Onconews - Significância prognóstica e biológica de HER2-low no câncer de mama estágio inicial

filomena 21 bxO câncer de mama ERBB2-low (HER2-low) é um subtipo biológico e prognóstico distinto? Estudo1 realizado por pesquisadores do Dana-Farber Cancer Institute e publicado no JAMA Oncology sugere que não. O trabalho analisou dados de mais de 5 mil pacientes e mostrou que esses tumores “HER2-low” não eram diferentes em sua resposta ao tratamento e resultados de longo prazo dos tumores HER2-0, que não apresentam ou têm uma quantidade ínfima da proteína HER2. A patologista Filomena Carvalho (foto), Professora Associada e Livre-docente do Departamento de Patologia da Faculdade de Medicina da USP, analisa os resultados.

“Não está claro se o câncer de mama HER2-low deve ser considerado um subtipo biológico individual distinto do câncer de mama HER2-0. Nosso objetivo foi investigar se a baixa expressão de HER2 está associada a características clínico-patológicas e prognóstico distintos em pacientes com câncer de mama receptor hormonal (RH) positivo e triplo negativo (TNBC)”, afirmam os autores.

Este estudo de coorte utilizou um banco de dados institucional mantido prospectivamente em todos os pacientes consecutivos com câncer de mama submetidos a cirurgia entre janeiro de 2016 e março de 2021 no Dana-Farber Brigham Cancer Center. O estudo incluiu 5.235 pacientes com câncer de mama invasivo estágio I a III, HER2-negativo. Os tumores foram divididos em dois grupos: HER2-0 (escore IHQ 0) e HER2-low (escore IHQ 1+ ou 2+ sem amplificação com ensaio de hibridização in situ. Os dados foram analisados ​​entre setembro de 2021 e janeiro de 2022.

Os pacientes foram submetidos ao tratamento padrão de acordo com as diretrizes institucionais, e foi realizada a comparação das características clínico-patológicas e resultados da doença (taxa de resposta patológica completa [pCR], sobrevida livre de doença, sobrevida livre de doença à distância e sobrevida global) entre pacientes com câncer de mama HER2-low e HER2-0.

Resultados

Entre 5.235 pacientes com câncer de mama invasivo HER2-negativo, (5.191 [99,2%] eram mulheres; mediana de idade [intervalo] na cirurgia primária, 59,0 [21,0-95,0] anos). Do total, 2.917 pacientes (55,7%) e 2.318 pacientes (44,3%) tinham tumores HER2-low e HER2-0, respectivamente. HER2-low quando comparados a HER2-0 foram mais frequentemente RH+ (90,6% vs. 81,8%, p<0,001), tiveram maior número de homens (1,2% vs. 0,4%, p=0,001), menor taxa de alto grau histológico (23% vs. 30,3%, p<0,001) e menor número de tipo histológico lobular (11,3% vs. 14,6%, p<0,001).

A taxa de tumores HER2-low aumentou progressivamente com o aumento da expressão de receptor de estrogênio (RE), passando de 40,1% (296 de 739) dos tumores negativos para RE, para 46,3% (31 de 67) dos tumores RE-low (RE 1%-9%), 55,2% (37 de 67) dos tumores com RE 10%-49%, 57,8% (2047 de 3542) dos tumores com RE 50%-95%,  e 62,1% (499 de 803) tumores RE > 95% (p < .001).

Dos 675 pacientes  que receberam quimioterapia neoadjuvante, 320 (47,4%) tinham tumores HER2-low e 355 (52,6%) HER2-0. A taxa de pCR foi maior no grupo HER2-0 (26,8% vs. 16,6%, p=0,002). Entretanto, não houve diferenças em pCR quando analisada dentro dos diferentes subgrupos (RH+, RE-low, RH+ excluído RE-low, ou TN). O mesmo foi encontrado na análise exploratória de sobrevida nos diferentes grupos, ou seja, sem diferenças dentro de cada grupo ou fazendo-se os ajustes de acordo com as variáveis confundidoras.

Filomena observa que este trabalho nos mostra que muitas das diferenças que vem sendo observadas entre tumores HER2-low e HER2-0 são em parte dependentes do status hormonal. “De fato, HER2-low tem predomínio de carcinomas luminais quando analisados pelo PAM50, enquanto os HER2-0 apresentam maior número de tumores basais (Schettini et al.)2. Entretanto, não nos parece que considerar (ou não) HER2-low como um subtipo biológico distinto seja o ponto mais importante. Estes tumores tem uma característica que os distingue dos HER2-0, ou seja, a presença de proteína HER2 na membrana, capaz de entregar droga nos tumores que possuem tais células alvo”, avalia.

A patologista destaca que o estudo Destiny-Breast04 demonstrou claro benefício do trastuzumabe deruxtecana em carcinomas de mama HER2-low irressecável e/ou metastático, independente do status hormonal (Modi et al)3. “Seguramente, em breve, teremos resultados com tumores na neoadjuvância. A proteína neste cenário é um biomarcador para ação de drogas e não a definição de um diferente subtipo de tumor.  Importante, sim, é aprimorar o diagnóstico dos tumores que apresentam baixos níveis da proteína, uma deficiência citada em praticamente todos os estudos, inclusive neste de Tarantino et al. Para isto, patologistas devem passar a diferenciar os HER2-negativos quanto a baixa expressão de HER2 e, sobretudo, os cirurgiões devem se preocupar ainda mais com a qualidade da fixação dos espécimes mamário, pois os baixos níveis de expressão são extremamente sensíveis às condições pré-analíticas”, conclui.

Referências:

1 - Tarantino P, Jin Q, Tayob N, et al. Prognostic and Biologic Significance of ERBB2-Low Expression in Early-Stage Breast Cancer. JAMA Oncol. Published online June 23, 2022. doi:10.1001/jamaoncol.2022.2286

2 - Schettini F, Chic N, Brasó-Maristany F, Paré L, Pascual T, Conte B, et al. Clinical, pathological, and PAM50 gene expression features of HER2-low breast cancer. NPJ Breast Cancer. 2021;7(1):1.

3 - Modi S, Jacot W, Yamashita T, Sohn J, Vidal M, Tokunaga E, et al. Trastuzumab Deruxtecan in Previously Treated HER2-Low Advanced Breast Cancer. N Engl J Med. 2022;387(1):9-20.