Onconews - ASCO GI: custo e acesso na assistência oncológica

dr_gilberto_Bx.jpgO oncologista Gilberto Lopes (foto), diretor médico do Grupo Oncoclínicas, assina artigo em defesa de um modelo mais sustentável para permitir o acesso a cuidados de prevenção e controle do câncer e da hepatite em países pobres e em desenvolvimento. O artigo foi publicado no periódico do 2016 Gastrointestinal Cancers Symposium, na edição inaugural do congresso da ASCO GI.

Dois outros artigos com a participação do especialista foram publicados na edição de janeiro do Journal of Clinical Oncoclogy (JCO), discutindo a disparidade da assistência oncológica entre países de alta, média e baixa renda (doi:10.1200/JCO.2015.62.2860), além de modelos para aplicar recursos de forma mais eficiente em programas de medicamentos essenciais para o tratamento do câncer (doi:10.1200/JCO.2015.61.8736).

Lopes argumenta que uma das muitas estratégias para melhorar o acesso a novas modalidades de tratamento em locais com poucos recursos é o conceito de discriminar preços diferentes para o mesmo produto ou serviço, geralmente com base na capacidade de pagamento dos consumidores e na elasticidade da demanda de diferentes mercados ou segmentos de mercado.

De acordo com o oncologista, os custos de pesquisa e desenvolvimento de novas drogas são geralmente recuperados em mercados de alta renda na América do Norte, Europa ou Japão, o que significa que discriminar preços para realidades distintas pode ajudar a expandir o uso de medicamentos novos e caros em países pobres e em desenvolvimento. 

Políticas de preços diferenciados têm facilitado, por exemplo, a distribuição bem-sucedida de vacinas e medicamentos para Aids. Lopes e colegas utilizaram dados do IMS Health em 2011 e identificaram pequena variação no preço unitário de uma cesta de drogas (contendo oxaliplatina, bevacizumabe, cetuximabe, trastuzumabe, sorafenibe, erlotinibe e gefitinibe) nos mercados do Sudeste Asiático. A variação foi inferior a 20%, apesar da diferença regional ser superior a 30% quando se considera o rendimento nacional bruto per capita (Lopes Gde L Jr, et al. Nat Rev Clin Oncol. 2013;10:314-22).
 
Para Gilberto Lopes, exemplos inspiradores de modelos mais sustentáveis vêm de projetos-piloto como o da GlaxoSmithKline, por exemplo. A companhia instituiu globalmente uma política de preços diferenciados para seus produtos oncológicos, reduzindo os valores de alguns medicamentos (tais como pazopanibe) em até 70% em países de baixa renda na comparação com os preços praticados nos Estados Unidos.
 
Outras empresas, como Eli Lilly, Sanofi-Aventis e Roche também discriminam preços para produtos selecionados, como esclarece Lopes.
 
Outro exemplo citado pelo especialista brasileiro vem do modelo preço-volume, no qual um comprador garante a compra de um maior número de produtos ou serviços em troca de um preço mais baixo por unidade. “Alguns países em desenvolvimento têm utilizado acordos baseados na relação preço-volume para aumentar a disponibilidade de máquinas para radioterapia, vacinas e medicamentos”, ilustra. O oncologista lembrou que em 2014, o governo brasileiro anunciou a compra de 80 aceleradores lineares de Varian Medical Systems, a um custo combinado de R$ 120 milhões (aproximadamente US$ 645.000 por máquina no momento do acordo).

“Infelizmente, a implementação foi adiada devido à atual crise econômica e à falta de investimento em treinamento e instalações, exemplificando as dificuldades que muitas nações enfrentam em termos de burocracia e recursos humanos para o tratamento do câncer”. O oncologista observou, no entanto, que o Brasil diminuiu com sucesso o custo de vacinas contra o HPV para cerca de US$ 8 por dose com processos semelhantes de negociação. 

Compras conjuntas 

Em 2000, a Organização Panamericana de Saúde (OPAS) instituiu o Fundo Estratégico, também conhecido como Fundo Rotativo Regional para Provisões Estratégicas de Saúde Pública. O objetivo da iniciativa é promover a aquisição de medicamentos de alta qualidade e suprimentos essenciais à saúde pública, a preços acessíveis em toda a região.  A iniciativa se ampara na estratégia de estimular compras coletivas e apoio técnico para assegurar medicamentos de melhor qualidade, a menor custo.
 
A lógica demonstrou na prática que tem tudo para ganhar escala. “Em novembro de 2015, uma iniciativa liderada pelo Brasil provou que essa abordagem pode funcionar. Países do Mercosul, bloco que inclui Argentina, Uruguai, Paraguai, Bolívia e Venezuela, concluíram a primeira compra conjunta de medicamentos durante uma reunião de ministros da saúde. É uma  iniciativa sem precedentes no mundo. A estratégia de negociação com as empresas farmacêuticas atingiu descontos de aproximadamente 90% na compra de drogas para a hepatite C, como Sofosbuvir, Daclatasvir e Simeprevir. Uma segunda rodada de aquisição conjunta está prevista para 2016, concentrando-se em quatro medicamentos para tratar o câncer e AIDS”, sinaliza.