O radioterapeuta Arthur Accioly Rosa* (foto), atual coordenador do serviço de Radioterapia do Hospital Português, em Salvador, acaba de assumir a presidência da Sociedade Brasileira de Radioterapia (SBRT), com a perspectiva de ampliar a educação médica na especialidade e vencer as limitações de infraestrutura. Em entrevista ao Onconews, ele discute o cenário atual e os principais eixos da nova gestão da SBRT.
Como você vê o momento atual da radioterapia no Brasil?
A radioterapia brasileira vive um cenário crítico nos últimos três, quatro anos, com um déficit muito grande. Na verdade, temos um déficit histórico que se aprofundou e hoje a infraestrutura de radioterapia talvez atenda a 50% das necessidades. É uma especialidade que depende muito de infraestrutura e de investimento técnico de alta complexidade. No entanto, muito do parque instalado está defasado. Hoje, 80% da população brasileira é atendida pelo Sistema Único de Saúde. Nosso último aumento real de repasse de procedimentos foi em 2010 e nesse período tivemos uma inflação alta, o dólar galopante. É claro que diante de tudo isso o serviço tem tentado sobreviver. Infelizmente, as iniciativas do governo até o momento não surtiram efeito e é de conhecimento público que o projeto de 80 máquinas praticamente não avançou. O projeto é de 2012 e agora – 5 anos depois – vai entregar somente 5 das 80 soluções. Isso traduz a complexidade e a dificuldade que é montar uma estrutura de radioterapia, particularmente em um cenário de crise. A SBRT tem trabalhado no suporte técnico ao Ministério da Saúde, inclusive com informações econômicas, para tentar vencer essas limitações, pensando na viabilidade e na sustentabilidade da ampliação da radioterapia no Brasil. Esse é um pilar forte da nossa proposta.
Que outros eixos devem pautar a direção da SBRT?
A nossa principal proposta é ser mais representativo e capilarizar as ações da Sociedade. Vamos fazer um diagnóstico das reais necessidades desses especialistas, as necessidades de atendimento, de infraestrutura. Em um país como o nosso, uma das grandes dificuldades é atender a todas as demandas, em diferentes contextos, porque temos realidades como a da Amazônia, que evidentemente tem necessidades distintas daquelas de um centro no Sul do País. Vamos fazer um censo da radioterapia, até porque as informações que a gente tem disponíveis hoje na Comissão Nacional de Energia Nuclear, do próprio Ministério da Saúde, são informações muito confusas. São contabilizadas máquinas que ainda estão na caixa, enquanto máquinas em operação por vezes não são apontadas. Então, é um projeto grande, mas vamos mapear esse cenário, continuando um trabalho iniciado para trabalhar a trabalhar com planejamento estratégico e com indicadores a serem mensurados. Além da representatividade, uma das principais bandeiras é a profissionalização maior das ações da Sociedade como entidade médica representativa, fortalecendo a aproximação com nosso associado, mas também com a Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica (SBOC) e com a cirurgia oncológica (SBCO), porque evidentemente o enfrentamento do câncer é multidisciplinar e precisamos trabalhar de forma conjunta.
E na educação médica continuada ou ações para o jovem profissional?
Temos um desafio muito grande, porque o projeto das 80 máquinas veio com um fomento à residência médica em Radioterapia para atuar nas unidades do SUS, os Cacons e Unacons, inclusive com incentivo financeiro para abrir 100 novas residências. Hoje estamos enfrentando uma profusão de novos especialistas formados em cenários de limitação tecnológica. Isso está se refletindo nas Provas de Título de Especialista, com uma taxa de aprovação baixa de algumas instituições, apesar de mantermos a média em números absolutos, o que mostra que talvez as residências que estão estruturadas há mais tempo são as que conseguem formar especialistas. Queremos regionalizar ações de educação continuada, principalmente em tecnologia. Boa parte da radioterapia ainda é bidimensional e naturalmente no resto do mundo já é tridimensional. Ao invés de usar raio-X para marcar o alvo, se usa tomografia. Então, esse salto do 2D para o 3D requer um pouco de experiência e a SBRT está planejando iniciativas para tentar compensar essas dificuldades. É um desafio muito grande, mas é, sem dúvida, uma bandeira que vamos defender.
*Arthur Accioly Rosa é médico pela Universidade Federal da Bahia(1995), com residência no Instituto Nacional do Câncer (INCA, 2001). Atualmente, é coordenador do serviço de Radioterapia do Hospital Português, em Salvador, onde também atua no Hospital São Rafael e na Delfim Radioterapia.