O rastreamento populacional para a prevenção secundária do câncer de próstata integrou o programa científico do 4º Simpósio Internacional do Grupo Oncoclínicas, em apresentação do urologista Lucas Nogueira (foto).
Em 2012, a recomendação norte-americana de não indicar o rastreamento populacional para a prevenção secundária do câncer de próstata acabou por alimentar polêmicas e até hoje desperta dúvidas entre especialistas e responsáveis por políticas públicas. Afinal, qual a evidência?
“Existem ainda muitas controversias em relação ao rastreamento do câncer de próstata”, lembrou Nogueira, coordenador do Departamento de Urologia Oncológica do HC/UFMG e presidente da Sociedade Brasileira de Urologia Secção Minas Gerais (SBU/MG), em sessão que debateu os prós e contras do screening.
Resultados do estudo americano PLCO (Prostate, Lung, Colorectal and Ovarian trial) embasaram a decisão da USPSTF com o argumento do overtreatment e os riscos associados, como incontinência urinária e impotência sexual.
No entanto, o European Randomized Study of Screening for Prostate Cancer mostrou evidências de que o teste do PSA está associado com uma redução substancial da mortalidade por câncer de próstata ao longo do tempo, contrariando as conclusões do estudo PLCO.
Trabalho apresentado em 2015 no Genitourinary Cancers Symposium da ASCO e publicado este ano no New England Journal of Medicine mostrou que após a recomendação da Task Force houve um aumento de 3% ao ano no diagnóstico de tumores de risco intermediário e alto risco. O estudo apontou limitações na metodologia do estudo PLCO e mostrou redução no número de diagnóstico de tumores de próstata agressivos, o que amplia a preocupação de que o diagnóstico tardio pode representar pior resultado oncológico no futuro em pacientes de risco.
Outro estudo recente reforçou os dados em favor do rastreamento por PSA. Estudo sueco já sugeria que o nível de PSA na meia-idade poderia prever o risco de morte por câncer de próstata. Agora, um trabalho liderado por Mark Preston, da Harvard Medical School confirmou o achado e ampliou a base de evidências, mostrando que o antígeno prostático específico na meia-idade tem valor preditivo e pode orientar novas estratégias de rastreamento oportunista.
"A detecção precoce, quando apropriadamente aplicada em populações específicas de maior risco, pode reduzir a mortalidade por câncer de próstata." |
A partir de dados do “Physicians Health Study”, os pesquisadores de Harvard demonstraram que o risco de desenvolver a doença letal é 8.7 (40-49 anos), 12.6 (50-55 anos) e 6.9 (55-59 anos), maior em homens com níveis de PSA acima do percentil 90 em comparação com aqueles com níveis abaixo da mediana (0.68, 0.88 e 0.96, respectivamente).
Para Nogueira, embora existam riscos de overdiagnosis e overtreatment associados com a triagem, o rastreamento desempenha um papel importante na prevenção de mortes por câncer de próstata como parte de uma abordagem personalizada.
Além de idade, raça e história familiar, uma estratégia ótima de rastreamento envolve a dosagem precoce de PSA, intervalos de triagem individualizados e até mesmo a utilização de marcadores de maior especificidade, dentro de uma abordagem multivariada e adaptada ao risco individual.
“A detecção precoce, quando apropriadamente aplicada em populações específicas de maior risco, pode reduzir a mortalidade por câncer de próstata. O mais importante é distinguir rastreamento populacional de rastreamento oportunista”, recomenda Nogueira.
Assim, o grande saldo da controvérsia é certamente mostrar que o rastreamento universal de toda a população masculina, sem considerar idade, raça e história familiar, não parece ser mesmo a melhor abordagem. No entanto, advogar contra o rastreamento é ignorar a carga da doença. No Brasil, dados do INCA estimam 61,2 mil novos casos da doença ao ano em 2016 e 2017.