Onconews - Câncer de próstata familial e hereditário

CASALI 2018 NET OKArtigo de Beebe-Dimmer, JL et al mostra resultados de análise que envolveu mais de 619.630 homens e amplia a compreensão do câncer de próstata associado a síndromes hereditárias e de base familial. “São resultados valiosos para entender populações de alto risco que podem se beneficiar da triagem genética e da vigilância aprimorada”, analisam os autores, no Journal of Clinical Oncology (JCO).  Quem comenta é o oncogeneticista José Cláudio Casali (foto), chefe do Departamento de Oncogenética do A.C.Camargo Cancer Center e 2º Diretor Científico do Grupo Brasileiro de Oncologia de Precisão (GBOP).

O Banco de Dados de Base Populacional de Utah foi usado para identificar 619.630 homens com idade ≥ 40 anos, com histórico de câncer em pelo menos três gerações consecutivas. Cada homem foi avaliado quanto ao histórico familiar de câncer de próstata (CP) associados às síndromes HPC (do inglês, hereditary prostate cancer syndrome), de tumores associados à síndrome HBOC (hereditary breast and ovarian cancer syndrome) como de mama, ovário e pâncreas; e à síndrome de Lynch (SL), como câncer gastrointestinal e de endométrio, entre outros definidos pelos guidelines NCCN. 

Os casos registrados de câncer de próstata (N = 36.360) foram classificados clinicamente em um ou mais subtipos: câncer de próstata de início precoce (EO, do inglês early onset), câncer de próstata letal e câncer de próstata clinicamente significativo ou "agressivo". Os riscos relativos (RRs) de cada subtipo, ajustados para covariáveis ​​importantes, foram calculados no STATA usando regressão de Poisson modificada.

Resultados

O histórico familiar (HF) de múltiplos CP definindo síndrome de cânxer de próstata heriditário foi responsável pelo maior risco relativo (RR 2,30; IC 95%, 2,22 a 2,40), seguido do agrupamento familial e das síndromes HBOC e SL (RR 1,81; RR 1,47; e RR 1,16, respectivamente). O risto relativo foi proporcionalmente maior quanto maior o número de familiares em 1º grau afetados por câncer de próstata. Nesse grande estudo de base populacional, o risco de câncer de próstata hereditário foi fortemente associado à doença de início precoce (RR 3,93) e maior letalidade (RR 2,21), achado consistente com a contribuição de fatores genéticos de alta penetrância para a ocorrência da doença.

“Esses resultados são valiosos para compreender e encaminhar programas de rastreamento em populações de alto risco que se beneficiariam da triagem genética e da vigilância aprimorada”, destaca o estudo.

Casali explica que entre os fatores de risco para câncer de próstata, a suscetibilidade genética contribui com até 40% de todos CP diagnosticados, porém apenas 15% destes tem sua conexão genética causal conhecida, associados principalmente aos casos de mutações em genes de alta penetrância e herança dominante como BRCA1 e BRCA2. “A cidade de Salt Lake City foi o berço da descoberta do gene BRCA1 em 1994, e conta com um dos mais antigos registros populacionais organizados do mundo, com mais 11 milhões de registros desde os primórdios do colonialismo americano. Não por acaso, este estudo de grandes dimensões sobre os fatores de risco genéticos pôde ser realizado com grande poder estatístico”, diz.

O especialista observa que genes de reparo do DNA do tipo recombinação homóloga (HRR) e de mismatch (MMR), associados com HBOC (p.e. BRCA2, ATM, CHEK2) e com a SL (MHS2, MLH1), respectivamente, têm sido associados com risco entre 2 e 7 vezes maior de câncer de próstata ao longo da vida, com recomendações de rastreamento a partir dos 40 anos. “Aparentemente, a história de múltiplos CP em familiares próximos deve aumentar a vigilância, devendo iniciar o rastreamento mais cedo de familiares de risco. Variantes patogênicas em novos genes de penetrância moderada, como HOXB13, e o risco poligênico determinado por variantes de baixa e média penetrância devem esclarecer nos próximos anos novos fatores genéticos para CP familial”, afirma.

“Nos tempos da oncologia de precisão, a prevenção personalizada baseada em modelos de estratificação de risco populacional deverá ganhar força nos próximos anos com programas de rastreamento populacional oncológico adaptados às principais síndromes de câncer hereditário”, conclui Casali.

Referência: Risk of Prostate Cancer Associated With Familial and Hereditary Cancer Syndromes - Jennifer L. Beebe-Dimmer; Ashley L. Kapron; Alison M. Fraser; Ken R. Smith; and Kathleen A. Cooney - DOI: 10.1200/JCO.19.02808 Journal of Clinical Oncology - Published online March 24, 2020.