A relação cada vez mais estreita entre os hábitos alimentares e o surgimento de diversos tipos de câncer é tema do artigo de Daniel Fernandes (foto), cirurgião oncológico, Mestre em Oncologia do INCA, e professor de cirurgia oncológica da UNIGRANRIO.
{jathumbnail off}Por Daniel Fernandes
A relação entre Dieta e Câncer vem sendo estudada por diversos grupos de pesquisa pelo mundo todo, uma vez que a obesidade e o câncer tornaram-se um problema de saúde pública mundialmente. Hoje, já sabemos que o estilo de vida tem uma importante participação no surgimento do câncer. Os hábitos alimentares, ingestão de bebidas alcoólicas, tabagismo e sedentarismo estão intimamente relacionados com diversos tipos de câncer, principalmente: mama, próstata, cólon e reto, pulmão, esôfago, endométrio e laringe. Segundo dados do INCA(que este ano lançou um site sobre alimentação, nutrição e prevenção do câncer), a alimentação e a nutrição inadequadas são classificadas como a segunda causa de câncer que pode ser prevenida.
Recentemente, foi publicado no New England Journal of Medicine (NEJM) um artigo muito interessante, intitulado: Body Fatness and Cancer – Viewpoint of the IARC Working Group (N Engl J Med 2016; 375:794-798. August 25, 2016, DOI: 10.1056/NEJMsr1606602), no qual a Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (IARC) da Organização Mundial da Saúde (OMS) demonstrou que pacientes obesos têm maior risco de desenvolver câncer de cólon e reto, esôfago, rim, mama na pós-menopausa, endométrio, cárdia, fígado, vesícula biliar, pâncreas, ovário, tireóide, meningioma e mieloma múltiplo.
Para realizar este estudo foi montado um grupo de trabalho com 21 pesquisadores internacionais independentes. Os pesquisadores realizaram uma revisão sistemática da literatura científica, onde avaliaram mais de 1000 estudos, incluindo ensaios clínicos, estudos de coorte, estudos de caso-controle, estudos experimentais em animais e sobre os mecanismos que ligam a obesidade ao câncer.
No estudo, foi utilizada a Tabela 1 abaixo, para seleção dos artigos com o tema de interesse, uma vez que, nos adultos, uma boa medida para estimar o excesso de gordura no corpo é o IMC (Índice de Massa Corporal, calculado pela divisão do peso pela altura ao quadrado), pelo qual consegue-se classificar o sobrepeso e a obesidade.
Durante a análise dos artigos, observou-se que o risco de desenvolver certos tipos de câncer estava diretamente relacionado com o IMC, como pode ser demonstrado na Tabela 2. O risco relativo para o desenvolvimento dos cânceres de cólon, cárdia, fígado, vesícula biliar, pâncreas e rim, foi de 1.2 a 1.5 para pacientes com sobrepeso e de 1.5 a 1.8 para pacientes obsesos, respectivamente. Para o adenocarcinoma de esôfago o risco relativo foi de até 4.8 para pacientes com IMC maior ou igual a 40.
Em relação aos cânceres ginecológicos, foi observada uma associação positiva, em vários estudos, entre o IMC e o câncer de mama pós-menopausa (risco relativo de aproximadamente 1.1 por cada 5 unidades de IMC), particularmente em tumores com receptores hormonais positivos. No câncer de endométrio, observou-se uma forte relação diretamente proporcional ao IMC, com risco relativo de 1.5 para sobrepeso, 2.5 para obesidade classe 1, 4.5 para obesidade classe 2, e 7.1 para obesidade classe 3. Já em relação ao câncer de ovário a correlação foi modesta, com um risco relativo de 1.1.
Segundo o artigo, no mundo, 640 milhões de adultos e 110 milhões de crianças e adolescentes são obesos (dados de 2014 e 2013, respectivamente). No Brasil, 56,9% da população apresenta excesso de peso e 20,8% é obesa, representando 82 milhões de brasileiros com mais de 18 anos acima do peso adequado (Pesquisa Nacional de Saúde - PNS, 2013). Mudanças no padrão de alimentação tradicional (substituição da comida de verdade por alimentos processados) e o sedentarismo são as principais causas do excesso de peso no Brasil. Sendo assim, caso a população adotasse uma alimentação saudável associada à prática de exercícios físicos regulares, mantendo o peso corporal adequado, cerca de um em cada três casos dos tipos de cânceres mais comuns poderiam ser evitados.