A hematologista Vânia Hungria (na foto, à esquerda) é autora sênior de estudo que avaliou os fatores de risco e desfechos de COVID-19 em pacientes brasileiros com mieloma múltiplo (MM). O trabalho integra o programa científico da 63ª ASH, o maior encontro da hematologia mundial. A infectologista Marcia Garnica é a primeira autora do trabalho, conduzido em colaboração com o Grupo Brasileiro de Mieloma (GBRAM).
Os autores lembram que durante a pandemia de COVID-19, séries de casos de pacientes com MM demonstraram resultados ruins naqueles que necessitaram de hospitalização por COVID-19, e há poucos dados sobre os fatores de risco para hospitalização ou pacientes fora do ambiente hospitalar. “No Brasil, onde o cenário é de recursos restritos para tratar pacientes com MM e houve grande número de casos de COVID-19 e óbitos relacionados, o desfecho pode ser ainda pior”, sustentam os autores, ao analisar o panorama de COVID-19 em pacientes brasileiros com mieloma múltiplo.
Esta série retrospectiva investigou 81 pacientes com MM e COVID-19 documentada, atendidos dentro e fora do ambiente hospitalar, em 8 estados, representando 4 das 5 regiões do Brasil.
Foram analisados casos de abril de 2020 a julho de 2021, considerando as características clínicas de pacientes com COVID-19 e MM. Fatores de risco e sua correlação com a gravidade de COVID-19 também foram avaliados, a partir dos desfechos (internação hospitalar, internação na unidade de terapia intensiva (UTI), suporte ventilatório e óbito). A análise ainda considerou a frequência de modificação do tratamento de MM devido a COVID-19.
Os resultados apresentados na 63ª ASH mostram que dos 81 pacientes com MM e diagnóstico de COVID-19 (50% do sexo masculino; idade mediana de 63 anos; 25% com ISS III ao diagnóstico), pelo menos uma comorbidade estava presente em 47 (58%) pacientes, mais frequentemente hipertensão e diabetes (56% e 27%). Nesta série de casos, 28 (35%) pacientes apresentavam mais de uma comorbidade.
Hungria e colegas descrevem que no episódio de COVID, 21 pacientes (26%) apresentavam doença ativa ou doença progressiva e 40% haviam recebido pelo menos duas linhas de tratamento prévio. O manejo de COVID-19 exigiu hospitalização em 49 casos (61%), suporte ventilatório em 30 (40%) e UTI em 28 pacientes (35%). A hospitalização esteve associada à idade (p = 0,008), presença de comorbidade (p = 0,02), hipertensão (p = 0,02), presença de febre (p = 0,005) e sintomas respiratórios (p = 0,003). Os autores ainda esclarecem que o suporte ventilatório foi mais frequente em pacientes com doença cardíaca (p = 0,05), em uso de imunomoduladores (p = 0,03) ou anticorpos monoclonais (p = 0,006). Pacientes recebendo corticosteroides (p = 0,02), imunomoduladores (p = 0,06) ou anticorpos monoclonais (p = 0,06) no tratamento com MM tiveram maior frequência de internação em UTI.
Pela análise multivariada, idade e apresentação clínica com febre e sintomas respiratórios (p <0,001, p = 0,05 ep = 0,001, respectivamente) foram associados de forma independente à hospitalização; sintomas respiratórios baixos e terapia para MM incluindo drogas monoclonais (p = 0,07 ep = 0,02) foram associados ao suporte ventilatório; terapia com corticosteroides e imunomoduladores (p = 0,019 e p = 0,05) estiveram associados à internação na UTI. A mortalidade geral foi de 29%. As taxas de mortalidade foram de 47%, 68% e 77% em pacientes hospitalizados, com suporte ventilatório e pacientes de UTI, respectivamente.
Na análise univariada, a idade, o status performance ECOG e a terapia para MM incluindo corticosteroides foram associados ao aumento da mortalidade. Pelo modelo multivariado, apenas o status performance ECOG permaneceu como fator de risco independente para morte. ISS, linhas anteriores de tratamento, transplante anterior de células-tronco e estado da doença no momento da infecção por COVID-19 não foram positivamente associados a nenhum dos desfechos analisados. Os pacientes com MM que se recuperaram de COVID tiveram o tratamento para MM atrasado em 61% dos casos.
Nesta série, Vânia Hungria e colegas mostram que os pacientes brasileiros com MM que contraíram COVID-19 tiveram uma frequência muito alta de hospitalização, necessidade de suporte ventilatório, admissão na UTI e óbitos. Embora não estejam associadas ao aumento da mortalidade, os autores descrevem que as classes de medicamentos da terapia anterior foram associadas à gravidade da manifestação.
“Também observamos alta frequência de atraso no tratamento com MM em pacientes recuperados, e o impacto clínico pós-COVID deve ser mais explorado. A alta mortalidade observada reforça a importância da prevenção da COVID-19, como distanciamento social, uso de máscara e vacinação”, destacam os autores.
Referência: 4104 COVID-19 in Multiple Myeloma Patients: Frequencies and Risk Factors for Hospitalization, Ventilatory Support, Intensive Care Admission and Mortality –Cooperative Registry from Grupo Brasileiro De Mieloma Multiplo (GBRAM) - Marcia Garnica, MD1,2*, Edvan De Queiroz Crusoe, MD, PhD3, Glaciano Ribeiro, MD4*, Rosane Bittencourt, MD5*, Roberto José Pessoa Magalhães, MD6*, Karla Richter Zanella, MD7*, Abrahão Elias Hallack Neto, MD, PhD8*, Juliana Lima, MD9*, Caroline Sola, MD10*, Emmanuella G Souza, MD11*, Andre Magalhaes, MD12*, Angelo Maiolino, MD13,14 and Vania Hungria
Program: Oral and Poster Abstracts
Session: 905. Outcomes Research—Lymphoid Malignancies: Poster III
Hematology Disease Topics & Pathways: Adults, Plasma Cell Disorders, Clinically Relevant, SARS-CoV-2/COVID-19, Diseases, Infectious Diseases, Lymphoid Malignancies, Study Population
Monday, December 13, 2021, 6:00 PM-8:00 PM