Onconews - Obesidade e microbioma vaginal pós-cirurgia bariátrica

dan waitzberg 21A obesidade e a disbiose do microbioma vaginal (DMV) são fatores de risco para resultados adversos de saúde reprodutiva e oncológica em mulheres. “Aqui, investigamos a relação entre obesidade, composição bacteriana vaginal, inflamação local e cirurgia bariátrica”, descreve estudo reportado no Microbiome Journal que tem como pesquisadora sênior a médica Maria Kyrgiou, do Imperial College London. Dan Waitzberg, professor associado do departamento de gastroenterologia da FMUSP e diretor científico da Bioma4me, analisa os principais achados.

O estudo comparou a composição bacteriana vaginal avaliada por sequenciamento de genes 16S rRNA bacterianos e os níveis de citocinas locais medidos por triagem magnética (Luminex multiplexado) entre 67 mulheres obesas e 42 mulheres não obesas. A avaliação considerou ainda as mudanças temporais na microbiota e nas citocinas em um subgrupo de 27 mulheres submetidas à cirurgia bariátrica.

Resultados

O componente bacteriano da microbiota vaginal em mulheres obesas foi caracterizado por uma prevalência mais baixa de um Lactobacillus dominante e pela maior prevalência de alta diversidade no microbioma vaginal (Lactobacillus spp. e Gardnerella-spp.) em comparação com indivíduos não obesos (p <0,001).

Mulheres obesas apresentaram maior abundância relativa das espécies Dialister (p <0,001), Anaerococcus vaginalis (p = 0,021) e Prevotella timonensis (p = 0,020) e diminuição da abundância relativa de Lactobacillus crispatus (p = 0,014). Os níveis vaginais locais de IL-1β, IL-4, IL-6, IL-8, IFNγ, MIP-1α e TNFα foram todos maiores entre mulheres obesas, no entanto, apenas IL-1β e IL-8 se correlacionaram com a diversidade de espécies de microbioma vaginal. Em um subgrupo de mulheres obesas submetidas à cirurgia bariátrica, não houve diferenças gerais significativas no microbioma vaginal após a cirurgia; no entanto, 75% dessas mulheres permaneceram obesas em 6 meses. Antes da cirurgia, não havia relação entre o índice de massa corporal (IMC) e a estrutura do microbioma vaginal; no entanto, as mulheres que no pós-operatório apresentavam microbioma vaginal dominante de Lactobacillus tinham um IMC significativamente mais baixo do que aquelas com microbioma vaginal com alta diversidade.

“Mulheres obesas têm uma composição de microbiota vaginal significativamente diferente, com níveis aumentados de inflamação local em comparação com mulheres não obesas. A cirurgia bariátrica não altera o microbioma vaginal; no entanto, aquelas com maior perda de peso 6 meses após a cirurgia são mais propensas a ter um microbioma vaginal dominante de Lactobacillus”, concluem os autores.

“Em mulheres após cirurgia bariátrica a microbiota vaginal não se alterou significativamente. No entanto, aquelas que obtiveram maior perda de peso apresentaram maiores taxas de lactobacilos”, observa Dan Waitzberg. Ele lembra que, diferentemente da microbiota intestinal, a microbiota vaginal saudável, em normobiose, tem baixa diversidade bacteriana, com predomínio de lactobacilos produtores de ácido lático, que, com outros fatores, mantém baixo o Ph vaginal e impede a proliferação de outras espécies bacterianas.

“Aparentemente, a obesidade e seus componentes inflamatórios têm efeito sobre a microbiota vaginal que se apresenta com disbiose. Esta disbiose pode favorecer vaginites, infecções urinárias e mesmo vaginites de repetição por distintos microrganismos. As vias pelas quais microrganismos anômalos colonizam a vagina de mulheres obesas incluem contaminação anorretal,  mas, os mecanismos ainda precisam ser melhor identificados”, explica Dan.

O especialista brasileiro destaca que justamente as mulheres que perderam maior peso após a cirurgia bariátrica, foram as que conseguiram recuperar o padrão mais adequado da microbiota vaginal, “o que poderia apontar para fatores inflamatórios e endócrinos associados ao excesso de peso e a disbiose vaginal”, analisa.

Referência: Raglan, O., MacIntyre, D.A., Mitra, A. et al. The association between obesity and weight loss after bariatric surgery on the vaginal microbiota. Microbiome 9, 124 (2021). https://doi.org/10.1186/s40168-021-01011-2