A superexpressão das oncoproteínas E6 e E7 do papilomavírus humano (HPV) é necessária para a carcinogênese cervical induzida pelo HPV e, portanto, essas oncoproteínas são promissores biomarcadores para a detecção do câncer cervical. Estudo de Downham et al. avaliou as características técnicas e operacionais do teste OncoE6/E7 em mulheres HPV-positivas que vivem com e sem HIV em países de baixa e média renda, com achados que justificam a necessidade de refinar o teste de oncoproteínas antes de sua implementação nas abordagens de triagem e tratamento. Adeylson Guimarães Ribeiro, diretor adjunto de Informação e Epidemiologia da Fundação Oncocentro de São Paulo, comenta os resultados.
O câncer do colo do útero é uma doença evitável através da vacinação contra o HPV e do rastreio regular, mas continua a ser um grande problema de saúde pública. Mais de 350.000 mulheres morrem anualmente de câncer do colo do útero, cerca de 90% delas vivendo em países de baixa e média renda.
Neste estudo, os pesquisadores avaliaram as características técnicas e operacionais do teste cervical OncoE6/E7 do tipo 8-HPV em diferentes laboratórios, utilizando amostras cervicais de mulheres HPV-positivas que vivem com e sem HIV. O teste OncoE6/E7 foi realizado em 2.833 mulheres HIV negativas e em 241 mulheres com HIV que participaram de estudos multicêntricos na América Latina (estudo ESTAMPA) e na África (estudo CESTA).
Os pesquisadores descrevem que a positividade da oncoproteína foi avaliada em cada local de teste, de acordo com o status do HIV, assim como considerou a concordância específica com os resultados do HPV-DNA. Um questionário foi entregue aos operadores que realizaram o teste de oncoproteínas para avaliar sua impressão e aceitabilidade em relação ao teste.
Os resultados mostram que o teste OncoE6/E7 revelou alta heterogeneidade na taxa de positividade em todos os locais de teste (I2: 95,8%, p < 0,01), com positividade significativamente menor em mulheres que vivem com HIV em comparação com mulheres HIV negativas (12% vs 25%, p < 0,01). A análise mostra, ainda, que uma distribuição semelhante do tipo de HPV foi encontrada entre a genotipagem do DNA do HPV e o teste de oncoproteínas, exceto para o HPV31 e 33 (concordância moderada, k = 0,57).
Vinte e um técnicos de laboratório foram treinados em testes de oncoproteínas. Apesar das preocupações dos operadores sobre o procedimento demorado e a necessidade percebida de experiência laboratorial moderada, eles relataram que o teste OncoE6/E7 é fácil de executar e fácil de usar para implantação em ambientes com recursos limitados. No entanto, os pesquisadores recomendam cautela. “A alta variabilidade da taxa de positividade encontrada entre os estudos e a subjetividade na interpretação dos resultados do teste podem resultar em falso positivo/negativo das oncoproteínas e justificam a necessidade de refinar o teste de oncoproteínas antes de sua implementação nas abordagens de triagem e tratamento”, concluem os autores.
A íntegra do estudo está disponível em acesso aberto no Internal Journal of Cancer, periódico da União Internacional para o Controle do Câncer (UICC).
O estudo em contexto
Por Adeylson Guimarães Ribeiro, diretor adjunto de Informação e Epidemiologia da Fundação Oncocentro de São Paulo
O câncer do colo do útero é prevenível e altamente curável se for detectado precocemente. Recentemente, o Ministério da Saúde deu um passo importante na implementação de um diagnóstico mais rápido e preciso incorporando ao SUS a tecnologia de testagem molecular para detecção do vírus HPV no rastreamento deste câncer.
Este estudo propõe a utilização do teste HPV oncoproteínas E6/E7 como biomarcadores na detecção do câncer do colo do útero, dado que constituem o principal mecanismo pelo qual os HPVs oncogênicos levam ao desenvolvimento do tumor.
Apesar da padronização e treinamento efetuado para realização do teste entre diferentes laboratórios, foi identificada uma significante heterogeneidade das taxas de positividade entre os locais de análise, e entre os grupos de mulheres (HIV negativas e positivas).
O uso de biomarcadores nos programas de rastreamento é uma estratégia que otimiza a detecção de indivíduos com potencial de desenvolver um tumor, ou com este tumor na fase inicial assintomática, e devem ser estudados, uma vez que sua implementação reduz os custos em programas de prevenção e controle do câncer, sendo importantes principalmente em regiões com menor aporte financeiro. Entretanto, torna-se imprescindível que estes testes tenham uma alta sensibilidade e especificidade para detecção precoce, principalmente quando se refere ao câncer do colo do útero, que é altamente rastreável, tratável na sua fase inicial, podendo ser eliminado como um problema de saúde pública no Brasil e no Mundo.
Referência: Field experience with the 8-HPV-type oncoprotein test for cervical cancer screening among HPV-positive women living with and without HIV in LMICs. DOI: 10.1002/ijc.34953