Onconews - ICESP publica recomendações para a pesquisa clínica durante a COVID-19

roberto arai bx 2020Roberto J. Arai (foto), gerente do núcleo de pesquisa clínica do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo, é primeiro autor de artigo que apresenta a experiência institucional do ICESP para manter a atividade de pesquisa clínica no contexto da COVID-19, assegurando a continuidade dos ensaios e a segurança dos pacientes participantes. O artigo foi publicado 13 de agosto na Contemporary Clinical Trials Communications (CCTC), da Elsevier.

A agência norte-americana Food and Drug Administration (FDA) anunciou em março as primeiras orientações para patrocinadores e pesquisadores, com o objetivo de adaptar as atividades de pesquisa aos desafios impostos pela pandemia.  “A FDA reconhece que a pandemia de COVID-19 pode afetar a condução de ensaios clínicos de produtos médicos. Podem surgir desafios, como quarentenas, fechamentos de sites, limitações de viagens, interrupções na cadeia de suprimentos do produto sob investigação ou outro, considerações até sobre a possibilidade de pesquisadores e participantes do estudo ficarem infectados”, justificou.

O alerta da FDA somou-se ao de outras autoridades regulatórias e despertou reações globais. No ICESP, a resposta teve o objetivo principal de  garantir a disponibilidade e logística de tratamento, como descrevem Arai et al., com um conjunto de recomendações que tem permitido manter a integridade dos protocolos, em conformidade com boas práticas de pesquisa clínica.

A recomendação do ICESP enfatiza a necessidade de manter o participante bem informado e seguro, especialmente no contexto da pandemia. “Evidências fragmentadas e conflitantes sobre o fato de o tratamento do câncer aumentar ou não a mortalidade por COVID–19 levam os pacientes a uma grande vulnerabilidade no gerenciamento do estresse, diante do alto nível de incerteza”, descrevem  os autores. “Uma abordagem personalizada é sempre crucial para compartilhar decisões sobre os potenciais riscos e benefícios de participar de ensaios clínicos e durante a COVID-19 esta abordagem deve ser reforçada”, propõem.

Arai et al. também destacam a importância de reduzir o risco de exposição à COVID-19, inclusive através de uma agenda racional de consultas, exames e procedimentos para limitar o número de visitas do paciente ao hospital. “Em nossa instituição, interrompemos o recrutamento de todos os protocolos por oito semanas, e 107 dias após a 1ª morte, ocorrida em 18 de março, não foram registradas desistências ou  descontinuidade devido a COVID – 19”, reportam os autores.

Outro tópico destacado na experiência do ICESP foi a atenção à validade dos dados e a coleta de amostras. Abordagens de monitoramento remoto baseado em risco devem ser estimuladas, assim como adaptações na própria infraestrutura durante as visitas de monitoramento presenciais (veja quadro).

Finalmente, Arai et al. propõem melhorar a comunicação entre investigador principal, patrocinador e o sistema CEP/CONEP. “Graças a esse conjunto de recomendações,  os participantes continuam a receber tratamento experimental e os protocolos estão em andamento, cumprindo os endpoints primários”.

Confira as principais recomendações propostas pelo ICESP e implementadas na instituição para assegurar as atividades de pesquisa clínica durante a COVID-19.


ADAPTAÇÔES AOS ENSAIOS CLÍNICOS EM ONCOLOGIA

Garantia de disponibilidade do tratamento e logística

Procure adiar a ativação de sites que ainda não foram iniciados, até normalização logística.

Faça um planejamento de 4 a 6 meses para o fornecimento de medicamentos aos pacientes incluídos.

Considere a entrega de medicamentos em casa, especialmente medicamentos orais.

Mantenha o participante bem informado e seguro

Informe os participantes de todas as mudanças e adaptações do estudo imediatamente.

Confirme a disponibilidade de infraestrutura de apoio à pesquisa clínica e fornecimento relacionado.

Considere a interrupção da inscrição temporariamente se houver suporte de segurança sem requisitos mínimos ou potenciais riscos.

Reduza o risco de exposição à COVID - 19

Limite as visitas pessoais a verificações de segurança e avaliações de endpoints primários

e use a telemedicina para procedimentos não complexos, como exames laboratoriais.

Agrupe todos os exames de laboratório, imagens e infusões de drogas no mesmo dia de visitas médicas para reduzir o número total de visitas ao hospital.

Use o telefone e plataformas online para videoconferências com os participantes

para responder a questionários.

Ofereça alternativas de transporte para evitar o transporte público de massa.

Mantenha a validade dos dados e a coleta de amostras

Procure expandir o uso de uma abordagem de monitoramento baseado em risco (RBM) e o monitoramento remoto tanto quanto possível

Atualize os Formulários de Relato de Caso (CRF) e consentimento informado para adicionar informações sobre a infecção por COVID - 19.

Considere a COVID - 19 como um potencial fator de confusão durante as análises de resultados.

Considere a manutenção de visitas de monitoramento presencial com protocolos de higiene para a manipulação de documentos e distanciamento social com barreiras físicas entre monitores e equipes. Adaptações na infraestrutura podem ser necessárias.

Casos confirmados de COVID- 19 devem ser testados até resultados negativos. Os testes devem ser reembolsados pelos patrocinadores. Interrupção da participação no ensaio clínico deve ser avaliada individualmente.

Considere os esforços adaptativos no manuseio de amostras biológicas de acordo com as diretrizes da OMS, assim como para o funcionamento dos biobancos

Melhore a comunicação do investigador principal, patrocinador e IRB (ou CEP/CONEP)

Manter e melhorar a comunicação com patrocinadores para adaptações de protocolo e priorização de procedimentos

Comunicar imediatamente o CEP/CONEP sobre quaisquer ajustes urgentes para fins de segurança

 

Referência: Managing risks of oncology clinical trials during COVID-19 pandemic. Arai 2020. DOI: 10.1016/j.conctc.2020.100637