O oncologista André Murad (foto) discute estudo publicado na Nature Medicine que identificou cepas específicas de bactérias intestinais que estão associadas a uma resposta positiva à imunoterapia combinada. Confira, em mais um tópico da coluna ‘Drops de Genômica’.
Por André Marcio Murad*
Um novo estudo, o maior já publicado, realizado por pesquisadores do Instituto de Pesquisa do Câncer Olivia Newton-John, na Austrália, identificou cepas específicas de bactérias intestinais que estão associadas a uma resposta positiva à imunoterapia combinada.
O estudo foi publicado recentemente na revista Nature Medicine e detalha uma coleção de assinaturas de microrganismos nas bactérias intestinais de um indivíduo que pode ajudar a identificar aqueles que se beneficiariam da imunoterapia combinada e também a explicar por que a eficácia deste tratamento é difícil de se prever.
Estudos anteriores sugeriram que existe uma relação entre a composição da microbiota intestinal de um paciente com câncer e a resposta clínica a inibidores de checkpoints imunológicos; no entanto, definir biomarcadores baseados em microbiomas que se generalizem entre coortes tem sido um desafio.
O estudo utilizou amostras coletadas em um grande ensaio clínico australiano multicêntrico, onde a imunoterapia combinada foi eficaz em 25% das pessoas com uma ampla gama de cânceres raros avançados, incluindo cânceres ginecológicos raros, neoplasias neuroendócrinas e cânceres gastrointestinais superiores e biliares. O ensaio clínico concentrou-se em inibidores de checkpoint PD-1/PD-L1 e CTLA-4.
Os pesquisadores utilizaram amostras de fezes de pacientes de ensaios clínicos e realizaram um sequenciamento metagenômico profundo para mapear todos os organismos dentro dos microbiomas dos participantes. Múltiplas cepas de bactérias naqueles que responderam bem ao tratamento foram então caracterizadas, muitas das quais não que haviam sido cultivadas antes. Isto permitiu aos investigadores identificar uma assinatura do microbioma encontrada em pacientes que responderam bem ao tratamento. Uma meta-análise de estudos anteriores foi também realizada, a qual corroborou que essa assinatura pode ser aplicada a diferentes cânceres, e entre vários distintos países, para que se prevejam indivíduos cujos cânceres serão capazes de responder à imunoterapia combinada (anti-PD-1/anti-CTLA-4).
No entanto, quando aplicado a pacientes que receberam apenas um dos medicamentos de imunoterapia, como os os inibidores de PD-1, o modelo de aprendizagem automática não conseguiu identificar aqueles que responderiam ao tratamento. Isto sugere que a relação entre a microbiota intestinal e a resposta ao tratamento é específica para combinações terapêuticas específicas.
O estudo demostrou assim que a compreensão do microbioma em nível de cepa, não apenas em nível de espécie, e pode então abrir um novo nível de medicina personalizada. Ter essa resolução extra é crucial se quisermos compreender a interação entre o tratamento imunoterápico do câncer e o microbioma. Ser capaz de testar os mecanismos específicos desta relação entre cepas específicas de bactérias e a resposta é o próximo horizonte desta investigação, que poderá então beneficiar sobremaneira os pacientes, evitando o uso ineficaz desta terapia para os não-respondedores.