O estudo European Stop Kinase Inhibitors (EURO-SKI) é o maior ensaio clínico para investigar a cessação dos inibidores da tirosina quinase (TKIs) em pacientes com leucemia mieloide crônica em remissão molecular estável. A análise final após 3 anos de acompanhamento demonstra que os principais endpoints foram alcançados, com sobrevida livre de recorrência molecular de 61% aos 6 meses e de 46% aos 36 meses, com taxa de sobrevida global de 98% em 3 anos. O hematologista Nelson Hamerschlak (foto), coordenador de Hematologia e Transplante de Medula do Hospital Israelita Albert Einstein, analisa os principais achados.
A leucemia mieloide crônica (LMC) serve como modelo para terapia-alvo no câncer, particularmente através do desenvolvimento de inibidores de tirosina quinase (TKIs) direcionados ao gene de fusão BCR:ABL1, uma marca molecular da LMC. Os TKIs melhoraram significativamente o prognóstico e a qualidade de vida para pacientes com LMC. Agora, alcançar a remissão sem tratamento tornou-se uma nova meta no manejo da doença. Estudos mostram que 40%-55% dos pacientes com resposta muito boa podem descontinuar com sucesso o tratamento com TKI após alcançar remissão molecular profunda (DMR).
Neste estudo (NCT01596114) foram elegíveis pacientes adultos com LMC em fase crônica em tratamento com TKI por pelo menos 3 anos com DMR confirmada (transcrições BCR:ABL1 ≤0,01% na Escala Internacional [IS] por ≥12 meses). O endpoint primário foi a manutenção da resposta molecular principal (MMR, BCR:ABL1 [IS] ≤0,1%) aos 6 e 36 meses após a interrupção do TKI (sobrevida livre de recorrência molecular [MRecFS]).
Entre 728 pacientes, 434 pacientes (61%; IC 95%, 57 a 64) permaneceram em resposta molecular maior (MMR) aos 6 meses e 309 pacientes de 678 (46%; IC 95%, 42 a 49) aos 36 meses. Os resultados foram relatados por Mahon et al. e mostram que o tipo de transcrito BCR:ABL1 foi identificado como fator prognóstico. Para perdas tardias de MMR após 6 meses, a duração do tratamento com TKI, a percentagem de blastos no sangue periférico e a contagem de plaquetas no momento do diagnóstico também foram fatores significativos.
Em síntese, a análise final confirma que a duração do tratamento, os blastos, a contagem de plaquetas no momento do diagnóstico e o tipo de transcrição devem ser considerados fatores importantes para prever a remissão sem tratamento.
A análise final do estudo EURO-SKI após 3 anos de acompanhamento demonstra que os principais endpoints foram alcançados, com MRecFS de 61% aos 6 meses (IC 95%, 57 a 64; P < 0,0001) e de 46% aos 36 meses (IC 95%, 42 a 49; P < 0,0001), significativamente acima dos pontos de corte pré-especificados, com taxa de sobrevida global em 3 anos de 98% (IC de 95%, 97 a 99).
Cura funcional ou cura definitiva?
Por Nelson Hamerschlak, Coordenador de Hematologia e Transplante de Medula do Hospital Israelita Albert Einstein
Após seguimento de pacientes com LMC em uso de inibidores de tirosinoquinase (TKIs) seguidos por vários anos a partir do estudo ÍRIS, o eminente hematologista Hagop Jantarjian cunhou o termo cura funcional aos pacientes com boa resposta molecular a este medicamento de "cura funcional". Ele queria dizer curado enquanto utilizar a medicação.
De 5 anos para cá, vários estudos têm mostrado que cerca de 50% dos pacientes com resposta molecular igual ou maior que 4 logs respondem por mais de 4 anos. Mais ainda, mostram que aqueles que perderam resposta, voltaram a responder.
O estudo EURO-SKI é o que contém o maior número de pacientes (728), 46% com manutenção a longo prazo. Este estudo foi também capaz de identificar fatores de risco para perda de resposta, como duração de tratamento, blastos e contagens de plaquetas ao diagnóstico e tipo de transcrição.
No nosso serviço, temos estimulado principalmente os pacientes com efeitos adversos a interromper o uso de TKIs nas seguintes condições:
- LMC em primeira fase crônica
- Paciente motivado, com boa comunicação
- Acesso a PCR de alta qualidade e com resultados rápidos
- Paciente concordando com consultas mais frequentes: mensal nos primeiros 6 meses, a cada 2 meses por 6-12 meses e, posteriormente, a cada 3 meses
- Tratamento de 1ª linha, ou 2ª linha se o motivo da mudança foi intolerância
- Transcrito típico do BCR-ABL1
- Duração de terapia com ITK > 5 anos (>4 anos se ITK de 2ª geração)
- Duração de DMR (MR4 ou melhor) > 2 anos
- Sem falha de tratamento prévia
Referência: Francois-Xavier Mahon et al., European Stop Tyrosine Kinase Inhibitor Trial (EURO-SKI) in Chronic Myeloid Leukemia: Final Analysis and Novel Prognostic Factors for Treatment-Free Remission. JCO 0, JCO.23.01647. DOI:10.1200/JCO.23.01647