Maria Del Pilar Diz (foto), do ICESP, é autora sênior de estudo aceito no programa científico do ASCO 2021, com resultados sugerindo que o uso concomitante de inibidores da bomba de prótons (PPI) e antibióticos (ATB) está associado a aumento da toxicidade em pacientes de câncer tratados com inibidores de checkpoint imune (ICI), com impacto na sobrevida global e livre de progressão.
Nesta coorte retrospectiva foram incluídos pacientes de câncer metastático tratados com ICI com intenção paliativa. Os pesquisadores revisaram os prontuários, considerando a medicação concomitante e toxicidades classificadas pela CTCAE 4.0.
Pacientes que receberam PPI ou ATB foram analisados de acordo com o uso anterior (pPPI e pATB, ≤60 dias para ICI) e uso concomitante (cPPI e cATB). A estimativa de sobrevida global mediana (mSG) e de sobrevida livre de progressão (SLP) foi feita por Kaplan-Meier e as diferenças nas características basais foram ajustadas por um modelo de riscos proporcionais de Cox. As toxicidades e a interação ATB / PPI foram calculadas usando o método do Qui-quadrado de Pearson.
Resultados
A análise considerou 216 pacientes com idade mediana de 59 anos, principalmente ECOG-PS 0 (34%) ou 1 (58%). Os ICI empregados foram principalmente anti-PD-1 (60,2%), anti-CTLA-4 (16,2%) e anti-PD-L1 (12,5%). Os locais de tumor primário mais frequentes foram pulmão n = 39 (18,1%), gastrointestinal n = 34 (15,7%) e melanoma n = 33 (15,2%).
Metade dos pacientes (108) receberam ATB e 114 (52,8%) PPI. Em comparação com o controle, o grupo pPPI n = 57 (26,4%) teve menor mSG (11,6 m vs 19,7 m, p <0,001) e SLP (2,8 m vs 8,5 m, p <0,001), mas nenhuma diferença estatisticamente significativa no grau de toxicidade ≥ 3 e / ou que tenha levado à interrupção do ICI (36% vs 29,1%; p = 0,29).
O uso de cPPI n = 100 (46,3%) representou impacto negativo na mediana de sobrevida global (12,1m vs 17,0m; p = 0,01), SLP (4,3m vs 7,1m; p = 0,04) e ainda aumentou toxicidades (42% vs 19%; p < 0,001). O uso prévio de antibióticos também impactou negativamente os resultados clínicos nessa população de pacientes. Aqueles pATB (n = 34; 15,7%) tiveram menor SG (6,9m vs 19,3m, p <0,001) e menor SLP (3,2 vs 7,2m, p = 0,005), além de maior incidência de toxicidades (45,9% vs 28,1%; p = 0,04). No entanto, os autores reportam que o uso de cATB n = 92 (42,6%) não afetou a SG (12,1m vs 15,6m; p = 0,32) ou SLP (5,5m vs 5,9m; p = 0,82), mas representou maior incidência de toxicidades: 37% vs 24,2% (p = 0,05).
As análises multivariadas confirmaram que a terapia pATB e pPPI, respectivamente, permaneceram como variáveis prognósticas independentes associadas com SG (HR 2,39; IC 95%, 1,60-3,59; P <0,001 e HR 1,73; IC 95% 1,23-2,44; P = 0,002) e SLP (HR 1,72; IC 95%, 1,14-2,61; P = 0,01 e HR 2,36; IC 95% 1,67 - 3,34; P <0,001) ajustado por status de desempenho, idade e linha de tratamento.
“Esses dados sugerem que o uso concomitante de PPI e ATB está associado a aumento da toxicidade em pacientes tratados com ICI. pPPI e pATB podem impactar negativamente a sobrevida global e SLP, merecendo a atenção dos médicos”, observam os autores.
Pilar ressalta que é que é crescente o corpo de evidências do papel da microbiota, particularmente do microbioma fecal, inclusive no resultado de tratamentos clínicos. “Estudos pré-clínicos têm demonstrado que inibidores da bomba de prótons podem modular o microbioma e há sugestão, em estudos de braço único, que antibióticos podem reduzir a eficiência de inibidores de checkpoint imune. Apesar de não termos estudos randomizados que confirmem estas hipóteses, análises não programadas em estudos clínicos sugerem este efeito. Neste estudo também observamos impacto negativo na SG e SLP”, afirma.
“Em pacientes em tratamento com ICI, o uso de inibidores de bomba de prótons e antibióticos deve ser limitado a indicações clínicas claras e precisas, e pelo tempo estritamente necessário”, destaca.
Referência: Abstract 2652 - Proton pump inhibitors and antibiotics impact on toxicities and clinical outcomes in cancer. - Haniel Alves Araujo1, Camila Motta Venchiarutti Moniz1,2, Oddone Freitas Melro Braghiroli1, Milena Perez Mak1,2, Lucas Fernando Uratani1, Ricardo Dahmer Tiecher1, Priscila Muniz Moraes1, Ingrid Barbosa1, Veridiana Pires De Camargo1,2, Maria Ignez Freitas Melro Braghiroli1,2, Gilberto Castro1, Paulo Marcelo Hoff1,2,3, Maria Del Pilar Diz1,2,3; 1. Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (ICESP), São Paulo, Brazil; 2. Instituto D'Or de Pesquisa e Ensino, São Paulo, Brazil3. Universidade de São Paulo, São Paulo, Brazil
Session: Developmental Therapeutics—Immunotherapy