Resultados de estudo brasileiro publicado na Oncotarget sugerem que o metabolismo do carbono-1 pode ser uma via central no carcinoma ductal invasivo (IDC) e até mesmo em tumores de mama em geral, representando um potencial alvo para seu tratamento e prevenção. Jéssica Reis Santos (foto), nutricionista especialista em oncologia e mestre em ciências pelo Departamento de Gastroenterologia da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), é a primeira autora do trabalho.
O metabolismo celular alterado é uma característica do câncer fundamental para o seu desenvolvimento. Particularmente, a ativação do metabolismo do carbono-1 nas células tumorais pode sustentar a oncogênese enquanto contribui para alterações epigenéticas e para a adaptação metabólica durante a progressão do tumor.
No estudo, os pesquisadores avaliaram se o aumento da atividade do metabolismo do carbono-1 é uma característica metabólica do carcinoma ductal invasivo (IDC, da sigla em inglês). As diferenças no perfil metabólico entre biópsias do IDC (n = 47) e seu tecido adjacente (n = 43) e entre biópsias de diferentes subtipos de câncer de mama foram avaliadas por multiplataformas metabolômicas. Para avaliar se o aumento na ativação do metabolismo do carbono-1 poderia ser uma característica geral de IDC e se esta alteração poderia ocorrer em resposta a alterações gênicas, os autores realizaram uma análise de bioinformática comparando o perfil de expressão gênica de amostra de tecido tumoral e adjacente de uma coorte independente, utilizando o Cancer Genome Atlas (TCGA).
As análises metabolômicas mostraram que IDC metabolizam nutrientes de maneira diferente do tecido normal adjacente, e para que isso ocorra de maneira eficiente o IDC aumenta a ativação do metabolismo do carbono-1, independente do subtipo de câncer de mama. Além disso, as análises gênicas confirmaram os achados metabolômicos sugerindo que o metabolismo do carbono-1 pode ser uma via central no IDC e até mesmo em tumores de mama em geral, representando um potencial alvo para o tratamento e prevenção do câncer. “Apesar do IDC apresentar altas taxas metabólicas, o microambiente tumoral é altamente controlado, onde cada produto final do metabolismo que pode ser prejudicial para seu desenvolvimento, como por exemplo o aumento na produção de espécies reativas de oxigênio (EROs) e/ou lactato, que é neutralizado. O IDC parece ter controle do que é bom ou ruim para seu desenvolvimento, graças à ativação do metabolismo do carbono-1”, destacam os autores.
Jéssica explica que o metabolismo do carbono-1 funciona como um sensor que integra a necessidade metabólica do IDC com a disponibilidade de nutrientes. Essa via metabólica parece ser capaz de reorganizar o metabolismo de acordo com a demanda celular, participando de maneira significativa para a plasticidade celular. “Por exemplo, momentos em que a produção de EROs aumenta de maneira deletéria para o IDC, a ativação do metabolismo do carbono-1 colabora para reorganização do metabolismo afim de priorizar a utilização de nutrientes necessários para a formação de antioxidantes, como a glutationa”, diz.
Ela acrescenta que considerando que o metabolismo do carbono-1 é uma via dependente da disponibilidade de nutrientes, o próximo passo do estudo será investigar a influência da obesidade e da prática de exercícios físicos sobre a disponibilidade de nutrientes e ativação do metabolismo do carbono-1 em pacientes com câncer de mama. “A obesidade pode estar envolvida na maior disponibilidade de nutrientes para o IDC e ativação do metabolismo do carbono-1, enquanto a prática de exercícios físicos pode exercer efeitos contrários. Porém essa hipótese ainda precisa ser melhor explorada”, explica. “Devido à complexidade metabólica do IDC é fácil compreender porque um nutriente não deve ser considerado pró ou antitumoral. O cuidado do paciente oncológico deve ser integral e mudanças no estilo de vida devem ser encorajadas”, conclui.
O estudo conta com a coordenação da nutricionista Graziela Ravacci, pesquisadora da FMUSP e diretora científica da IonNutri; Dan Waitzberg, professor associado da FMUSP e diretor científico da Bioma4me, é o autor sênior.
Referência: Distinct pattern of one-carbon metabolism, a nutrient-sensitive pathway, in invasive breast cancer: A metabolomic study - Jéssica Reis Santos et al - Oncotarget. 2020; 11:1637-1652. https://doi.org/10.18632/oncotarget.27575