A brasileira Thais Fischer (foto), médica da Santa Casa de São Paulo e do A.C.Camargo Cancer Center, é primeira autora de estudo que descreveu a epidemiologia dos Linfomas Periféricos de Células T (LPCT) na América Latina, características clínicas e desfechos dos pacientes. Os resultados refletem a maior coorte agrupada de subtipos de LPCT na América Latina.
Os linfomas periféricos de células T representam um grupo raro e heterogêneo de linfomas maduros de células T, frequentemente caracterizados por comportamento agressivo. Nesta análise, Fischer e colegas realizam uma análise conjunta internacional para avaliar a distribuição de LPCT nos países da América Latina e relatar os resultados do tratamento.
Foram considerados pacientes com idade ≥18 anos com LPCT recém-diagnosticado a partir do registro retrospectivo do Grupo de Estudo Latinoamericano de Linfoproliferativos (GELL, n=988, 1975-2023), da base de dados do Projeto Brasileiro de Células T (TCP Brasileiro, 2015-2017, 168 casos retrospectivos; 2017-2023, 425 casos prospectivos) e do registro prospectivo do International T cell Project (ITCP, n=529, 2006-2023). Os dados foram extraídos dos prontuários médicos em formulário padronizado. Os dados de sobrevida estavam disponíveis apenas no GELL e no TCP brasileiro. A sobrevida global (SG) foi estimada desde o diagnóstico até a morte por qualquer causa, enquanto a sobrevida livre de progressão (SLP) foi definida desde o diagnóstico até a recidiva, progressão ou morte por qualquer causa. O estudo utilizou o método Kaplan-Meier e o teste Log-rank para estimar e comparar as probabilidades de sobrevida.
Os resultados apresentados no ASH 2023 consideraram 2.110 pacientes de 11 países da América Latina. No geral, a idade média no momento do diagnóstico foi de 54 anos (variação de 18 a 95 anos), a maioria do sexo masculino (59%), com doença em estágio avançado (Ann Arbor III-IV, 67%) e bom status de desempenho (ECOG ≤ 1, 71%).
Após LPCT sem outra especificação (NOS, 39%), os subtipos de LPCT mais frequentemente diagnosticados foram leucemia/linfoma de células T do adulto (LTA, 18%) e linfoma extranodal de células NK/T (ENKTL, 16%), com distribuição variada nos países da América Latina.
O Peru teve maior prevalência de LTA (39%) e o ENKTL foi frequentemente diagnosticado na América Central (43%). Em contraste, o linfoma anaplásico de grandes células T (ALCL) ALK-negativo (ALK-) foi o segundo subtipo mais frequente no Brasil (18%), Chile (16%) e Argentina (9%). O percentual de NOS de células T maduras foi de 27% na Argentina e 28% no Chile. Um total de 1.620 receberam quimioterapia. A quimioterapia de primeira linha variou entre os subtipos. Pacientes com ENKTL foram frequentemente tratados com terapia à base de asparaginase/platina (62%), enquanto CHOP foi mais comumente usado para LTA ou LPCT NOS (46% para ambos). A quimioterapia com CHOEP/EPOCH foi frequente em pacientes com ALK-ALCL (45%), ALK+ (ALCL 47%) ou AITL (48%).
Com um seguimento mediano de 33 meses, a SG e a SLP em 3 anos para a coorte geral foram de 40% e 30%, respectivamente. ALK+ ALCL apresentou estimativas de sobrevida superiores, com SG em 3 anos de 77% e SLP em 3 anos de 73%. A SG em 3 anos para pacientes com ENKTL foi de 48% e a SLP de 45%. Pacientes com LTA apresentaram as taxas de sobrevida mais baixas (SG e SLP de 23% e 16% em 3 anos, respectivamente). O uso de asparaginase/platina ou terapia baseada em CHOP foi associado com SG superior em 3 anos (61% e 52%, respectivamente; p=0,011) e maior SLP (57% e 49%, respectivamente; p=0,017) entre pacientes com ENKTL. Para LTA, o uso de CHOEP/EPOCH foi associado à melhora da SG em 3 anos (21%, p = 0,009) e da SLP (15%, p = 0,024), mas os resultados permanecem desanimadores.
“Até onde sabemos, relatamos a maior coorte agrupada de subtipos de LPCT na América Latina, aproveitando o registro retrospectivo do consórcio GELL e dados do TCP e ITCP brasileiros. Nossos resultados sugerem uma distribuição distinta de subtipos de LPCT entre os países da América Latina, com maior prevalência de LTA e ENKTL em comparação com os padrões epidemiológicos nos países ocidentais”, destacam os autores, acrescentando que esta distribuição destaca uma oportunidade única para aumentar o número de inscrições em ensaios clínicos e o recrutamento de subtipos mais raros de LPCT. O percentual relativamente elevado de NOS de células T maduras sugere dificuldades em fornecer diagnósticos específicos de linfoma na região. As baixas taxas de sobrevida para alguns subtipos indicam a necessidade de desenvolver novas terapias para melhorar os resultados dos pacientes”, concluem.
Uma avaliação prospectiva mais ampla da epidemiologia do LPCT e dos resultados do tratamento está sendo planejada para ampliar a identificação de casos, melhorar a classificação patológica dos diferentes subtipos de LPCT e validar esses resultados na América Latina.
Referência: Epidemiology, Clinical Features and Outcomes of Peripheral T-Cell Lymphoma in Latin America