Incidência de câncer de mama em mulheres jovens no Brasil

tiezzi bxDaniel Tiezzi (foto), professor associado da Universidade de São Paulo, em Ribeirão Preto, é autor sênior de estudo que explora a incidência, as características de apresentação e os desfechos do câncer de mama em mulheres jovens no Brasil. Os resultados foram publicados no JCO Global Oncology.

“O rastreamento do câncer de mama não é recomendado para mulheres jovens (<40 anos). Portanto, as pacientes diagnosticadas em idade mais jovem têm maior propensão a apresentar doença avançada e metastática, o que reduz os resultados do tratamento”, observa a publicação.

No estudo retrospectivo, os autores analisaram dados epidemiológicos de câncer de mama no Brasil de três bancos de dados disponíveis publicamente e uma coorte de um hospital universitário, e compararam os resultados com o sistema de estadiamento de banco de dados SEER dos Estados Unidos.

Estatísticas descritivas foram realizadas sobre a prevalência da doença e a distribuição dos estágios entre os grupos etários. A incidência foi estimada usando a razão de incidência padronizada por idade. O impacto da idade na sobrevida específica da doença também foi analisado.

Resultados

Os dados de prevalência de câncer de mama invasivo por faixa etária revelaram que 4,4% e 20,6% das pacientes tinham <35 e <45 anos, respectivamente. Nos Estados Unidos, essa prevalência foi de 1,85% e 11,5%, respectivamente (odds ratio [OR], 2,2; P <0,0001). O percentual de doença localizada e metastática foi maior no Estado de São Paulo (Fundação Oncocentro de São Paulo [FOSP]) em comparação com os Estados Unidos (45% e 9,8% v 29% e 5,7%, respectivamente; P <0,0001).

Na FOSP, a prevalência de doença localizada e metastática foi maior entre as pacientes jovens (53,5% e 11,3%, respectivamente). O tamanho médio do tumor em pacientes <40 anos foi maior (25,0 mm × 20,9 mm; P <0,0001), e as pacientes jovens apresentaram maior risco de linfonodos positivos ao diagnóstico (OR, 1,5; P = 0,004) e maior proporção de tumores luminais-B e triplo-negativos.

Além disso, essas pacientes jovens apresentaram baixa sobrevida específica da doença devido o diagnóstico em estágio avançado e subtipos de câncer de mama mais agressivos (HER2+ e triplo-negativo; P <0,0001).

Os resultados demonstram maior prevalência de câncer de mama em mulheres jovens (<40 anos) no Brasil. “Nosso estudo sugere que a alta prevalência de câncer de mama em mulheres jovens no Brasil pode estar relacionada com um aumento da incidência da doença nesta população. Não sabemos ao certo qual o motivo que leva ao aumento da incidência do câncer de mama em mulheres jovens em nosso país. Fatores hereditários/familiares foram pouco estudados e os aspectos ambientais são de difícil exploração”, observa Tiezzi. “Estamos desenvolvendo um estudo para coleta de dados online da população feminina com o objetivo de rastrear a magnitude do padrão familiar da doença. O projeto está em fases finais de elaboração e pretendemos disponibilizar o questionário online em breve”, acrescenta.

Outro fato relevante apontado pelo especialista diz respeito à análise de dados da coorte do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP, que compreende mais de 1.900 casos tratados com um seguimento de longo prazo. “Observamos que a sobrevida de mulheres jovens é inferior, e esta diferença é muito influenciada pelo diagnóstico tardio. Esta população é de difícil rastreamento, tanto pela baixa sensibilidade dos métodos tradicionais, como pelo custo e complexidade de incluir metodologias de maior acurácia como a ressonância magnética. No entanto, investimentos em melhorias ao acesso ao sistema de saúde, na conscientização da população sobre o problema e no treinamento dos agentes de saúde seriam ações viáveis para reduzir o número de casos avançados e metastáticos”, avalia.

“O investimento na detecção precoce de casos sintomáticos parece ser urgente. É necessário primeiramente cuidar do grande número de mulheres sintomáticas, mas ainda sem doença avançada, para depois ser implementado um programa de detecção da doença subclínica”2, conclui Tiezzi.

Referência:  

1 - Epidemiological Analyses Reveal a High Incidence of Breast Cancer in Young Women in Brazil - Leonardo Fleury Orlandini, MD1; Maria Vitória do Nascimento Antonio2; Claiver Renato Espreafico Jr2; Priscila Longhin Bosquesi, PhD2; Omero Benedito Poli-Neto, MD, PhD1; Jurandyr Moreira de Andrade, MD, PhD1; Francisco José Cândido dos Reis, MD, PhD1; and Daniel Guimarães Tiezzi - DOI: 10.1200/GO.20.00440 JCO Global Oncology no. 7 (2021) 81-88. Published online January 12, 2021.

2 - Tiezzi, Daniel Guimarães. (2013). Rastreamento do câncer de mama no Brasil: ainda há tempo para refletirmos. Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia, 35(9), 385-387. https://doi.org/10.1590/S0100-72032013000900001