A classificação do International Germ-Cell Cancer Collaborative Group (IGCCCG) foi um grande avanço no manejo de tumores de células germinativas, baseada em dados de 660 pacientes com seminoma tratados entre 1975 e 1990. “Nós reavaliamos essa classificação em um banco de dados de um grande consórcio internacional”, sustentam Beyer et al. em artigo no JCO, com resultados que propõem uma nova classificação somando lactato desidrogenase como fator prognóstico. O oncologista Flavio Mavignier Carcano (foto), docente do curso de Medicina e Diretor Acadêmico na Faculdade de Ciências da Saúde de Barretos Dr. Paulo Prata – FACISB, analisa o trabalho.
Foram coletados dados de 2.451 homens com seminoma metastático tratados com quimioterapia de primeira linha à base de cisplatina e etoposídeo entre 1990 e 2013, a partir de 30 instituições ou grupos colaborativos na Austrália, Europa e América do Norte. Os autores descrevem que dados de ensaio clínico e de registro também foram incluídos na análise. Os endpoints primários foram sobrevida livre de progressão (SLP) e sobrevida global (SG). As variáveis na apresentação inicial foram avaliadas por seu impacto prognóstico. Os resultados foram validados em um conjunto independente de 764 pacientes.
Resultados
Em comparação com a classificação IGCCCG inicial, nesta nova série a SLP em 5 anos melhorou de 82% para 89% e a SG em 5 anos de 86% para 95% em pacientes com bom prognóstico, variando de 67% a 79% e de 72% a 88% naqueles de prognóstico intermediário.
A lactato desidrogenase (LDH) provou ser um fator prognóstico adverso adicional. Pacientes com bom prognóstico com LDH acima de 2,5 × limite superior tiveram SLP em 3 anos de 80% (IC de 95%, 75 a 84) e SG em 3 anos de 92% (IC de 95%, 88 a 95) versus 92 % (IC de 95%, 90 a 94) e 97% (IC de 95%, 96 a 98) no grupo com menor LDH.
“A SLP e a SG em seminoma metastático melhoraram significativamente em nossa série moderna em comparação com os dados originais. A classificação IGCCCG original mantém sua relevância, mas pode ser posteriormente refinada pela adição de LDH a um ponto de corte de 2,5 × limite superior do normal como um fator prognóstico adverso adicional”, concluem.
Para os autores, a classificação IGCCCG mantém sua relevância para a prática clínica, mas os resultados da análise atual ajudam a aconselhar os pacientes com seminoma de forma mais precisa, agora tendo LDH como uma nova variável prognóstica adversa entre pacientes de bom prognóstico. Variáveis adicionais, como idade, localização do tumor primário extragonadal, níveis de gonadotrofina coriônica humana ou a presença de metástases pulmonares foram de menor relevância.
“Através deste estudo, Beyer et al. trouxeram uma maior evidência daquilo que na prática já era bem observado: o seminoma é talvez o câncer mais curável da prática oncológica, ainda que metastático. Com o aperfeiçoamento do cuidado, a aderência aos guidelines internacionais, e o tratamento em centros especializados, este estudo demonstrou uma sobrevida global que aponta para os 100%”, observa Carcano.
O especialista esclarece que pacientes com seminoma metastático e risco intermediário pelo IGCCG clássico recebem poliquimioterapia com 3 drogas, como PEB, por 4 ciclos. “Já aqueles de baixo risco habitualmente recebem 2 drogas, como EP por 4 ciclos, que é mais do que suficiente. O estudo aponta o LDH como fator de risco adicional para aqueles com baixo risco e isso poderá levar, na prática, à interpretação que devêssemos oferecer um tratamento mais intenso para estes pacientes”, avalia.
Segundo Carcano, ainda não é possível afirmar que os resultados podem ser melhorados para pacientes com alto LDH de baixo risco recebendo 4 ciclos de PEB, por exemplo. “Acredito que este dado deve conduzir o oncologista clínico a individualizar o tratamento. Alternativamente, pacientes de baixo risco podem receber PEB por apenas 3 ciclos ao invés de EP por 4 ciclos. Portanto, após este estudo, é interessante que pacientes com seminoma metastático de baixo risco pelo IGCCCG clássico com LDH > 2,5 vezes a normalidade possam iniciar seu tratamento com PEB. Caso tenham boa tolerância durante os 3 ciclos previstos, podem seguir ao quarto ciclo com o objetivo de um possível benefício, até que melhores evidências possam guiar o tratamento para esta subpopulação”, conclui.
Referência: Survival and New Prognosticators in Metastatic Seminoma: Results From the IGCCCG-Update Consortium – Beyer et al - DOI: 10.1200/JCO.20.03292 Journal of Clinical Oncology - Published online March 17, 2021