Os bisfosfonatos têm sido avaliados em câncer precoce de mama para investigar a sua capacidade de prevenir a perda óssea induzida pelo tratamento oncológico, reduzir o risco de recorrência e o risco de metástases. A partir de uma revisão sistemática da literatura, um painel de especialistas europeus definiu um documento de consenso, com recomendações para o uso adjuvante de bisfosfonatos nesse cenário da doença.
O painel recomendou que os bisfosfonatos devem ser considerados como parte da prática clínica rotineira para a prevenção de perda óssea induzida por quimioterapia em todos os pacientes com uma pontuação de T <-2.0 ou ≥2 fatores de risco clínicos para fratura.
A decisão do painel é baseada em diferentes evidências, incluindo meta-análise realizada pelo Early Breast Cancer Trials Collaborative Group (EBCTCG), que envolveu 18766 pacientes e 26 estudos randomizados.
“Sabemos que vários tratamentos oncológicos aumentam muito o risco de osteoporose, principalmente os inibidores de aromatase, que pioram muito a densidade mineral óssea. Na nossa prática, adotamos o uso de bisfosfonatos com ácido zoledrônico EV a cada seis meses e este estudo europeu reconhece esse benefício, tanto do ponto de vista ósseo como em termos de metástases”, diz Jacques Tabacoff, Coordenador de Oncologia Clínica do Centro de Oncologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz e membro do Centro Paulista de Oncologia (CPO), do Grupo Oncoclínicas.
Nos estudos avaliados pelo painel europeu, a maioria das pacientes recebeu clodronato (1600mg/dia, via oral) ou ácido zoledrônico (4 mg iv a cada 6 meses ou conforme o cronograma AZURE). Na análise da população com base na intenção de tratar, o uso de bisfosfonatos fez reduzir o número de pacientes com primeira recorrência distante no osso (RR = 0,83; IC 95% 0,73-0,94, 2P = 0,004), mas teve efeitos menos claros sobre o tempo para qualquer recorrência de câncer de mama (RR = 0,94; IC 95% 0,87-1,01, 2P = 0,08), recorrência à distância (RR = 0,92; IC 95% ,85-0,99, 2P = 0,03) ou mortalidade por câncer de mama (RR = 0,91; 95% CI 0,83-0,99, 2P = 0,04).
No entanto, em mulheres na pós-menopausa (n = 11.767), os bisfosfonatos não só reduziram o risco de recorrência no osso (RR = 0,72; IC 95% 0,60-0,86, 2P = 0,002), mas também a recorrência do câncer de mama em geral (RR = 0,86; 95% CI 0,78-0,94, 2P = 0,002) e a recorrência à distância em qualquer sítio (RR = 0,82; IC 95% 0,73-0,92, 2P = 0,003), além de impactar a mortalidade por câncer de mama (RR = 0,82; IC 95% 0,73-0,93, 2P = 0,002 ).
Assim, a recomendação do painel é considerar os bisfosfonatos como parte do tratamento adjuvante do câncer de mama nesta população, discutindo os potenciais benefícios e riscos individualmente com cada paciente.
“No Brasil, por não ser uma indicação aprovada "em bula", ainda sofremos restrições”, critica o oncologista Ricardo Caponero. “O tratamento é considerado experimental em nosso meio”, acrescenta.
Dados do INCA estimam 57.960 novos casos de câncer de mama em 2016, grande parte deles diagnosticados em fases avançadas da doença ou em estádios onde o uso de bisfosfonatos poderia ter impacto, pelo menos nas mulheres na pós-menopausa.
Apresentados no San Antonio Breast Cancer Symposium, em dezembro de 2015, os dados mostram que o mesmo benefício pode se estender ao denozumabe.
Referência: Adjuvant bisphosphonates in early breast cancer: consensus guidance for clinical practice from a European Panel - P. Hadji, R. E. Coleman, C. Wilson, T. J. Powles, P. Clézardin, M. Aapro,L. Costa, J.-J. Body, C. Markopoulos, D. Santini, I. Diel, A. Di Leo, D. Cameron, D. Dodwell, I. Smith, M. Gnant, R. Gray, N. Harbeck, B. Thurlimann, M. Untch, J. Cortes, M. Martin, U.-S. Albert, P.-F. Conte, B.Ejlertsen, J. Bergh, M. Kaufmann, and I. Holen - Ann Oncol (2015)doi: 10.1093/annonc/mdv617/First published online: December 17, 2015
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