Qual o impacto da inovação nas diferentes etapas da jornada do paciente com câncer? Essa é a proposta da Onco Jornada, série de encontros organizados pela Thermo Fisher Scientific que tem como objetivo apresentar e discutir como as inovações tecnológicas se transportam da bancada do laboratório para o leito do paciente.
A primeira edição foi realizada no dia 28 de maio, com transmissão online, e teve como foco o diagnóstico oncológico, além de medicina de precisão - testes moleculares, sequenciamento e proteômica.
“Apesar de um aumento expressivo nos novos casos de câncer, temos observado uma queda na mortalidade1. Isso é um reflexo dos esforços na pesquisa em oncologia, com avanços tanto em diagnóstico, como no tratamento. A Thermo Fisher é parte importante no desenvolvimento dessas soluções que vêm transformando o cenário da oncologia, e é isso que queremos mostrar ao longo das edições da Onco Jornada”, afirmou Selma Cavalli, Biosciences Director, LatAm and Brazil country leader da Thermo Fisher Scientific.
O uso do Freelite® como biomarcador para diagnóstico e monitoramento de gamopatias monoclonais ilustra bem o impacto da inovação nos resultados dos pacientes.
O mieloma múltiplo é uma doença de diagnóstico bastante desafiador por conta da inespecificidade da sintomatologia apresentada no início da doença, reforçando a necessidade de estratégias, conhecimento e testes específicos para agilizar o diagnóstico. As investigações laboratoriais para gamopatias monoclonais são tradicionalmente realizadas através da quantificação das imunoglobulinas intactas pela eletroforese, além da imunofixação e de exames de urina.
“A eletroforese isolada não possui sensibilidade suficiente para detectar todos os casos, o que torna necessário a utilização de testes adicionais para a identificação das cadeias leves livres monoclonais que vão confirmar esse diagnóstico. A associação do Freelite® (quantificação das cadeias kappa lambda leves livres) com a eletroforese desde a suspeita inicial até o diagnóstico confirmado permite identificar quase 100% dos casos”, esclarece Dra Elyara Soares, Medical Affairs Specialist da Thermo Fisher.
O Freelite® é um ensaio totalmente automatizado que permite a quantificação das cadeias leves e livres kappa e lambda isoladas da imunoglobulina pesada. Realizado no soro, o teste é totalmente automatizado, altamente sensível e recomendado pelas diretrizes médicas nacionais e internacionais2-5. O teste foi incorporado entre os critérios do International Mieloma Working Group (IMWG) para diagnóstico do mieloma múltiplo do em 2014.
“A atualização do IMWG incorporou três novos biomarcadores de malignidade: porcentagem clonal de células plasmáticas da medula óssea ≥ 60%; proporção de cadeias leves livres séricas envolvidas/não envolvidas ≥ 100; e > 1 lesão focal em estudos de ressonância magnética. Essas 3 alterações têm 80% de chance de evoluir em dois anos para um dano orgânico. Em relação ao Freelite®, quando a relação é maior que 100, 27% já evoluem com disfunção renal. A única indicação de tratamento que mudou completamente a conduta nesse caso foi o Freelite®, para tratar uma paciente precocemente, antes de um evento mais importante”, afirmou Dra Maricy Viol, hematologista do Hospital Alemão Oswaldo Cruz e da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.
“Hoje em dia, o exame tem cobertura pelos planos de saúde, e estamos batalhando para que em breve ele esteja disponível para pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS)”, destaca Elyara.
Valor preditivo da procalcitonina
Apesar de ser um biomarcador não oncológico, a procalcitonina é muito importante para o manejo de paciente, especialmente aqueles que apresentam neutropenia febril, uma condição associada à alta morbidade e mortalidade.
“Alguns estudos defendem que não são todos os pacientes com neutropenia febril que necessitam de hospitalização e internação em unidades de terapia intensiva (UTIs). Nesses casos, a procalcitonina pode ser um importante aliado para identificar quem são os pacientes que de fato necessitam de intervenção e tratamento com antibióticos”, observa Tatiana Zanareli, especialista de produtos da Thermo Fisher Scientific.
Um estudo brasileiro publicado no periódico Journal of Critical Care avaliou o conhecimento de médicos sobre os conceitos de síndrome da resposta inflamatória sistêmica (SIRS), sepse, sepse grave e choque séptico. Os resultados mostraram que entre 917 médicos, apenas 27% conseguiram identificar a sepse rapidamente no início6.
“Essa é uma estatística muito grave, e nós temos uma ferramenta que pode contribuir para mudar esse cenário, mas que ainda é pouco utilizada. A procalcitonina já é um teste que está no mercado há bastante tempo, porém ainda com poucos protocolos nos hospitais”, lamenta Tatiana.
A calcitonina é um hormônio produzido pela tireoide que atua na regulação dos níveis de cálcio no organismo. A procalcitonina (PCT), um peptídeo precursor da calcitonina, é um marcador inflamatório que pode ajudar a identificar infecções bacterianas, avaliar o risco de complicações e a resposta ao tratamento com antibióticos.
“Quanto mais importante for a infecção, maior vai ser a concentração de procalcitonina. Em um paciente com neutropenia febril que não tem claramente uma infecção aparente, a procalcitonina vai estar elevada”, diz Tatiana.
Um estudo de coorte retrospectivo avaliou o uso de procalcitonina em casos de neutropenia febril entre pacientes adultos que deram entrada no pronto-socorro em comparação com um grupo controle não neutropênico e febril. O endpoint primário foi mortalidade hospitalar, com internação na UTI como endpoint secundário.7
“Nesse estudo com mais de 4 mil pacientes, a dosagem de procalcitonina no pronto socorro teve um valor preditivo negativo, com chance de mortalidade hospitalar quase 9 vezes maior em pacientes com procalcitonina elevada”, observou Maricy, destacando que com os novos tratamentos oncohematológicos a procalcitonina é uma ferramenta muito importante para a diferenciação entre infecção e SIRS.
A hematologista acrescenta que além da sua utilidade no diagnóstico precoce e no monitoramento da infecção bacteriana e da sepse, a avaliação da procalcitonina também é importante para promover o desescalonamento do uso de antibióticos. “Os pacientes fazem uso de antibióticos de amplo espectro, que muitas vezes vão piorar a disfunção renal, ter efeitos colaterais muito importantes. Os valores da procalcitonina, quando a gente observa uma queda maior que 80%, nos indicam a possibilidade de desescalonar a antibioticoterapia. É um marcador que realmente muda a nossa conduta na prática clínica”, avalia.
Tecnologias moleculares em medicina de precisão
“O câncer é uma doença do genoma, e existem diversos tipos de ferramentas de análise genética que nos possibilitam interrogar diferentes etapas das investigações em câncer”, afirma Roberto Ribeiro, especialista da linha de sequenciamento de nova geração (do inglês, NGS – Next Generation Sequencing) na Thermo Fisher Scientific.
A empresa possui um amplo portfólio de tecnologias que possibilitam trabalhar de ponta a ponta em diferentes fluxos de trabalho. A parte pré-analítica, ou seja, antes da análise em si, inclui soluções para extração de ácidos nucléicos das amostras, e quantificação e qualificação, que são aspectos importantes para garantir a qualidade das análises oncológicas.
Uma das tecnologias para análise genética é o sequenciamento, que tem diversas aplicações na oncologia pois as alterações genéticas encontradas nas células tumorais contribuem para o desenvolvimento e a progressão do câncer, além de serem relevantes para o tratamento. “Além das avaliações de fragmentos e mutações específicas com análise de sequenciamento Sanger, Ribeiro destacou a análise de instabilidade de microssatélites, feita com o kit TrueMark MSI, que pode ser realizada em nossos instrumentos de sequenciamento de eletroforese capilar”, explica.
A empresa também conta com soluções para NGS, ou sequenciamento em larga escala, metodologia que permite análise de múltiplos biomarcadores simultaneamente. As soluções Oncomine são uma abordagem integrada baseada em análise de painéis de genes para informar as decisões mais críticas e concretizar a promessa da oncologia de precisão.
Para NGS, Ribeiro destaca o Ion GeneStudioTM S5, equipamento que possibilita maior rendimento e uma gama grande também de aplicações distintas, e o Ion TorrentTM GenexusTM, o equipamento mais moderno para sequenciamento de nova geração, que possibilita realizar o sequenciamento em até 24 horas, de maneira totalmente automatizada.
Medicina de Precisão no SUS
Luciana Nardinelli, farmacêutica chefe do Laboratório de Biologia Tumoral do Serviço de Hematologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP) compartilhou a experiência da utilização do sequenciamento de nova geração na prática de um serviço médico do Sistema Único de Saúde (SUS), apresentando alguns casos clínicos onde o resultado do teste NGS fez a diferença e mudou a conduta clínica do paciente.
“Hoje o NGS mieloide é uma realidade em nosso serviço, e é consenso entre os médicos a diferença entre as decisões clínicas antes e depois do NGS, especialmente para aqueles pacientes que são elegíveis para o transplante de medula óssea”, ressalta Luciana, que diz analisar 16 amostras por mês entre as leucemias mieloides agudas, síndromes mielodisplásicas, doenças mieloproliferativas crônicas e algumas leucemias linfoide aguda (LLA) que são bifenotípicas.
Em parceria com a Thermo Fisher, o laboratório utiliza o OncomineTM Myeloid Research Assay, um kit com um painel para fusões bastante robusto, com 29 genes drivers que resulta na possibilidade de detecção de mais de 600 fusões, além de dois painéis de mutações onde são sequenciados hotspots de 23 genes e 17 genes completos.
Luciana explica que os painéis convencionais (sem ser NGS) realizam análises individuais de cada gene, utilizando técnicas diferentes, limitando o número de biomarcadores que são avaliados. Além disso, ela ressalta que as doenças onco-hematológicas são clonais, o que acaba gerando muitos resultados falso-negativos, não pela ausência do marcador no paciente, mas pela sensibilidade da técnica utilizada.
“Nós não sequenciávamos o TP53, que é um gene de suma importância no prognóstico do paciente, porque é um gene que precisa ser sequenciado de forma completa, o que tornava praticamente inviável fazermos na rotina”, exemplifica. “Outra grande vantagem é a sensibilidade do Painel de NGS, que favorece a detecção de variantes com baixa frequência alélica”, diz.
Espectrometria de Massas e Oncologia
Luiz Fernando Santos, consultor da linha de cromatografia espectrometria de massas, trouxe um panorama da atuação da Thermo Fisher em cromatografia líquida e espectrometria de massas. “Lançado ano passado, o Orbitrap Astral estabelece um novo padrão para desempenho de espectrometria de massa e promete ter um impacto muito grande no que é conhecido como proteômica clínica”, avalia.
O Orbitrap Astral reúne dois analisadores de massas de alta resolução e é capaz de identificar mais de 8 mil proteínas em uma corrida de apenas 8 minutos. “Apesar de ser difícil de ser atingido, esse número de 8 mil proteínas identificadas até era possível, mas normalmente considerando corridas cromatográficas de uma ou duas horas, às vezes até mais”, esclarece, ressaltando que com Orbitrap Astral é possível atingir esse número em apenas 8 minutos.
“A ideia é que isso alavanque ainda mais a proteômica na área clínica, onde temos uma quantidade de amostras considerável, muitas vezes considerando a proteômica de toda uma população ou de toda uma determinada condição. Então, a velocidade de aquisição é extremamente relevante”, diz.
A aplicação clínica da espectrometria de massas também é o foco da pesquisadora Livia Eberlin, professora associada e membro do Interdisciplinary Surgical Technology and Innovation Center (INSTINCT), do departamento de cirurgia do Baylor College of Medicine.
A pesquisadora criou a MasSpec Pen, um dispositivo de espectrometria de massas portátil biocompatível para diagnóstico rápido e não destrutivo de tecidos cancerígenos humanos. A caneta MasSpec permite a entrega controlada e automatizada de uma gota de água discreta a uma superfície de tecido para extração eficiente de biomoléculas, que são transmitidas ao espectrômetro de massa para análise molecular. “O tempo de análise é rápido, depende do cumprimento do tubo que é preciso usar, especialmente na sala cirúrgica. Mas às vezes é 10 segundos, 20 segundos por análise, e temos atingido uma precisão na classificação de aproximadamente 96%”, comemora Lívia.
Segundo a pesquisadora, o objetivo foi criar um dispositivo que fosse extremamente fácil de ser utilizado e que não exigisse experiência prévia com espectrometria de massa. “Queremos democratizar o acesso a espectrometria de massas, e mostrar suas aplicações fora dos laboratórios focados em pesquisa básica”, diz.
Lívia ressalta ainda o caráter completamente não destrutivo à histologia do tecido, o que permite adaptar o uso da caneta ao fluxo de trabalho da análise clínica e incorporar a análise por espectrometria de massas de uma forma complementar ao que já é realizado. Além disso, a pesquisadora observa que além de informar se o tecido analisado é câncer, o dispositivo consegue determinar, em alguns casos, o subtipo da doença, crucial para determinar o tratamento oncológico preciso.
A MasSpec Pen também tem aplicações em identificação de tecidos, ajudando os cirurgiões a identificarem estruturas anatômicas de uma forma não destrutiva, antes da extração. “Também trabalhamos com margens cirúrgicas, e temos um projeto no MD Anderson Cancer Center para a detecção de metástase de câncer de ovário durante a cirurgia para remoção completa do tumor”, conclui Lívia.
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Referências:
1 - https://www.gov.br/inca/pt-br/assuntos/cancer/numeros
2 - Keren DF, Bocsi G, Billman BL, Etzell J, Faix JD, Kumar S, et al. Arch Pathol Lab Med 2021;146:575-90
3 - International Myeloma Working Group Guidelines for serum free light chains in multiple myeloma and other related disorders, Dispenzieri Leukemia 2009;23:215-24
4 - Rajkumar SV, et al. International Myeloma Working Group updated criteria for the diagnosis of multiple myeloma. Lancet Oncol 2014; 15:e538-e548
5 - National Comprehensive Cancer Network clinical practice guidelines in oncology
6 - Assunção M et al. J Crit Care. 2010;25(4):545-552.
7 - Coyne et al., Medicina 2022, 58, 985. https://doi.org/10.3390/medicina58080985