Onconews - The Lancet destaca subtratamento da depressão em pacientes de câncer

depress__o_na_medicina_chinesa_NET_OK.jpgO tratamento da depressão em pacientes de câncer ganhou destaque no periódico The Lancet, em sua edição de 28 de agosto, mostrando que apesar dos avanços substanciais na oncologia durante as últimas décadas, a atenção para os sintomas psicológicos da doença e seu tratamento têm ficado em segundo plano.


A discussão é oportuna, uma vez que o risco de depressão tem se mostrado de duas a três vezes mais elevado em pacientes com câncer do que na população em geral, contribuindo para pior qualidade de vida e aumento do risco de suicídio.

Os estudos de Michael Sharpe e colegas e Jane Walker e colegas mostraram uma abordagem rigorosa para a implementação e avaliação de uma intervenção complexa para aliviar a depressão em pessoas com câncer.

A grande maioria dos pacientes com câncer, clinicamente deprimidos, não recebe tratamento para depressão. É o que mostram os resultados de um estudo retrospectivo com 21 mil pacientes com câncer realizado pela Universidade de Oxford, na Inglaterra. O trabalho também aponta que a prevalência da depressão é maior em alguns subgrupos específicos, especialmente em pacientes com câncer de pulmão.

"A depressão é inadequadamente controlada no paciente oncológico, apesar de seus efeitos adversos sobre a qualidade de vida e a adesão ao tratamento”, resumiu Jane Walter, co-autora do estudo publicado dia 28 de agosto na edição online do Lancet Psychiatry.

Walker e colegas analisaram dados clínicos de 21.151 pacientes atendidos em três centros de câncer no Reino Unido. A investigação baseou-se em uma entrevista estruturada; na escala de ansiedade e depressão SCL-20 e em uma entrevista clínica para avaliar os critérios da DSM-IV, o manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais.

Descobertas


A análise final concluiu que a prevalência maior da depressão foi observada em pacientes com câncer de pulmão (13,1%, IC 95%), seguido pelo câncer ginecológico (10, 9%), câncer de mama (9,3%), câncer colorretal (7,0%) e câncer genitourinário (5,6%,). O diagnóstico de depressão mais severa foi mais frequente em pacientes mais jovens e com piores scores de privação social, assim como foi mais prevalente entre as mulheres. Um total de 1.130 (73%) de 1.538 pacientes com depressão e dados completos de tratamento não receberam nenhum tipo de tratamento potencialmente eficaz para a depressão. "Esse é talvez o achado mais importante, a constatação de que pacientes atendidos em nossos serviços especializados de câncer não recebem intervenções para o tratamento da depressão”, explicou a pesquisadora.

Em duas outras publicações, os autores apresentaram os resultados de estudos randomizados que evidenciam a associação entre depressão e o agravamento de vários efeitos adversos do câncer, incluindo ansiedade, dor e fadiga (The Lancet; The Lancet Oncology).

O maior dos dois estudos foi denominado SMaRT Oncology 2 e envolveu 500 pacientes com vários tipos de câncer e prognóstico pobre. Os pacientes foram randomizados para tratamento da depressão ou cuidados habituais, sempre de forma integrada ao tratamento oncológico. O cuidado com a depressão foi realizado no contexto de um programa multidisciplinar, com a participação de enfermeiros, oncologistas, psiquiatras e médicos de outras especialidades envolvidos no tratamento primário. O programa incluiu medicação e terapia comportamental/psicossocial. Como desfecho primário, o estudo considerou a redução mínima de 50% na gravidade da depressão em 24 semanas, conforme critério que considera uma escala de 20 itens (Symptom Checklist 20 itens Depression Scale - SCL-20).

Os resultados mostraram que 63% dos doentes do grupo tratado para depressão preencheram os critérios de resposta, em comparação com 17% dos pacientes do grupo de cuidados habituais. Além disso, os pacientes randomizados para a intervenção da depressão tivera menos ansiedade, dor e fadiga, assim como uma melhor percepção de qualidade de vida e saúde durante as 24 semanas do estudo (p <0,05).

"Esta eficácia impressionante verificada no grupo tratado para a depressão mostra a importância de implementar programas sistemáticos e integrados ao tratamento oncológico", declarou Michael Sharpe, investigador de Oxford também envolvido nas pesquisas.

O mesmo grupo de pesquisadores ainda realizou o estudo SMaRT Oncology 3 para examinar o efeito de um programa integrado para tratamento da depressão em 142 pacientes com câncer de pulmão. Neste ensaio, os pacientes também foram aleatoriamente designados para receber a intervenção multidisciplinar para a depressão ou cuidados habituais, além do tratamento oncológico. O desfecho primário foi a mudança na SCL-20 (intervalo de 0-4), desde o início até o final da participação no estudo ou em até 32 semanas.

Os resultados mostraram que o grupo de intervenção alcançou uma pontuação significativamente menor na escala SCL-20 (1,24 contra 1,61; IC 95%). A análise final aponta melhora nos critérios de auto-avaliação de depressão, ansiedade, qualidade de vida e percepção de qualidade do atendimento. "Nossos resultados sugerem que é possível tratar eficazmente a depressão em um grupo de pacientes com mau prognóstico", concluem Walker e colegas no artigo publicado no Lancet Oncology.

Custo-Benefício


A intervenção também foi eficaz em termos de custos, comentou Walter F. Baile, do MD Anderson Cancer Center, em Houston. O custo médio de £ 613 necessário para a gestão da depressão equivale a menos de US $ 1.000, comparou o especialista, que não está envolvido no estudo, mas defende a proposta. “Diante do baixo custo e do resultado terapêutico muito positivo, as companhias de seguro-saúde devem pagar pela gestão da depressão no paciente de câncer”, acredita Baile.
Os três estudos foram apoiados pelo Cancer Research UK e pelo governo escocês.

Referências:
Walter J et al. "Prevalence, associations, and adequacy of treatment of major depression in patients with cancer: A cross-sectional analysis of routinely collected clinical data" Lancet Psychiatr 2014; DOI:10.1016/S2215-0366(14)70313-X.
Sharpe M et al. "Integrated collaborative care for comorbid majort depression in patients with cancer (SMaRT Oncology-2): A multicenter randomized controlled effectiveness trial" Lancet 2014; DOI:10.1016/S0140-6736(14)61231-9.
Walker J et al. "Integrated collaboative care for major depression comorbid with a poor-prognosis cancer (SMaRT Oncology-3): A multicenter randomized controlled trial in patients with lung cancer" Lancet Oncol 2014; DOI: 10.1016/S1470-2045(14)70343-2.