Onconews - Promessas e controvérsias da neuro-oncologia

logo SNOLA NET OKA Sociedade Latino-Americana de Neuro-Oncologia (SNOLA) discute o que foi destaque em 2017 nos dois principais congressos– ASCO e SNO - além de apontar as evidência e controvérsias de publicações de alto impacto que marcaram o ano. O artigo é de Caroline Chaul Barbosa, neuro-oncologista do Hospital Sírio Libanês e do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP).

 

OLHO2, tópico SNO: O estudo demonstrou ganho substancial de SG em 4 anos com a adição de lomustina à terapia padrão em pacientes com GBM (esse olho tem que ficar no item1 do SNO)

OLHO EM PUBLICAÇÔES DE IMPACTO, ITEM 1

“Além de não demonstrar aumento de SG, a combinação de bevacizumabe na segunda linha em GBM também não demonstrou melhora na QoL”

O ano de 2017 trouxe estudos bastante promissores em relação ao tratamento de tumores do sistema nervoso central (SNC). Nos dois mais importantes congressos para a Neuro-oncologia, a conferência da SNO e da ASCO, importantes dados em relação a novos tratamentos foram apresentados, além de estudos pré-clinicos que nos possibilitaram aumentar o conhecimento sobre essas patologias.

Aqui, abordaremos os principais destaques do ano em congressos, conferências e publicações, com o objetivo de melhorar nossa prática clínica.

ASCO 2017

Phase 1b open-label randomized study of the oncolytic adenovirus DNX-2401 administered with or without interferon gamma for recurrent glioblastoma. - Frederick F. Lang et al.

DNX-2401 é um adenovírus oncolítico (tumor seletivo) que possui alta infectividade capaz de causar controle tumoral duradouro ao matar células tumorais e estimular imunidade antitumoral.

Para aumentar a ativação imune, este estudo randomizado fase 1b avaliou a atividade intratumoral do DNX-2401 sozinho versus DNX-2401 combinado com interferon gamma (IFN). Um total de 27 pacientes com GBM recorrente foram incluídos (primeira e segunda recorrência 59% e 41%, respectivamente), recebendo cada uma única dose de 3e10 vp DNX-2401 intratumoral.

Pacientes foram randomizados 2:1 para receber 50mcg/m2 de IFN subcutâneo a cada 3 semanas, iniciado 14 dias após DNX-2401, ou apenas seguimento após DNX-2401. O diâmetro tumoral mediano foi de 40mm (20-77mm). 18 pacientes foram randomizados para o braço IFN e 9 para o braço seguimento. Devido à má tolerabilidade do IFN, a duração mediana do tratamento foi de apenas 6 semanas (0-30 semanas) e 2 não chegaram a iniciar o tratamento por deterioração clínica.

Os efeitos adversos mais frequentes foram fadiga, cefaleia e convulsão, consistente com sintomas pré-existentes. Baseado na availação preliminar por intenção de tratar, o IFN não pareceu adicionar benefício ao tratamento. Entretanto, a SG em 12 meses e a SG em 18 meses de todo os pacientes foi de 33% e 22%, respectivamente. Três pacientes permanecem vivos aos 19, 21 e 22 meses (DNX -2401, n = 1; DNX-2401 + IFN, n = 2). 50% dos pacientes com diâmetro tumoral inicial < 42mm sobreviveram mais que 12 meses, potencialmente identificando uma subpopulação de pacientes que podem se beneficiar do tratamento.

Apesar de inicialmente promissores, os dados deste estudo referente à terapia com DNX-2401 são pouco animadores. A maioria dos pacientes incluídos possuíam tumores pequenos (diâmetro mediano 40mm), o que sabemos ser um fator de excelente prognóstico mesmo para a terapia padrão. Possivelmente, isto também é necessário para uma boa resposta imunológica. No entanto, a boa tolerabilidade como monoterapia estimula o desenvolvimento de estudos futuros (fase 2/3) em que o braço controle permita validar uma SG prolongada.

Prophylactic cranial irradiation (PCI) versus observation in radically treated stage III non-small cell lung cancer (NSCLC): A randomized phase III NVALT11 study. Harry J.M. Groen et al.

Pacientes com câncer de pulmão não pequenas células (CPNPC) estádio clínico (EC) III possuem alta incidência de recidiva de doença, principalmente em SNC. Nesse estudo fase III, esses pacientes, após tratamento radical com quimio-radioterapia, foram randomizados entre receber radioterapia profilática de crânio (PCI) e observação. A dose de PCI, prescrita a critério do médico, variou entre 30 e 36Gy. Pacientes foram seguidos com avaliação clínica de sintomas e exames de imagem (RNM/TC). Endpoint primário foi proporção de pacientes que desenvolveram metástase cerebral sintomática (sBM).

Com a inclusão de 175 pacientes, 87 receberam PCI e 88 seguiram com observação clínica. Com mediana de seguimento de 48.5 meses, a proporção de pacientes com sBM foi de 4.6% no grupo PCI e 28.4% no grupo observação (p < 0.00001). Sete (8.1%) dos pacientes tratados com PCI e 26 (29.7%) dos que foram observados desenvolveram metástase cerebral à imagem (p< 0.001). A sobrevida global (SG) mediana foi de 24,2 meses para o grupo intervenção e 21.9 meses para o observação (p=0,52). A qualidade de vida global nos 3 primeiros meses foi pior no braço PCI (p=0,02), mas não após esse período.

Apesar de diminuir o desenvolvimento de metástase cerebral sintomática (ou não), o tratamento mostrou diminuição da qualidade de vida inicialmente e ausência de ganho em sobrevida global. Além disso, dados em relação à cognição não foram apresentados. Em pacientes com uma doença grave e de sobrevida curta, esse tipo de intervenção deve ser bem discutido com paciente e familiares e outros fatores de risco para o desenvolvimento de distúrbios cognitivos, como hipertensão, dislipidemia, DM e idade, também devem ser considerados.

Efficacy analysis of ABT-414 with or without temozolomide (TMZ) in patients (pts) with EGFR-amplified, recurrent glioblastoma (rGBM) from a multicenter, international phase I clinical trial - Andrew B. Lassman et al.

A amplificação do EGFR está presente em torno de 50% dos GBM. O ABT-414 é um anticorpo conjugado, formado por um anti-EGFR combinado a uma toxina de micro túbulos, a MMAF. O ABT-414 se liga a um epítopo exposto durante a ativação do EGFR (inclusive suas variantes como EGFRvIII), liberando a MMAF dentro da célula cancerígena. Neste estudo fase 1, pacientes com GBM recorrente com amplificação de EGFR receberam ABT-141 nos dias D1 e D15 +/- 150-200mg/m2 de Temozolamida (D1-D5) a cada 28 dias, ambos até progressão de doença.

Com inclusão de 126 pacientes, 125 puderam ser avaliados de acordo com os critérios RANO: 52% apresentaram benefício clínico (2 resposta completa, 9 resposta parcial, 54 doença estável) e o restante (48%) progressão de doença. De 115 pacientes com doença inicial mensurável, a taxa de resposta objetiva foi 10% (2 RC + 9 RP). Em 5 pacientes submetidos a uma nova ressecção por progressão de doença radiológica, a patologia veio consistente com tecido necrótico e os pacientes classificados como doença estável, sugerindo que a taxa de resposta pode estar subestimada. A sobrevida livre de progressão em 6 meses foi de 26% e a sobrevida global mediana de 8.5 meses.

Pela alta incidência de amplificação de EGFR em GBM, esse alvo é há algum tempo objetivo de estudo e ação de diversas drogas. No entanto, até hoje nenhuma droga-alvo para EGFR demonstrou ganho de sobrevida global. Com esses dados positivos de fase 1, estudo randomizado multicêntrico fase 2/3 com ABT-141 para GBM recorrente já completou o accrural, com dados esperados para breve.

Phase I study of AZD1775 with radiation therapy (RT) and temozolomide (TMZ) in patients with newly diagnosed glioblastoma (GBM) and evaluation of intratumoral drug distribution (IDD) in patients with recurrent GBM. - Brian Michael Alexander et al.

O AZD1775 é um inibidor da tirosina-quinase Wee1 que age como regulador da fase G2/M do ciclo celular. A terapia padrão no tratamento inicial de GBM envolve radioterapia e temozolamida, ambos causadores de dano no DNA. A célula, ao reparar esse dano, interrompe o ciclo celular. A inibição desse regulador G2/M evita o reparo celular e permite a célula continuar em mitose sem reparar o DNA. O AZD1775 mostrou aumentar a atividade do TMZ combinado a radioterapia em modelos pré-clínicos.

Este estudo multicêntrico fase I avaliou o uso desta droga em combinação com o tratamento padrão (RT+TMZ), seguido pela avaliação da distribuição intratumoral da droga em pacientes que se submeteram a cirurgia no caso de recorrência.

A fase para avaliação de dose da droga era composta de 2 braços: um com AZD1775 dado de segunda a sexta durante o tratamento de RT+TMZ; e outro em que era dada com TMZ adjuvante (1 x ao dia por 5 dias cada 28 dias). Cada braço com design padrão 3+3. A coorte com a combinação de tratamentos (RT+TMZ seguido de TMZ adjuvante) so incluiria pacientes após estabelecida a dose máxima tolerada (DMT). Foram incluídos 51 pacientes no primeiro braço e a DMT neste cenário foi de 200mg. No braço da adjuvância, a DMT foi de 475mg. O principal efeito adverso em ambos os grupos foi neutropenia (trombocitopenia foi comum no braço 1). A concentração intratumoral da droga em tumores contrastantes e não-contrastantes foi de 4-8x e 0.5-2.6x maior que no plasma sanguíneo, respectivamente (pacientes submetidos a ressecção pós-progressão).

Apesar de não dispormos de dados relativos à resposta, SG e SLP, a combinação desta promissora medicação se mostrou segura. Dados da coorte em que há combinação tanto com a fase da radioterapia quanto da adjuvância ainda estão pendentes. Estes serão fundamentais para a o início de estudo fase 2.

Histopathologic review of suspected disease progression in patients with recurrent glioblastoma (GBM) receiving nivolumab ± ipilimumab: CheckMate 143. - Solmaz Sahebjam et al.

Para pacientes com GBM, distinguir progressão de doença (PD) de efeitos relacionados à imunoterapia através de neuroimagem é desafiador. A avaliação histopatológica pode demonstrar a atividade desse tratamento em GBM e potencialmente minimizar a descontinuação prematura da terapia.

Foram apresentados os dados neuropatológicos de pacientes com GBM recorrente, tratados no CheckMate 143, que se submeteram a biópsia/ressecção por suspeita de progressão de acordo com critérios iRANO. Os pacientes receberam nivolumabe 3 mg/kg (nivo 3) a cada 2 semanas ou nivo 3 + ipilimumabe 1 mg/kg (ipi 1) a cada 3 semanas × 4 doses seguido de nivo 3 a cada 2 semanas. Tecidos coletados de pacientes com suspeita de progressão radiológica foram central e cegamente revisados por 2 neuropatologistas. Efeito do tratamento foi definido como ≥30% necrose/alterações reacionais e ≤50% de tumor viável por área em amostras pós-tratamento ou alteração morfológica significativa da biópsia prévia quando disponível. Os resultados foram comparados com os de biópsia pré-tratamento e com controles de pacientes com GBM tratados com terapia padrão.

Dos pacientes tratados com nivo 3 (n = 20) ou nivo 3 + ipi 1 (n = 1), 13 tiveram possivelmente efeitos relacionados ao tratamento e 8 com PD, sem nenhuma evidencia de efeitos da terapia. Efeito do tratamento não foi relacionado à idade, metilação de MGMT ou expressão de PD-L1.

Apesar de ainda não se dispor dos dados finais relacionados à SG e sobrevida livre de progressão (SLP) em pacientes com GBM recorrente tratados com imunoterapia, os resultados apresentados sugerem que este tratamento pode ter uma atividade biológica intracerebral e que a análise histopatológica pode ajudar a decidir a continuidade do tratamento nos casos mais difíceis. No entanto, o resultado mais importante, a correlação entre atividade biológica e ganho em sobrevida global, não foi apresentado.

Randomized, double-blind, phase III trial of a personalized peptide vaccination for human leukocyte antigen-A24-positive glioblastoma multiforme patients refractory to temozolomide-based therapy. - Mizuhiko Terasaki et al.

A vacinação com peptídeo personalizado (PPV) foi testada nesse estudo fase III em pacientes com Glioblastoma multiforme (GBM) antígeno leucocitário (HLA)-A24-positivo refratários a temozolamida (TMZ). Em razão 2:1, 88 pacientes foram randomizados entre tratamento com PPV (n = 58) e best supportive care (BSC) (n = 30). Quatro peptídeos, de 12 pré-estabelecidos, eram escolhidos de acordo com o nível sérico de IgG pré-vacinação e administrados por via subcutânea.

O objetivo primário do estudo, sobrevida global (SG), não foi alcançado. Performance status (PS) 3, nível sérico prévio elevado de fator de estimulação de colônia de macrófagos (GM-CFS), e PPV contendo peptídeo derivado de SART2 foram fatores prognósticos desfavoráveis. Assim, seguiu-se com analise de 78 pacientes com PS de 0 a 2 (50 PPV e 28 BSC). Neste subgrupo, a SG de 39 pacientes do braço PPV com baixo nível sérico de GM-CSF (< 0.9 pg/mL) ou vacinação que não incluía peptídeo derivado de SART2 (10.4 meses, IC 95% 7.8-12.0 meses) foi significativamente (p = 0.03) maior que a dos correspondentes 19 pacientes no braço BSC (6.8, 4.6-12.7).

Em contraste, a SG mediana dos pacientes que tinham tanto nível sérico elevado de GM-CSF (> 0.9 pg/mL) quanto vacinação com inclusão de peptídeo derivado de SART2 foi significativamente (p = 0.01) mais curta no braço PPV (n = 10; 4.1m, 1.1-8.3) que no braço BSC (n = 9, 1.6-não alcançada).

A monoterapia com PPV para pacientes GBM HLA-A24-positivos refratários a temozolomida não mostrou benefício quando comparada ao tratamento paliativo exclusivo. No entanto, a análise não pré-planejada sugeriu que deva existir um subgrupo de pacientes que se beneficie desse tratamento.

Vemurafenib in patients with BRAFV600 mutant glioma: A cohort of the histology-independent VE-basket study. - David Michael Hyman et al.

Alterações de BRAFV600 já foram identificadas em proporção substancial de gliomas, incluindo GBM, astrocitomas, astrocitoma pilocítico juvenil (JPA) e xantoastrocitoma pleomórfico (PXA). Este estudo fase II (VE-BASKET) estudou a ação de vemurafenibe, um inibidor seletivo de BRAFV600, em pacientes com tumores não-melanoma positivos para a mutação.

Pacientes com glioma recorrente foram incluídos na coorte “outros tumores” e os dados relativos a eles foram apresentados. O objetivo primário do estudo foi taxa de resposta e os secundários incluíram benefício clínico (reposta completa confirmada, resposta parcial ou doença estável ≥ 6 meses), SLP, SG e toxicidade.

Vinte e quatro pacientes com gliomas foram tratados. Entre pacientes com glioma de alto grau (n=11, mediana de idade 32 anos), 1 (astrocitoma anaplásico) apresentou resposta parcial (RP), 5 doença estável (DE) e 2 não avaliados. Dois pacientes tiveram doença estável duradoura, por 12.9 meses (GBM) e 14.9 meses (Astrocitoma Anaplásico). Em pacientes com PXA (n = 7), um paciente apresentou resposta completa (RC), 2 RP e 3 DE. Um paciente com JPA e 1 com ganglioglioma alcançaram RP. Os eventos adversos mais frequentes englobaram artralgia (67%), nevus melanocítico (38%), eritrodisestesia palmo-plantar (38%), foto-sensibilidade (38%) e alopecia (33%).

ASCO: No estudo VE-BASKET, vemurafenibe demonstrou atividade em pacientes com gliomas com mutação BRAFV600

Apesar de mutações de BRAF já terem sido descritas previamente em gliomas, por se desconhecer o papel e a importância desta via na proliferação tumoral nesses tumores, a eficácia do tratamento com inibição de BRAF não tinha sido antes avaliada. Este trabalho demonstrou a atividade do vemurafenibe em pacientes com gliomas com mutação BRAFV600, mantendo um perfil de toxicidade similar ao descrito no tratamento de melanoma.

O questionamento nesse momento é saber se há ganho em sobrevida global maior que a terapia padrão (CCNU, BCNU, CPT-11+Avastin) e se o bloqueio combinado (uso conjunto com inibidores de MEK) é superior, como já demonstrado para Melanomas. Definitivamente, mais uma opção de tratamento para esses pacientes com mutação de BRAF foi demonstrada.

Final results of the EORTC Brain Tumor Group randomized phase II TAVAREC trial on temozolomide with or without bevacizumab in 1st recurrence grade II/III glioma without 1p/19q co-deletion. - Martin J. Van Den Bent.

Esse estudo fase 3, com dados preliminares previamente apresentados na SNO de 2016, avaliou o uso de bevacizumabe em gliomas recorrentes grau II e III sem codeleção 1p/19q. Os pacientes inclusos deveriam demonstrar lesão contrastante a RNM.

Os pacientes foram tratados com temozolamida 200mg/m2 D1-D5 a cada 4 semanas (máximo de 12 ciclos) +/- bevacizumabe 10mg/kg a cada 2 semanas até progressão. Com SG como endpoint primário, 155 pacientes foram randomizados; 125 apresentavam mutação de IDH. A SG em 12 meses foi de 61% para o braço TMZ e 55% no TMZ+BEV, com taxa de resposta similar nos dois grupos (TMZ: 42%; TMZ + BEV: 49%). A mutação de IDH não foi preditiva de resposta a bevacizumabe. Após progressão, 33% do braço TMZ e 17% do braço TMZ+BEV receberam bevacizumabe.

A adição de bevacizumabe ao tratamento de gliomas grau II e III não codeletados recorrentes, mesmo com lesões contrastantes à RNM de crânio, não demonstrou ganho de SG ou taxa de resposta quando comparada ao tratamento quimioterápico exclusivo.

SNO meeting

Phase III Trial of CCNU/ Temozolomide (TMZ) combination therapy vs. standard TMZ therapy for newly diagnosed MGMT-methylated Glioblastoma patients: the CeTeG/ NOA-09 trial - Ulrich Herrlinger et al.

Este estudo alemão fase III avaliou o ganho da adição de lomustina a temozolamida no tratamento inicial de Glioblastomas com metilação de MGMT. O racional da terapia, baseado em estudo prévio fase II com resultado animador, tem amparo no conhecimento de melhor resposta desses tumores a agentes alquilantes.

Os pacientes eram randomizados entre o braço-controle, que receberia a terapia padrão atual (protocolo Stupp, 2005), e o de investigação. Nesse braço, a radioterapia adjuvante era a mesma (60Gy, em 30 frações), mas a concomitância com temozolamida diária foi suprimida. Os pacientes, no entanto, receberiam desde o D1 da radioterapia lomustina 100mg/m2 D1 e temozolamida 100mg/m2 D2-D6 a cada 6 semanas, em um total de 6 ciclos. Se bem tolerada, a dose de TMZ poderia ser aumentada para até 200mg/m2.

Foram incluídos 129 pacientes (63 TMZ, 66 CCNU/TMZ). No braço experimental, apenas 40% dos pacientes receberam os 6 ciclos de quimioterapia, como planejado; 38% alcançaram a dose máxima de 200mg/m2 de TMZ, enquanto em 36% dos pacientes não conseguiram escalar a dose. Vinte e cinco por cento necessitaram da redução da dose de CCNU.

O estudo demonstrou ganho substancial de SG em 4 anos com a adição de lomustina à terapia padrão em pacientes com GBM

Apesar de não ter demonstrado ganho de sobrevida livre de progressão, com sobrevida global (SG) como endpoint primário, o estudo demonstrou superioridade do braço experimental frente à terapia padrão (HR 0,6 IC95% 0,35-1,03; p=0,064), com SG mediana de 31.4 meses para o braço-controle e 37.9 meses para o braço intervenção. A sobrevida global em 4 anos no grupo TMZ foi de 31.4% e 48.8% para o grupo CCNU/TMZ.

Em relação a terapias subsequentes, o braço CCNU/ TMZ houve menos Re-RDT e quimioterapia, mas mais re-abordagens cirúrgicas; sem diferença quanto ao uso de bevacizumabe.

O estudo demonstrou um ganho substancial de SG em 4 anos com a adição de lomustina à terapia padrão em pacientes com GBM com metilação de MGMT (50% a mais em 4 anos comparado a temozolamida isolada). Apesar de atualmente na pratica clinica tendermos a usar temozolamida nessa população por um tempo mais prolongado que 6 meses, o estudo demonstra que essa população se beneficia de tratamento mais intenso com alquilantes.

A discussão também levanta a questão de um possível efeito tardio (de longo prazo) da lomustina e de sua atuação em sitio diferente da Temozolamida. A ausência de ganho de SLP é intrigante, mas pode ser justificada pela não detecção de pseudoprogressão, algo comum em pacientes com metilação de MGMT.

AG-120, a first-in-class mutant IDH1 inhibitor in patients with recurrent or progressive IDH1 mutant glioma: updated results from the phase 1 non-enhancing glioma populations. - Ingo Mellinghoff et al.

O AG-120 é um potente inibidor via oral de IDH1 mutado (IDHmut), atualmente sob avaliação clínica em estudo fase 1. Após tratamento de 66 pacientes, foram apresentados dados relativos à população de pacientes com gliomas não contrastantes (35 pacientes).

Com a mediana de 2 linhas prévias, a idade mediana desse grupo era de 38 anos (21-71). Desses 35 pacientes, 73% apresentaram como melhor resposta doença estável durante escalação de dose e 88% após expansão da coorte. A duração mediana do uso de AG-120 foi de 16 meses; 63% dos pacientes usaram por mais de 1 ano. 51% desses pacientes ainda estão sob uso dessa medicação. Não foi observada toxicidade dose limitante e não ocorreu nenhuma morte relacionada ao tratamento.

Apesar de dados muito incipientes e precoces, os resultados apresentados foram extremamente animadores. Vale lembrar que mutações de IDH1 são encontradas em mais 70% dos tumores de baixo grau, que, apesar de incidência baixa, acomete geralmente uma população jovem e com pouca opção de tratamentos subsequentes.

First results of the randomized phase II study on Depatux-m alone, Depatux-m in combination with temozolomide and either temozolomide or lomustine in recurrent EGFR amplified glioblastoma: first report from INTELLANCE 2/EORTC trial 1410. - Martin van den Bent et al.

Depatux-m é um anticorpo conjugado, uma combinação de anticorpo anti-EGFR com a toxina MMFA, com ação em micro túbulos. Esse estudo fase II objetivou investigar a ação do Depatux-m em pacientes com GBM recorrente com amplificação de EGFR.

Após inclusão, os pacientes eram randomizados entre 3 braços: a) Depatux-m sozinho (intravenoso, 1mg/kg a cada 2 semanas); b) Depatux-m (mesma dose) combinado com temozolamida (150-200mg/m2 D1-5 a cada 4 semanas); c) ou monoterapia com temozolamida ou lomustina. O endpoint primário foi SG.

Foram randomizados 266 pacientes. Após ocorrência de 199 eventos, o braço combinação (Depatux-m + TMZ) demonstrou superioridade em relação ao braço com quimioterapia isolada (TMZ ou lomustina), com ganho de SG (HR 0.71, IC 95% 0.5-1.02, p=0.031). A mediana de SG foi de 9.6 meses versus 8.2 meses, com sobrevida em 1 ano de 39.7% versus 28.2%. Não houve diferença em SG ao comparar os braços Depatux-m monodroga com Quimioterapia isolada.

Apesar do endpoint primário não ter sido alcançado (ganho de SG com Depatux-m), a combinação do anticorpo com temozolamida mostrou benefício, com provável ganho em SG. A medicação, bem tolerada, teve como principal efeito colateral alterações oculares, que foram bem manejadas clinicamente. Estudos mais robustos ainda serão necessários para demonstrar um benefício que justifique a inclusão do Depatux-m na pratica clínica.

Publicações de Impacto

Publicado no New England Journal of Medicine em novembro de 2017, o estudo que avaliou o ganho da adição de bevacizumabe no tratamento de GBM recorrente conduzido por Wick et al já havia sido previamente apresentado na conferência da SNO em 2016. No entanto, vale a pena discutir esses dados, uma vez que a atualização nos permite uma melhor avaliação da ação dessa medicação.

Lomustine and Bevacizumab in Progressive Glioblastoma - Wolfgang Wick

Esse estudo fase 3 randomizado comparou o uso de Lomustina monodroga (110mg/m2 a cada 6 semanas) com lomustina (inicialmente 90mg/m2 e subsequentemente 110mg/m2 se bem tolerada) associada a bevacizumabe (10mg/kg a cada 2 semanas) em pacientes com Glioblastoma Multiforme (GBM) na primeira progressão. O estado de metilação de MGMT foi usado como critério de estratificação.

O objetivo primário era sobrevida global (SG) e os secundários sobrevida livre de progressão (SLP) e qualidade de vida (QoL), além de uso de glicocorticoides. Exame de imagem (RNM) era realizado na inclusão, semanalmente da semana 6 a semana 24 e, posteriormente, a cada 3 meses. Questionário de QoL foram realizados a cada 3 meses.

Com randomização 2:1, 437 pacientes foram incluídos. No grupo monoterapia, a mediana de ciclos recebidos foi de 1 (1-8) e no grupo da combinação 3 ciclos para lomustina (1-8) e 3 para bevacizumabe (1-16). Efeitos adversos grau 3 a 5 foram observados em 38% no grupo monodroga (1 morte) e 63.6% na combinação (5 mortes). A SG mediana do grupo controle foi de 8.6 meses (IC 95% 7.6 a 10.4m) e 9.1 meses (IC 95% 8.1 a 10.1m) no grupo intervenção (HR 0.95 IC 95% 0.74 a 1.21, P=0.65). A SLP de 1.5 meses (IC 95% 1.5 a 2.5m) no grupo monoterapia e 4.2 meses na combinação (IC 95% 3.7 a 4.3m) (HR 0.49; IC 95% 0.39 a 0.61; P<0.001). O tempo para iniciar o uso ou aumentar a dose de glicocorticoide, balanceado entre os grupos na randomização, não apresentou diferença entre os braços. Também não houve diferença em QoL.

Além de não demonstrar aumento de SG, o uso da combinação de bevacizumabe na segunda linha em GBM também não demonstrou melhora na QoL ou diminuição do uso de glicocorticoide, algo sempre discutido como uma grande vantagem dessa medicação. Nenhum subgrupo demonstrou benefício da combinação. No entanto, muitos pacientes receberam (ou continuaram a receber) bevacizumabe na progressão da doença e foram observados efeitos adversos importantes com a combinação, fatores que também podem ter contribuído para uma ausência de benefício em SG caso ela exista e seja pequena.