Ensaio de Fase 2 que avaliou o regime de quimioterapia TPEx (docetaxel-platina-cetuximabe) em pacientes com carcinoma escamoso de cabeça e pescoço (HNSCC) recorrente ou metastático mostrou dados promissores, com sobrevida global mediana de 14,0 meses como primeira linha de tratamento. Agora, novo estudo publicado no Lancet Oncology comparou o regime TPEx com o esquema EXTREME (fluorouracil-platina-cetuximabe), com resultados que podem mudar a prática e reforçam o benefício de TPEx no tratamento de primeira linha do HNSCC recorrente ou metastático, como um regime com melhor perfil de segurança nessa população de pacientes.
Este ensaio multicêntrico, aberto, randomizado (GORTEC 2014-01 TPExtreme) contou com a participação de 68 centros na França, Espanha e Alemanha. Foram inscritos pacientes com carcinoma escamoso de cabeça e pescoço recorrente ou metastático confirmado histologicamente, com idade entre 18 e 70 anos, com bom status de desempenho (ECOG ≤1), clearence de creatinina ≥ 60 mL/min, não elegíveis para tratamento curativo e com pelo menos uma lesão mensurável (RECIST v 1.1).
Os participantes foram randomizados (1:1) para receber o regime TPEx ou o esquema EXTREME, estratificados por status de desempenho, evolução da doença, tratamento prévio com cetuximabe e país de origem. Os autores descrevem que o regime TPEx consistiu em docetaxel 75 mg / m² e cisplatina 75 mg / m² no dia 1 e cetuximabe nos dias 1, 8 e 15 (400 mg / m² no dia 1 do ciclo 1 e 250 mg / m² semanalmente), todos por via intravenosa. Quatro ciclos foram repetidos a cada 21 dias com apoio de fator estimulador de colônia de granulócitos (G-CSF). Em caso de controle da doença após quatro ciclos, cetuximabe 500 mg / m² foi continuado como terapia de manutenção, até progressão ou toxicidade inaceitável.
No regime EXTREME, os pacientes receberam fluorouracil 4000 mg / m² no dia 1–4, cisplatina 100 mg / m² no dia 1 e cetuximabe nos dias 1, 8 e 15 (400 mg / m² no dia 1 do ciclo 1 e 250 mg / m² semanalmente subsequentemente), todos administrados por via intravenosa. Seis ciclos foram administrados a cada 21 dias seguidos de manutenção com cetuximabe 250 mg/m2 em regime semanal. O suporte com G-CSF não foi obrigatório. O endpoint primário foi a sobrevida global (SG) na população com intenção de tratar (ITT). A análise também considerou o perfil de segurança em todos os pacientes que receberam pelo menos uma dose de quimioterapia ou cetuximabe.
Resultados
Entre 10 de outubro de 2014 e 29 de novembro de 2017, 541 pacientes foram inscritos e randomizados para TPEx (N = 271) ou EXTREME (N= 270). Dois pacientes do grupo TPEx não foram incluídos na análise final por problemas com o termo de consentimento. O acompanhamento mediano foi de 34,4 meses (IQR 26,6-44,8) no grupo TPEx e de 30,2 meses (25,5–45,3) no grupo EXTREME.
A sobrevida global não diferiu significativamente entre os braços de análise (mediana de 14,5 meses [IC 95% 12,5–15,7] no grupo TPEx e de 13,4 meses [12,2–15,4] no EXTREME; razão de risco 0,89 [IC 95% 0, 74–1, 08]; p = 0,23).
No corte de dados foram reportados 503 eventos de progressão da doença ou morte em ambos os grupos: 248 no grupo TPEx (225 eventos de progressão e 23 mortes) e 255 no EXTREME (231 eventos de progressão e 24 mortes). Não houve diferença significativa de sobrevida livre de progressão (HR 0,90 (IC 95% 0,75–1,07). De acordo com a revisão central independente, a taxa de resposta objetiva avaliada por imagem também não diferiu significativamente entre os dois grupos na semana 12, quando 57% dos pacientes no grupo TPEx alcançaram resposta objetiva (oito respostas completas, 100 respostas parciais) em comparação com 59% dos tratados no grupo EXTREME (11 respostas completas, 95 respostas parciais; p = 0, 64).
“Mostramos bons resultados de sobrevida do regime TPEx, semelhantes àqueles observados no ensaio inicial de Fase 2, mas sem melhora significativa na sobrevida global em comparação com o regime EXTREME”, explicam os autores. No entanto, quando considerada a sequência de tratamento, análise post-hoc mostrou que pacientes no grupo TPEx tratados com imunoterapia com inibidores de PD-1 ou PD-L1 na segunda linha (17%) alcançaram sobrevida global mediana de 21,9 meses, achado que sugere benefício importante com essa sequência terapêutica.
Em relação ao perfil de segurança, 214 (81%) de 263 pacientes no grupo TPEx contra 246 (93%) de 265 pacientes no braço EXTREME tiveram eventos adversos de grau ≥3 durante a quimioterapia (p <0, 0001). No Grupo TPEx, 118 (45%) de 263 pacientes tiveram pelo menos um evento adverso grave contra 143 (54%) de 265 pacientes no grupo EXTREME. A proporção de pacientes que recebeu o número de ciclos planejado foi significativamente maior no grupo TPEx vs EXTREME (194 [72%] de 269 vs 119 [44%] de 270; p <0 · 0001).
“Embora o ensaio não tenha atingido seu principal endpoint, sem melhora significativa na sobrevida global com TPEx versus EXTREME, o regime TPEx mostrou perfil de segurança mais favorável”, conclui a análise de Guigay et al. publicada no Lancet Oncology.
O regime TPEx permitiu um curso mais breve de quimioterapia (quatro ciclos em vez de seis ciclos), um esquema de tratamento menos frequente com cetuximabe na manutenção e foi mais bem tolerado, permitindo melhor qualidade de vida.
“No nosso meio, quando pensamos no paciente recidivado, o que chama a atenção é a necessidade de taxa de resposta. O primeiro dado sobre o TPEx mostrou sobrevida mediana de 14,5 meses, com alta taxa de resposta”, observa a oncologista Aline Chaves, do Grupo Brasileiro de Câncer de Cabeça e Pescoço (GBCCP). “Agora, este estudo mostra benefícios adicionais, incluindo um ciclo de tratamento menor e uma dose de cisplatina inferior à utilizada no esquema EXTREME, o que diminui o risco de dpv e de uma toxicidade maior”, analisa Aline.
Os dados reportados no Lancet Oncology por Guigay et al. também corroboram o impacto do regime TPEx na prática clínica. “Embora nosso ensaio não tenha atingido seu objetivo principal, os resultados podem mudar a prática e o regime TPEx pode ser uma alternativa ao regime EXTREME no tratamento de primeira linha de pacientes com HNSCC recorrente ou metastático, especialmente para aqueles com PD-L1 negativo, não elegíveis a pembrolizumabe, pacientes com alta carga tumoral ou sintomas em que a resposta rápida é um objetivo-chave do tratamento ou, ainda, para pacientes contraindicados ao fluorouracil”, destacam os autores .
Este estudo está registrado na ClinicalTrials.gov: NCT02268695.
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Com altas taxas de resposta e mediana de sobrevida global de 14,5 meses, regime TPEx (docetaxel-platina-cetuximabe) mostrou resultados de eficácia e segurança que impactam a prática clínica no tratamento do câncer de cabeça e pescoço recorrente ou metastático. Na segunda linha, a SG alcançou 21,9 meses em pacientes tratados com inibidores de checkpoint imune, achado que sugere benefício importante com essa sequência de tratamento. A análise é dos oncologistas Aline Chaves e Vinícius Carrera, em vídeo na TV Onconews. Assista.
Referências:
Guigay J et al. Cetuximab, docetaxel, and cisplatin versus platinum, fluorouracil, and cetuximab as first-line treatment in patients with recurrent or metastatic head and neck squamous-cell carcinoma (GORTEC 2014-01 TPExtreme): a multicentre, open-label, randomised, phase 2 trial. Lancet Oncol. 2021; (published online March 5.) https://doi.org/10.1016/S1470-2045(20)30755-5