Índice de massa corporal e mudança de peso após tratamento adjuvante no câncer de mama precoce HER2+

A oncologista Maria Alice Franzoi é primeira autora de estudo selecionado para apresentação em pôster no ESMO 2021 que avalia o impacto do índice de massa corporal (IMC) ao diagnóstico e alterações de peso nos resultados de pacientes com câncer de mama precoce HER2-positivo tratadas com duplo bloqueio HER2. O oncologista Evandro de Azambuja é o autor sênior do trabalho.

“Com o aumento do sobrepeso e da obesidade no mundo inteiro, e imprescindível que tenhamos um conhecimento mais detalhado sobre o impacto do índice da massa corporal (IMC)  e alterações no peso após o diagnostico no prognóstico e na resposta aos tratamentos atuais contra o cancer de mama. Isto é importante para potencialmente adaptar as estratégias de tratamento e também recomendações para a fase de acompanhamento pos tratamento. Sabemos que pacientes com maior IMC tem pior prognóstico após um cancer de mama de forma geral. Entretanto, até o momento não havia dados robustos disponíveis em pacientes tratados com trastuzumabe e pertuzumabe de forma curativa. Nossa publicação, com mais de 4500 pacientes vem adicionar dados importantes referentes a esta questão”, destacam os autores.

O estudo avaliou pacientes com câncer de mama precoce HER2-positivo incluídas no estudo APHINITY, que receberam quimioterapia (ChT) mais bloqueio de HER2 único ou duplo. As participantes foram classificadas em peso normal/abaixo do peso (IMC > 25kg/m²) e sobrepeso/obesos (IMC ≥ 25kg/m²). Foi avaliado o impacto do IMC no baseline na sobrevida livre de doença invasiva (IDFS) e no intervalo livre de recorrência à distância (DRFI), e realizadas análises multivariáveis ​​de ajuste para características no baseline que diferiam de acordo com o IMC (idade, status menopausal, tamanho do tumor, tipo de terapia endócrina e quimioterapia). Uma análise especifica foi realizada para estudar o impacto das mudanças de peso (5% de perda ou ganho) em 2 anos.

Resultados

Foram incluídas 4787 pacientes: 2535 (53%) foram consideradas normais/abaixo do peso e 2252 (47%) com sobrepeso/obesidade. O IMC ≥ 25 no início do estudo foi associado a idade avançada, status pós-menopausal, tumores maiores, menos tratamento com antraciclinas e mais uso de inibidores de aromatase. IMC ≥ 25 foi associado a pior IDFS (hazard ratio ajustado [aHR] 1,27; 95% CI 1,06-1,52) e DRFI (aHR 1,32; 95% CI 1,06-1,64).

As análises de subgrupo sugeriram um impacto negativo do IMC ≥ 25 para pacientes com câncer de mama receptor hormonal negativo (IDFS: aHR 1,52; 95% CI 1,14-2,03; DRFI: aHR 1,57; 95% CI 1,10-2,24), pós-menopausa (IDFS aHR: 1,30; 95% CI 1,01-1,68; DRFI: aHR 1,37; 95% CI 1,00-1,89), pacientes tratadas com duplo bloqueio HER2 (IDFS: aHR 1,47; 95% CI 1,12-1,93; DRFI: aHR 1,51; 95% CI 1,09-2,11 ) e antraciclinas (IDFS: aHR 1,26; 95% CI 1,03-1,54; DRFI: aHR 1,34; 95% CI 1,05-1,70).

As alterações de peso não afetaram o IDFS (n=3961) - perda aHR 1,03, 95% CI 0,71-1,50; ganho aHR 1,00; 95% CI 0,76-1,31 ou DRFI (n=3965) - perda aHR 0,93, 95% CI 0,59-1,47; ganho aHR 0,90; 95% CI 0,64-1,26. A análise com 4 categorias de IMC não alterou profundamente as conclusões.

“Nesta análise exploratória, o IMC ≥ 25 no início do estudo pareceu estar associado com desfechos inferiores em termos de sobrevida livre de doença invasiva e intervalo livre de recorrência a distancia, mesmo para pacientes tratados com duplo bloqueio HER2 com trastuzumab e pertuzumab. Isto reinforca a importancia da prevenção do sobrepeso e da obesidade e de conscientizar a população sobre esses resultados.

 Quanto a perda ou ganho de peso após o diagnostico, no nosso estudo, não houve impacto mas precisamos de mais estudos especificamente desenhados para responder essa questão, para poder orientar melhor nossas pacientes na fase de acompanhamento e follow-up.

Maria Alice Franzoi é ex-fellow do Institut Jules Bordet, Bélgica, e atualmente oncologista e pesquisadora no Instituto Gustave Roussy.  

Identificação do ensaio clínico: NCT01358877.