde do Reino Unido, incluindo suas diretrizes de atendimento e custo de medicações e intervenções. “Como em qualquer análise desta natureza, os resultados não são facilmente transponíveis para a prática clínica brasileira. No entanto, o conceito mais amplo de que a utilização precoce de medicações efetivas por um prazo de tempo definido pode prevenir a utilização futura de recursos em saúde com o tratamento de complicações e adoção de terapias subsequentes, parece bastante relevante”, diz o especialista.

"Atualmente, no mesmo cenário de câncer de próstata metastático sensível a castração, temos a aprovação da abiraterona, inclusive no Brasil. Nesse sentido, uma análise de custo efetividade destas opções seria de grande valia nos diversos sistemas brasileiros (públido e privado) para auxiliar nas futuras tomadas de decisões por oncologistas e instituições”, conclui.

O estudo foi financiado pela Cancer Research UK e pelo Medical Research Council, Reino Unido.

Informação do ensaio clínico: ISRCTN78818544.

Referência:  Abstract 162 - Addition of docetaxel to first-line long-term hormone therapy in prostate cancer (STAMPEDE): Long-term survival, quality-adjusted survival, and cost-effectiveness analysis.- Nicholas James et al - Citation: J Clin Oncol 36, 2018 (suppl 6S; abstr 162)