Onconews - Danos e benefícios do rastreamento mamográfico no Brasil

arn migowski 2 bxO médico epidemiologista Arn Migowski (foto) é o primeiro autor de estudo que buscou estimar o número de mortes evitadas e induzidas por diversos protocolos de rastreamento mamográfico no Brasil, com coortes de mulheres em diferentes faixas etárias e intervalos de triagem. Os resultados refletem o mais amplo estudo já publicado sobre estimativa de danos do rastreamento do câncer de mama, avaliando não apenas o impacto em termos de mortes evitadas, mas também um amplo espectro de mortes causadas pelo rastreamento.

Na ausência de evidências sobre o impacto do rastreio mamográfico na mortalidade global, os autores contextualizam um cenário onde muitas tentativas de determinar o equilíbrio entre os danos e benefícios da triagem comparam resultados diferentes. Os benefícios são geralmente expressos por um resultado mais grave (mortalidade por câncer de mama) e os danos são expressos por resultados intermediários, como taxa de sobrediagnóstico e falso-positivos, achados que limitam a tomada de decisão de médicos e pacientes.

Nesta análise, os pesquisadores consideraram nove combinações possíveis entre benefícios e danos para cada protocolo, compreendendo a proporção de ‘vidas salvas’ e ‘vidas perdidas’ com o rastreamento mamográfico, além de outras análises de sensibilidade, incluindo o número necessário para convidar para a triagem para evitar um óbito (NNS).

Os resultados dessa simulação mostram que de todos os protocolos de triagem avaliados, o mais eficiente foi o rastreamento bienal dos 60 aos 69 anos de idade, com quase três vezes mais mortes evitadas do que o rastreio bienal dos 50 aos 59 anos de idade, com um número semelhante de mortes evitadas pelo rastreio bienal dos 50 aos 69 anos de idade e com o maior benefício líquido.

O rastreamento anual na faixa etária de 40 a 49 anos praticamente duplica os danos, como resultados falso-positivos e excesso de biópsias, quando comparada ao rastreamento bienal na faixa etária de 50 a 59 anos ou de 60 a 69 anos, além de aumentar os casos de sobretratamento Com relação aos danos o grande destaque foram os cardiovasculares.

Os autores descrevem que na comparação com o melhor cenário de rastreio anual de 40 a 49

anos de idade, o NNS do protocolo com triagem bienal dos 60 aos 69 anos foi

três vezes mais baixo (veja abaixo). No entanto, Migowski e colegas destacam que, mesmo na faixa etária dos 50-69 anos, a redução estimada na mortalidade por câncer de mama no Brasil foi metade da estimada para o Reino Unido.

Além de Arn Migowski, dos Institutos Nacionais de Cardiologia e de Câncer (INC e INCA), o estudo tem participação de Paulo Nadanovskye Cid Manso de Mello Vianna, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).

A íntegra da publicação está disponível na PLoS ONE em acesso aberto.  

Efetividade do rastreamento mamográfico no Brasil, por grupo etário

Age group

RR

ARR (%)

NNS

Deaths avoided*

40–49 years (best scenario)

0.92

0.034%

2,964

3.37

40–49 years (additional analysis)

0.93

0.030%

3,387

2.95

40–49 years (additional analysis)

0.88

0.051%

1,976

5.06

50–59 years (base case)

0.86

0.083%

1,205

8.30

50–59 years (best scenario)

0.68

0.190%

527

18.97

50–59 years (worst scenario)

0.97

0.018%

5,623

1.78

60–69 years (base case)

0.67

0.230%

435

22.98

60–69 years (best scenario)

0.54

0.320%

312

32.03

60–69 years (worst scenario)

0.83

0.118%

845

11.84

50–69 years (base case)

0.78

0.229%

437

22.86

50–69 years (best scenario)

0.69

0.322%

310

32.22

50–69 years (worst scenario)

0.90

0.104%

962

10.39

50–69 years (additional analysis)

0.80

0.208%

481

20.78

RR = Relative Risk; ARR = Absolute Risk Reduction

NNS = Number Needed to invite for Screening to avoid a death from breast cancer.

*Deaths avoided in 10,000 women invited to screening in the age group.

Adaptado de Migowski et al, PLoS ONE, 2024

Mortes evitáveis e mortes causadas pelo rastreamento mamográfico no Brasil

(comparação entre 10.000 mulheres que realizaram rastreamento mamográfico em relação àquelas que não realizaram triagem mamográfica, por grupos etários)

Adaptado de Migowski et al, PLoS ONE, 2024

Benefits and harms associated with mammography screening

Number of deaths prevented and deaths caused by mammographic screening

Biennial screening from 50 to 59 years old

Biennial screening from 60 to 69 years old

Annual screening from 40 to 49 years old

BS

BC

WS

BS

BC

WS

BS

BC

WS

Breast cancer deaths prevented by screening

18.968

8.299

1.778

32.026

22.975

11.836

3.374

0.000

0.000

NNS (to prevent a breast cancer death)

527

1205

5623

312

435

845

2964

NA

NA

Deaths from breast cancer radio induced by mammograms

0.083

0.129

0.141

0.037

0.057

0.063

0.544

0.842

0.926

Deaths caused by overtreatment with surgery

0.000

0.040

0.050

0.000

0.061

0.075

0.000

0.071

0.088

Deaths from cardiovascular disease caused by RT overtreatment

0.103

0.257

0.428

0.673

1.558

2.596

0.073

0.197

0.328

Deaths from lung cancer caused by RT overtreatment

0.075

0.075

0.136

0.151

0.151

0.273

0.081

0.081

0.147

Esophageal cancer deaths caused by RT overtreatment

0.000

0.000

0.028

0.000

0.000

0.073

0.000

0.000

0.027

Deaths from pulmonary embolism caused by RT overtreatment

0.000

0.000

0.023

0.000

0.000

0.089

0.000

0.000

0.020

Deaths from sarcoma caused by RT overtreatment

0.000

0.000

0.018

0.000

0.000

0.027

0.000

0.000

0.032

Suicide deaths associated with overdiagnosis

0.000

0.001

0.002

0.000

0.002

0.004

0.000

0.001

0.004

Cardiovascular deaths associated with overdiagnosis

0.001

0.003

0.003

0.006

0.023

0.023

0.001

0.002

0.002

Total deaths caused by screening

0.262

0.505

0.830

0.867

1.851

3.223

0.698

1.194

1.574

Net benefit from screening*

18.706

7.793

0.948

31.159

21.124

8.613

2.676

none

none

Ratio of lives saved to lives lost

72.265

16.421

2.142

36.932

12.410

3.672

4.832

-

-

RT = Radiotherapy; BS = Best Scenario; BC = Base Case; WS = Worst Scenario*Number of deaths prevented minus number of deaths caused by screening.

 

 

Mortes evitáveis e mortes causadas pelo rastreamento mamográfico no Brasil

Adaptado de Migowski et al, PLoS ONE, 2024

 

Benefits and harms associated with mammography screening

Biennial screening from 50 to 69 years old

Annual screening from 40 to 49 years, followed by biennial screening from 50 to 69 years

 
 

BS

BC

WS

BS

BC

WS

Breast cancer deaths prevented by screening

32.216

22.863

10.392

34.806

22.307

10.139

Deaths from breast cancer radio induced by mammograms

0.120

0.186

0.204

0.664

1.027

1.130

Deaths caused by overtreatment with surgery

0.000

0.101

0.124

0.000

0.172

0.212

Deaths from cardiovascular disease caused by RT overtreatment

0.492

1.142

1.903

0.546

1.293

2.072

Deaths from lung cancer caused by RT overtreatment

0.213

0.213

0.383

0.282

0.282

0.509

Esophageal cancer deaths caused by RT overtreatment

0.000

0.000

0.097

0.000

0.000

0.120

Deaths from pulmonary embolism caused by RT overtreatment

0.000

0.000

0.107

0.000

0.000

0.123

Deaths from sarcoma caused by RT overtreatment

0.000

0.000

0.045

0.000

0.000

0.077

Suicide deaths associated with overdiagnosis

0.000

0.002

0.005

0.000

0.003

0.008

Cardiovascular deaths associated with overdiagnosis

0.004

0.016

0.016

0.004

0.014

0.014

Total deaths caused by screening

0.829

1.659

2.885

1.496

2.791

4.265

Net benefit from screening* (in number of deaths prevented)

31.387

21.204

7.507

33.310

19.515

5.875

Ratio of lives saved to lives lost

38.850

13.779

3.602

23.272

7.992

2.377

RT = Radiotherapy; BS = Best Scenario; BC = Base Case; WS = Worst Scenario

*Number of deaths prevented minus number of deaths caused by screening.

 

 

Distribuição das causas de morte (%) associadas ao rastreamento mamográfico

Adaptado de Migowski et al, PLoS ONE, 2024

 

Cause of death

Annual screening from 40–49 years

Biennial screening from 50–69 years

BS

BC

WS

BS

BC

WS

Breast cancer radioinduced by mammograms

77.92

70.46

58.83

14.47

11.19

7.08

Overtreatment with surgery

0

5.97

5.58

0

6.09

4.31

Cardiovascular diseases related to RT overtreatment

10.40

16.49

20.86

59.36

68.81

65.96

Lung cancer related to RT overtreatment

11.57

6.76

9.31

25.65

12.82

13.29

Esophageal cancer related to RT overtreatment

0

0

1.72

0

0

3.37

Pulmonary embolism related to RT overtreatment

0

0

1.29

0

0

3.70

Sarcomas related to RT overtreatment

0

0

2.03

0

0

1.57

Suicide related to overdiagnosis

0.03

0.12

0.23

0.03

0.11

0.16

Cardiovascular diseases related to overdiagnosis

0.08

0.20

0.15

0.49

0.98

0.57

Total

100

100

100

100

100

100

RT = Radiotherapy; BS = Best Scenario; BC = Base Case; WS = Worst Scenario

Referência: January 2024. PLoS ONE 19(1):e0297048. DOI:10.1371/journal.pone.0297048