Em mais um tópico da coluna ‘Drops de Genômica’, o oncologista André Murad (foto) aborda estudos que avaliam mutações do gene ERBB2 como novo alvo terapêutico em tumores sólidos. Confira.
Por André Murad*
ERBB2/HER2 há muito é reconhecido como um alvo oncogênico em alguns cânceres de mama e gastroesofágico, nos quais a amplificação desse gene confere sensibilidade ao tratamento com agentes direcionados ao ERBB2 como trastuzumabe, pertuzumabe, trastuzumabe entansina, lapatinibe, afatinibe e neratinibe. Mais recentemente, mutações somáticas em ERBB2 foram relatadas em 1–2% dos pacientes com adenocarcinoma de pulmão.
Série de casos anteriores sugeriram respostas clínicas tumorais usando pequenas moléculas anti-ERBB2, e também com terapias de anticorpos anti-HER2. Stephens e cols relataram pela primeira vez a presença de mutações no domínio quinase do gene ERBB2, que compartilha uma forte homologia com o gene EGFR, em adenocarcinomas de pulmão. Shigematsu e cols e Sasaki e cols. também relataram mutações semelhantes em seus pacientes com adenocarcinoma de pulmão.
Recentemente, Lee e cols. também descreveram uma mutação semelhante em um carcinoma de células escamosas do pulmão. As regiões dentro das quais ocorrerem as mutações do gene ERBB2, ou seja, exons 19 e 20, correspondem ao domínio quinase do gene EGFR (receptor do fator de crescimento epitelial). Há menos diversidade genética de mutações ERBB2 em comparação com mutações EGFR, pois 96% são inserções do exon 20, e 83% dessas são uma inserção recorrente de 12 pares de bases causando a duplicação dos aminoácidos YVMA no códon 775.
Em 2006, Cappuzzo e cols. relataram um caso de um paciente com uma mutação no exon 20 do ERBB2 (G776L), bem como uma mutação no exon 21 do EGFR (A859T) que respondeu ao trastuzumabe semanal e ao paclitaxel. Posteriormente, De Grève e cols. relataram que três pacientes com mutação do exon 20 ERBB2 responderam ao tratamento com o afatinibe. Assim, essas mutações podem potencialmente resultar na ativação da atividade da tirosina quinase da proteína ERBB2 e, como tal, podem desempenhar um papel importante na oncogênese de maneira semelhante às mutações do EGFR, se tornando assim um potencial alvo terapêutico.
Mais recentemente, o deruxtecano-trastuzumabe (T-DXd) mostrou sua eficácia no tratamento de pacientes com câncer de pulmão de células não pequenas metastático com mutação do gene ERBB2 no estudo DESTINY-Lung01. O T-DXd é um conjugado anticorpo-medicamento composto por um anticorpo anti-HER2, ligado a um quimioterápico inibidor da enzima topoisomerase I com atividade promissora em cânceres que apresentam mutações ou amplificações no gene ERBB2.
Egbert e cols. apresentaram os resultados do Destiny-Lung01 no congresso anual da Sociedade Americana de Oncologia (ASCO) deste ano. Trata-se dos dados da coorte de pacientes com câncer de pulmão de células não pequenas avançado com mutações de ERBB2, após um acompanhamento mediano de 8,0 meses. 42 pacientes com
mutações de ERBB2 foram tratados, a maioria (90,5%) já havia recebido quimioterapia prévia. A taxa de respostas foi de 61,9% e 16 pacientes dos 26 respondedores permaneceram em tratamento no momento da avaliação dos dados. A droga foi bem tolerada e se mostrou ativa nesse subgrupo de pacientes.
Por conta destes resultados, a droga recebeu um Breakthrough Therapy Designation pelo FDA norte-americano para esta indicação específica.
*André Murad é diretor científico do Grupo Brasileiro de Oncologia de Precisão (GBOP), diretor clínico da Personal - Oncologia de Precisão e Personalizada, professor adjunto coordenador da Disciplina de Oncologia da Faculdade de Medicina da UFMG, e oncologista e oncogeneticista da CETTRO Oncologia (DF)