Onconews - Impacto das assinaturas imunológicas na sobrevida de pacientes com glioblastomas

Martin Bonamino NET OKPublicado na revista Oncoimmunology, estudo de pesquisadores brasileiros avalia o impacto das assinaturas imunológicas na sobrevida de pacientes com glioblastomas. Em artigo exclusivo, os autores do trabalho Martín Bonamino (foto), pesquisador do Instituto Nacional de Cancer (INCA) e da Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ), e Guido Lenz, professor na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), comentam os principais resultados.

Por Martín Bonamino e Guido Lenz

O sistema nervoso central é tido como um tecido privilegiado do ponto de vista imunológico no qual tende a ocorrer baixo recrutamento de células imunológicas.

Um dos tumores mais frequentes no sistema nervoso central são os gliomas. Os glioblastomas, formas mais agressivas de gliomas, são caracterizados por apresentarem baixas quantidades de mutações quando comparados a outros tumores, como melanomas e tumores de pulmão ou bexiga. Os tumores com maior carga mutacional tendem a ser reconhecidos de forma mais eficiente pelo sistema imune, uma vez que possuem maiores coleções de neo antígenos.

A localização anatômica e a baixa carga de mutação fazem com que os glioblastomas sejam considerados tumores em que a contribuição do sistema imune é relativamente pequena, e ambígua, podendo tanto auxiliar quanto combater o desenvolvimento do tumor. As interações do sistema imune com os glioblastomas são, portanto, muito pouco estudadas, evidenciando uma lacuna no nosso conhecimento acerca destes tumores.

Através de uma colaboração entre o INCA e a UFRGS, unindo o grupo liderado pelo Dr. Martín Bonamino focado no estudo de imunologia de tumores e imunoterapia ao grupo liderado pelo Dr. Guido Lenz, focado no estudo de mecanismos de resistência de glioblastomas às terapias, foi iniciado um projeto de caracterização imunológica dos padrões de expressão gênica em glioblastomas.

Esse estudo, que resultou na dissertação da aluna Mariana Brutschin Pereira no Programa de Biologica Celular e Molecular da UFRGS, consistiu na análise de dados de expressão gênica dos glioblastomas de 524 pacientes cujas informações foram depositadas na plataforma TCGA (The Cancer Genome Atlas). Nesta análise foi verificado que algumas assinaturas gênicas associadas a mecanismos de exaustão e também sub- populações de leucócitos podiam ser associadas em clusters, indicando que estas células atuam de forma orquestrada no tumor.

Outro achado importante foi que assinaturas de expressão gênica isoladas, como a caracterização da presença e abundância de mecanismos de exaustão ou da presença de componentes celulares isolados (como células T reguladoras, células mielóides supressoras ou linfócitos T CD8+) não apresentavam qualquer impacto no prognóstico dos pacientes quando analisados isoladamente. No entanto, quando foram combinadas informações destas assinaturas gênicas, foi possível identificar pacientes que se beneficiaram da terapia à qual os pacientes foram submetidos.

Os achados desta pesquisa, publicada em fevereiro de 2018 no periódico Oncoimmunology, indicam que há uma abundância de células imunes no microambiente dos glioblastomas maior do que previamente suposto. Foi evidenciado também que alguns tipos de células imunológicas, como um conjunto composto por linfócitos Th1, células NK, células NKT e perfis de exaustão, ou um segundo conjunto composto de células mielóides supressoras, células T reguladoras e macrófagos, são capazes de contrabalancear ações anti-tumorais de um cluster composto por linfócitos T CD4+ e CD8+. Este contraponto imunológico leva à supressão da resposta anti-tumoral, permitindo aos tumores se desenvolverem com menor pressão do sistema imune. Os dados evidenciaram também que os pacientes que têm maior abundância na expressão de genes que compõe este conjunto de meta-assinaturas imunológicas inibitórias são os que mais se beneficiam da quimioterapia com agentes alquilantes, uma das terapias utilizadas para o tratamento dos glioblastomas. Este resultado indica que a quimioterapia utilizada pode ajudar a reverter esta inibição da resposta imune antitumoral no tumor, favorecendo a resposta dos tumores ao tratamento e impactando na sobrevida dos pacientes. Os resultados foram validados em uma segunda coorte independente, confirmando os achados.

Os glioblastomas são tumores extremamente agressivos com baixos índices de resposta aos tratamentos de uso corrente, que consistem em quimio e/ou radioterapia. Os resultados deste trabalho colocam o sistema imune como um relevante ator no processo de progressão dos glioblastomas evidenciando o papel da quimioterapia na alteração da resposta imune contra estes tumores e contribuindo para o conceito de que manipulações terapêuticas que interfiram na resposta imune podem beneficiar os pacientes com este tumor extremamente agressivo. Estes dados contribuem, portanto, para a recente noção de que tumores do sistema nervoso central também podem se beneficiar de imunoterapias, entendimento que, de alguma forma, contrapõe o senso comum atual de que respostas imunológicas acontecem de forma pouco eficiente no sistema nervoso central.

O projeto foi financiado pelo Ministério da Saúde e pelo projeto ICGEB/CNPq.

Referência:  Transcriptional characterization of immunological infiltrates and their relation with glioblastoma patients overall survival - Mariana Brutschin Pereira, Luciana Rodrigues Carvalho Barros, Paula A. Bracco, Alvaro Vigo, Mariana Boroni, Martín Hernán Bonamino & Guido Lenz - Article: e1431083 | Received 17 Aug 2017, Accepted 12 Jan 2018, Accepted author version posted online: 23 Jan 2018, Published online: 12 Feb 2018 - https://doi.org/10.1080/2162402X.2018.1431083