ESMO: diretrizes para sequenciamento de próxima geração em tumores metastáticos

RODRIGO GUINDALINI ASCO2018 NET OKA Sociedade Europeia de Oncologia Médica (ESMO) publicou recomendações sobre o uso de sequenciamento de próxima geração (NGS) para pacientes com câncer metastático. “Este manuscrito traz pela primeira vez o posicionamento de uma Sociedade Médica sobre a utilização racional do NGS em pacientes com câncer metastático, levando em consideração pontos críticos como nível de evidência para acionabilidade clínica de alvos terapêuticos, custo-efetividade e utilidade pública”, afirma Rodrigo Guindalini (foto), oncologista e oncogeneticista da Oncologia D’Or. O trabalho foi publicado no Annals of Oncology.

O ESMO Translational Research and Precision Medicine Working Group desenvolveu as recomendações com base na classificação da ESMO Scale for Clinical Actionability of molecular Targets (ESCAT) para alterações genômicas que ocorrem nos oito cânceres responsáveis ​​pela maioria das mortes em todo o mundo. Para cada tipo de tumor, os especialistas utilizaram a classificação ESCAT e a prevalência de alterações para calcular o número de pacientes que precisariam ser testados com NGS para identificar um paciente com recomendação de um medicamento eficaz na prática diária.

Segundo o documento, em uma perspectiva de saúde pública, o NGS deve ser utilizado rotineiramente em pacientes com tumores metastáticos de pulmão, próstata, ovário e colangiocarcinoma.

No câncer de pulmão de células não pequenas não escamoso avançado, os autores recomendam a avaliação NGS a fim de detectar alterações de nível I. Como o câncer de pulmão apresenta algumas alterações de nível II-IV, o Painel de Especialistas sugere a realização de sequenciamento multigênico no contexto de programas de rastreamento molecular. O documento também recomenda a utilização do NGS em tumores de ovário, onde as mutações somáticas BRCA1/2 estão associadas a um benefício aumentado dos inibidores de PARP.

No colangiocarcinoma avançado, o uso do painel NGS multigênico é recomendado para detectar alterações acionáveis ​​de nível I, com a ressalva de que é improvável que a estratégia tenha uma boa relação custo-benefício. “Painéis maiores podem ser utilizados ​​apenas com base em acordos específicos com pagadores, levando em consideração o custo geral da estratégia, incluindo o uso off-label de medicamentos”, destaca o guideline. A mesma orientação vale para as alterações genômicas no câncer de próstata avançado classificadas de acordo com ESCAT, em que o uso de NGS é indicado em países onde os inibidores da PARP são acessíveis para pacientes selecionados. “Nesses casos, é recomendado realizar NGS em amostra de tumor para avaliar o status mutacional de, pelo menos, BRCA1/2. Resultados preliminares de estudo de Fase III com inibidores de AKT em pacientes com alterações de PTEN também sugerem que esse gene possa ser adicionado ao painel”, afirmam.

Nos outros tumores avançados avaliados - câncer de mama, colorretal, gástrico, pâncreas e hepatocelular – a realização de NGS não é recomendada na prática diária. Nesses tumores, o guideline ressalta que a maior parte das mutações podem ser determinadas por exames mais custo-efetivos. “Devido ao alto número de alterações de nível II, é importante incluir pacientes em programas de triagem molecular e ensaios clínicos que testam terapias direcionadas a alterações genômicas”, afirma os autores.

O guideline também endereça suas recomendações para o ambiente de pesquisa clínica, recomendando que os centros de pesquisa realizem NGS para gerar mais evidências sobre o uso do método e acelerar o desenvolvimento de medicamentos. "Para melhorar a compreensão de como tratar pacientes com base em biomarcadores de precisão, hospitais universitários e instituições de pesquisa devem gerar dados e torná-los acessíveis para o avanço da inovação, nos permitindo aprender a melhor forma de usar essa tecnologia em outros tipos de tumor", destaca o documento.

Em relação ao custo-benefício do uso de sequenciamento multigênico na prática diária, os autores reconhecem que a evidência atual é fraca. Nesse sentido, a ESMO recomenda que grandes painéis de genes podem ser usados ​​se gerarem um aumento aceitável no custo geral, incluindo os medicamentos. “Considerando que os resultados dos painéis do NGS podem levar à prescrição de medicamentos caros fora de suas indicações aprovadas, os volumes dos procedimentos do NGS devem ser regulamentados em nível nacional”, dizem. O Painel de Especialistas ressalta que o uso de medicamentos off-label combinados com genômica seja feito apenas se um programa de acesso e um procedimento de tomada de decisão tiverem sido desenvolvidos em nível nacional ou regional.  

Segundo Guindalini, fica claro quais são os melhores cenários em que se deve utilizar esta nova tecnologia, como, por exemplo, câncer de pulmão de células não pequenas não escamoso avançado. “Essas recomendações são baseadas nas publicações mais recentes sobre oncologia de precisão e refletem o estado da arte do conhecimento em 2020; ‘work in progress’ é o termo que devemos utilizar para esta importante iniciativa, uma vez que avanços no conhecimento da oncogenética e no desenvolvimento de medicamentos irão modificar o acionabilidade clínica de alvos terapêuticos e adicionar novos fármacos ao nosso arsenal nos próximos anos”, conclui.

Referência: Mosele F, Remon J, Mateo J, et al. Recommendations for the use of next-generation sequencing (NGS) for patients with metastatic cancers: A report from the ESMO Precision Medicine Working Group. Ann Oncol. 2020.