Há amplo consenso para a adição da radioterapia da próstata ao tratamento padrão (SOC) como primeira linha em homens com diagnóstico recente de câncer de próstata de novo, mas não há consenso sobre a associação da carga metastática óssea nos resultados terapêuticos e desfechos clínicos. É o que sustenta artigo de Ali et al. no Jama Oncology, indicando que a carga metastática é preditiva de sobrevida, com ganho de 22% em 3 anos na população M1a. Quem comenta é Robson Ferrigno, médico especialista em radioterapia.
Os autores apontam controvérsias na definição de baixa carga metastática no câncer de próstata, lembrando que a maioria dos critérios discrimina subgrupos usando uma combinação de fatores com limiares diferentes. “Além disso, devido à natureza histórica dos critérios de definição para carga metastática, o papel da RT prostática no tratamento de homens que apresentam apenas linfonodos não regionais ou metástases viscerais não foi relatado”, observam.
Nesta análise, Ali et al. consideraram dados da comparação da coorte M1 RT do estudo STAMPEDE para explorar a associação da carga metastática óssea nos resultados do tratamento após RT e examinar a influência dos locais metastáticos e da presença nodal (isolada ou visceral). “Usamos uma abordagem sistemática para consolidar a noção de que o número de metástases ósseas com base na cintilografia óssea convencional é preditivo do benefício de sobrevida da adição de RT de próstata ao SOC no câncer de próstata metastático recém-diagnosticado”, descrevem os autores.
Resultados
Varreduras ósseas basais de 2061 pacientes foram incluídas e 1939 (94%) foram consideradas para análise de SOC versus SOC+RT entre 22 de janeiro de 2013, na comparação com STAMPEDE M1 RT.
A mediana de idade foi de 68 anos e a mediana do nível de PSA pré-ADT foi de 98 ng / mL. Dos 1939 pacientes incluídos, 1587 (82%) tinham metástases ósseas com ou sem metástases linfonodais pélvicas adicionais, 181 (9%) tinham apenas metástases em linfonodos regionais (M1a) e 171 (9%) tinham metástases viscerais e/ou outras. O acompanhamento mediano foi de 37 (24-48) meses.
Em subpopulações de pacientes com 1, 2 e 3 metástases ósseas, a RT da próstata foi associada a uma melhora absoluta de 8,5%, 6,2% e 5,8% na sobrevida estimada em 3 anos, respectivamente. A partir de 4 metástases ósseas, o benefício estimado de sobrevida da RT da próstata diminuiu continuamente.
Os resultados revelam que a carga metastática óssea com base na imagem convencional é preditiva do benefício de sobrevida global (SG) e sobrevida livre de falha (FFS) quando a RT da próstata é adicionada ao SOC em mPCa recém-diagnosticado. Este benefício é mais pronunciado em pacientes com até 3 metástases ósseas. Em pacientes com doença M1a, a melhora absoluta foi de 22% em 3 anos.
“A carga metastática óssea com base na imagem convencional é preditiva do benefício de SG e FFS quando a RT da próstata é adicionada ao SOC no mPCa recém-diagnosticado. Este efeito benéfico é mais pronunciado em pacientes com até 3 metástases ósseas”, conclui a análise.
Por outro lado, não houve evidência de benefício de FFS ou SG em pacientes com metástases viscerais / outras. “Tomados em conjunto, nosso estudo reforça o papel preditivo de sítios metastáticos não ósseos dentro dos critérios de carga metastática”.
Quem analisa os resultados é Robson Ferrigno, médico especialista em radioterapia.
Comentários – Robson Ferrigno
O benefício da radioterapia da próstata para tratamento do tumor primário em pacientes com metástase a distância é discutível e vem sendo analisado em pacientes recrutados para o estudo STAMPEDE.
A primeira análise da radioterapia da próstata em pacientes metastáticos do estudo STAMPEDE foi publicada por Parker e colaboradores no periódico Lancet em 20182. A adição da radioterapia na próstata aumentou a sobrevida livre de falha de forma significativa (HR=0,76; 95% CI 0,26-0,84; p<0.0001). A sobrevida global não foi aumentada para todos os pacientes, porém, houve benefício para aqueles com baixo volume de doença metastática (HR=0,68, 95% CI 0,52–0,90; p=0.007). Para esse grupo de pacientes, a sobrevida global em 3 anos foi maior nos que receberam radioterapia da próstata (81% versus 73%)2.
No estudo em questão, Ali e colaboradores fizeram uma nova análise especificando o volume de doença metastática. O benefício do emprego da radioterapia da próstata para o tratamento do tumor primário foi maior em pacientes com apenas linfonodos extra pélvicos comprometidos (M1a) e naqueles com até 3 sítios de metástase óssea sem doença visceral, mensurada através da sobrevida global em 3 anos (HR=0,62, 95% CI 0,46-0,83; p=0,003) e para sobrevida livre de falha (HR=0,57, 95% CI 0,47-0,70; p=0,002) 1.
Esses achados vêm ao encontro daqueles encontrados previamente por Parker e colaboradores no sentido de considerarmos o tratamento do tumor primário da próstata para os pacientes com baixo volume de doença metastática (oligometastáticos). Os principais candidatos para essa estratégia são, portanto, os com até 3 lesões ósseas metastáticas e os com metástases linfonodais extra pélvicas isoladas.
Referências:
1 - Ali A, Hoyle A, Haran ÁM, et al. Association of Bone Metastatic Burden With Survival Benefit From Prostate Radiotherapy in Patients With Newly Diagnosed Metastatic Prostate Cancer: A Secondary Analysis of a Randomized Clinical Trial. JAMA Oncol. Published online February 18, 2021. doi:10.1001/jamaoncol.2020.7857
2 - Parker CC, James ND, Brawley CD, et al. Radiotherapy to the primary tumour for newly diagnosed, metastatic prostate cancer (STAMPEDE): a randomized controlled phase 3 trial. Lancet 2018; 392:2353-66.