Apesar do guideline da ASCO1 não recomendar redução de dose de quimioterapia baseado na superfície corpórea, os resultados de uma análise prospectiva do estudo GAIN, randomizado, fase III, publicados no Annals of Oncology2, sugerem que pacientes obesos que receberam quimioterapia em doses densas de acordo com a sua área de superfície corporal têm um maior risco de desenvolver toxicidades graves.
O trabalho mostrou ainda que a intensidade da dose da quimioterapia não influencia a sobrevida desses pacientes.
Na rotina clínica, as doses de quimioterapia são frequentemente limitadas à área de superfície corporal (ASC) de 2,0 m2 ou ajustadas para um peso ideal para pacientes obesos devido a razões de segurança.
Segundo o oncologista Antonio Carlos Buzaid, chefe-geral do Centro Oncológico Antônio Ermírio de Moraes (COAEM) e membro do comitê gestor do Centro de Oncologia e Hematologia Dayan-Daycoval, do Hospital Israelita Albert Einstein, este estudo é uma exceção quando comparado com a maioria dos estudos. “Além disso, como o esquema de QT usado no estudo GAIN seria pouco usado hoje, há pouca implicação prática desta publicação”.
Métodos e resultados
Entre agosto de 2004 e julho de 2008, um total de 3023 pacientes foram incluídos no estudo GAIN, um ensaio randomizado de fase III que comparou dois tipos de regime de quimioterapia adjuvante com dose-densa: epirrubicina, docetaxel e ciclofosfamida (iddETC) versus epirrubicina e ciclofosfamida (CE) seguido de docetaxel (T) mais capecitabina (X). Foram considerados retrospectivamente um total de 555 pacientes (18%) com um IMC de ≥30 (obesos) para avaliar segurança e resultados. Desses pacientes, 31% receberam quimioterapia de acordo com uma ASC não ajustada. Para os pacientes restantes, ASC foi ajustada para o peso ideal ou limitada a 2,0 m2.
Um total de 15% dos pacientes obesos que receberam dose completa de quimioterapia não ajustada versus 6% dos pacientes obesos com ASC ajustada experimentaram neutropenia febril (p=0,003) e 9% versus 3% tiveram trombopenia de alto grau (p=0,002).
No geral, 17% versus 10% tiveram um evento tromboembólico (p=0,017), que foi de grau elevado em 13% versus 6%, respectivamente (p=0,019), e 3% versus 0,3% apresentaram fogachos de alto grau (p=0,013).
Tonturas (5% versus 11%; p=0,016), diarreia (19% versus 27%, p=0,033) e um aumento da creatinina no soro (7% versus 14%; p=0,019) foram maiores no grupo que teve a dose ajustada. No entanto, não foram observadas diferenças na sobrevida livre de doença (SLD) e sobrevida global (SG) entre pacientes não-obesos e obesos que receberam a dose completa de quimioterapia ou de acordo com ASC ajustada.
Os autores concluíram que os pacientes obesos que recebem quimioterapia em doses densas de acordo com a real ASC têm maior risco de desenvolver toxicidades graves sem, no entanto, influenciar a sobrevida. Um ajuste da intensidade da dose da quimioterapia deve ser realizado para evitar complicações com risco de vida.
Referências: 1 - Appropriate chemotherapy dosing for obese adult patients with cancer: American Society of Clinical Oncology Clinical Practice Guideline - Griggs JJ, Mangu PB, Anderson H, et al. - J Clin Oncol 2012; 30(13):1553-61).
2 - Higher rate of severe toxicities in obese patients receiving dose-dense (dd) chemotherapy according toun adjusted body surface area: results of the prospectively randomized GAIN study - Ann Oncol (2016)doi: 10.1093/annonc/mdw315First published online: August 8, 2016