O carcinoma decorrente de uma cicatriz da parede abdominal associada à endometriose é uma entidade rara e não há diretrizes de tratamento específicas. Eduardo Paulino (foto), Andreia Cristina de Melo e Vinícius Freire da Silva, do Departamento de Ginecologia Oncológica do Instituto Nacional do Câncer (INCA), relatam estudo de caso em artigo no American Journal of Case Report que revisa a literatura sobre diagnóstico, apresentação clínica, tratamento e prognóstico.
O artigo descreve mulher de 45 anos, com 1 filho e sem comorbidades anteriores (incluindo histórico de endometriose), admitida no INCA em outubro de 2017 com história de 1 ano de lesão crescente e indolor no quadrante inferior direito, com aparência cística, medindo 10 × 6 cm, próxima a uma cicatriz abdominal (devido à hemicolectomia de condição benigna há 23 anos). Avaliação ginecológica confirmou a presença de massa pélvica. Tomografia computadorizada e radiografia de tórax realizadas em novembro/2017 mostraram útero aumentado de 18,8 cm com presença de múltiplos miomas (alguns com calcificações) e 9,8 cm de massa infiltrativa na parede abdominal da região umbilical, com linfonodos inguinais bilaterais proeminentes.
Diante de uma lesão altamente suspeita, a opção da equipe do INCA foi realizar ampla ressecção da parede abdominal, juntamente com histerectomia e salpingo-ooforectomia. A paciente foi acompanhada por equipe multidisciplinar, com amparo do oncologista ginecológico, cirurgião plástico e cirurgião do tecido conjuntivo.
O relatório final da patologia demonstrou endometriose associada a um adenocarcinoma endometrioide grau II na parede abdominal. Novos exames de imagem indicaram suspeita de linfonodos bilaterais inguinal e axilar direito (1,9 cm), sem outros locais de doença metastática. O tratamento de escolha foi acetato de megestrol 160 mg / dia por 8 meses, com resultados que apontam resposta parcial.
“O carcinoma decorrente de uma cicatriz da parede abdominal associada à endometriose é uma entidade rara, e não há diretrizes específicas de tratamento. Esses pacientes devem ser avaliados por equipe multidisciplinar para tomada de decisão. Opções para tratamento adjuvante e paliativo para câncer de endométrio são geralmente empregadas “, concluíram os autores.
Paulino et al lembram que Robert Meyer descreveu pela primeira vez a endometriose em uma cicatriz cirúrgica em 1903.” Os focos de tecido em cicatrizes cirúrgicas é o desenvolvimento de nódulo imóvel na cicatriz ou próximo a ela, com inchaço e dor durante a menstruação. A transformação maligna é muito rara (0,3-1%)”, destaca o estudo brasileiro.
Referência: Endometrioid Carcinoma Arising from an Endometriosis-Associated Abdominal Wall Scar. Eduardo Paulino, Andreia Cristina de Melo, Vinicius Freire da Silva. Am J Case Rep 2020; 21:e922973: DOI: 10.12659/AJCR.922973