Onconews - NEJM reporta novos dados sobre câncer de mama e variantes patogênicas

emilia pinto bxDois estudos publicados em janeiro na New England Journal of Medicine fornecem novos dados para compreender a associação entre variantes patogênicas em uma série de genes de suscetibilidade ao câncer e risco de câncer de mama. “Esses dois estudos utilizando um painel de genes de predisposição ao câncer definem os genes cujas variantes patogênicas estão fortemente associadas ao câncer de mama e poderiam ser oferecidos como teste genético para a população em geral”, esclarece a bióloga Emilia Modolo Pinto (foto), pesquisadora do St. Jude Children's Research Hospital.

Em um estudo caso-controle de base populacional americana, Hu e colaboradores realizaram o sequenciamento utilizando painel multigênico customizado que inclui 28 genes de predisposiçã ao câncer para identificar variantes patogênicas na linhagem germinativa de 32.247 mulheres com câncer de mama (pacientes) e 32.544 mulheres não afetadas (controles). A pesquisa é realizada pela Massachusetts Medical Society, a partir do consórcio norte-americano Cancer Risk Estimates Related to Susceptibility (CARRIERS).

Os resultados de Hu e colaboradores indicam que variantes patogênicas em 12 genes associados ao câncer de mama foram detectadas em 5,03% dos pacientes e em 1,63% dos controles. Variantes patogênicas em BRCA1 e BRCA2 foram associadas a um risco de câncer de mama elevado, com chance calculada de 7,62 (intervalo de confiança de 95% [IC], 5,33 a 11,27) e 5,23 (IC 95%, 4,09 a 6,77), respectivamente, enquanto variantes patogênicas em PALB2 foram associadas a risco moderado (odds ratio, 3,83; IC 95%, 2,68 a 5,63). Variantes patogênicas em BARD1, RAD51C e RAD51D foram associadas a risco aumentado para câncer de mama dos subtipos negativo para receptor de estrogênio e triplo-negativo, enquanto variantes patogênicas em ATM, CDH1 e CHEK2 foram associadas a um risco aumentado de câncer de mama para o subtipo positivo para receptor de estrogênio. Os autores descrevem que variantes patogênicas em outros 16 genes de predisposição ao câncer, incluindo a variante patogênica fundadora c.657_661del5 em NBN, não foram associadas a um risco de câncer de mama elevado.

Outra análise vem do Breast Cancer Association Consortium, em estudo de Dorling e colaboradores envolvendo um painel de 34 genes sequenciados em linhagem germinativa de 113 mil mulheres (60.466 com cancer de mama) de países da Europa, Ásia, América do Norte e América do Sul, representando 25 países. “Os resultados deste estudo definem os genes clinicamente mais úteis para inclusão em painéis para prever o risco de câncer de mama e, assim, orientar o aconselhamento genético”.

A análise de Dorling e colegas baseada no consórcio europeu identificou que variantes patogênicas em 5 genes (ATM, BRCA1, BRCA2, CHEK2 e PALB2) foram fortemente associadas a um risco de câncer de mama em geral com valor de P inferior a 0,0001. Em 4 outros genes (BARD1, RAD51C, RAD51D e TP53) as variantes patogênicas foram associadas a um risco de câncer de mama com valor de P inferior a 0,05 e a probabilidade de descoberta falsa Bayesiana de menos de 0,05. Em 19 dos 25 genes restantes, o limite superior do intervalo de confiança de 95% da razão de risco para câncer de mama foi inferior a 2,0.

Para variantes patogênicas em ATM e CHEK2, os odds ratios foram maiores para o subtipo positivo para receptor de estrogênio (ER). Inversamente, os pesquisadores do Breast Cancer Association Consortium identificaram que para variantes truncadas das proteínas em BARD1, BRCA1, BRCA2, PALB2, RAD51C e RAD51D, os odds ratios foram maiores para câncer de mama do subtipo ER-negativo. Os resultados de Dorling e colaboradores também revelam que variantes missense raras (em agregado) em ATM, CHEK2 e TP53 foram associadas a um risco de câncer de mama com valor de P inferior a 0,001. “Para BRCA1, BRCA2 e TP53, as variantes missense (no agregado) que seriam classificadas como patogênicas de acordo com os critérios padrão foram positivamente associadas ao risco de câncer de mama e o risco foi semelhante ao de variantes que levam à perda de função da proteína.

Emilia observa que nos dois estudos não apenas foram analisadas as variantes tipo missense, como também variantes que codificam proteína com perda de função. “O segundo estudo tambem incluiu variantes raras. Apesar da diferença de genes testados (28 x 34), número de participantes (64,000 x 130,000) e a diversidade de ancestralidade, os resultados desses estudos têm suas similaridades e limitações. Variantes patogênicas em BRCA1 e BRCA2 foram consideradas de alto risco nos dois trabalhos, e variantes patogênicas em ATM e CHEK2 associadas ao câncer de mama receptor de estrógeno positivo, entre outros achados”, esclarece. “Entre as limitações estão a idade de inclusão em alguns estudos, ou a inclusão de vários indivíduos com câncer de mama pertencentes à mesma família, além de ausência de dados para alguns marcadores, tipo HER2”, acrescenta.

Segundo Emilia, vale destacar que nos dois estudos o risco de câncer de mama para portadores de variantes patogênicas em TP53 foi dificultado pela possibilidade técnica de não se discriminar variantes somáticas presentes no sangue, mecanismo conhecido como hematopoiese clonal. “Podemos antecipar que um estudo que inclua um número importante de participantes divididos por idade, subtipo tumoral e marcadores tumorais seria interessante de ser conduzido no Brasil, particularmente no contexto da variante R337H do gene TP53 em um haplotipo fundador não descrito em nenhuma outra população”, conclui. 

Referências:

Hu C, Hart SN, Gnanaolivu R, et al. A population-based study of genes previously implicated in breast cancer. New Eng. J. Med. 2021 doi:10.1056/NEJMoa2005936

Dorling L et al. Breast Cancer Risk Genes — Association Analysis in More than 113,000 Women. New Eng. J. Med. 2021 doi:10.1056/NEJMoa1913948