Stephan Stilgenbauer (foto), da Universidade de Ulm, na Alemanha, apresentou no ASH 2015 um estudo pivotal de fase II realizado para avaliar a eficácia do venetoclax em pacientes com leucemia linfocítica crônica (LLC) com deleção do cromossomo 17p. Os onco-hematologistas Nelson Hamerschlak, coordenador do Programa de Hematologia e Transplantes de Medula Óssea do Hospital Israelita Albert Einstein, e Jacques Tabacof, do Centro Paulista de Oncologia (CPO), do Grupo Oncoclínicas, comentaram o estudo.
"O Venetoclax é um inibidor de bcl 2 altamente efetivo na leucemia linfocítica crônica e em outras doenças B", resume Nelson Hamerschlak.
Segundo Jacques Tabacof, aproximadamente 8-10% dos pacientes com leucemia linfocítica crônica apresentam a deleção 17p. “Pacientes com deleções do 17p ou mutações do gene TP53 respondem de forma insatisfatória às terapêuticas convencionais como o regime FCR (fludarabina, ciclofosfamida e rituximabe), com mediana de sobrevida livre de progressão de apenas 12 meses como observado no estudo alemão CLL8. O transplante alogênico de medula óssea é uma opção para este grupo de alto risco, mas devido à idade avançada, comorbidades e disponibilidade de doadores pode ser realizado apenas na minoria dos casos. Por isso, existe uma busca constante de novas formas de tratamento para estes pacientes”, afirma.
Em um estudo prévio de fase I, venetoclax demonstrou uma taxa de resposta global de 77% em pacientes com LLC recidivado ou resistente ao tratamento. Agora, o estudo apresentado na 57ª ASH mostrou os resultados da investigação que avaliou o uso de venetoclax em um total de 107 pacientes com doença recidivada ou resistente. “Os dados foram apresentados em uma sessão que reúne trabalhos encaminhados tardiamente ao Congresso da Associação Americana de Hematologia e mesmo assim aceitos pelo programa científico. Apenas estudos de alta relevância são aceitos nestas condições e este foi um deles, demonstrando sua importância", explica Hamerschlak.
A amostra pesquisada recebeu venetoclax uma vez por dia com uma programação de dose semanal escalonada (20, 50, 100, 200, 400 mg) durante um período de 5 semanas. Os pacientes permaneceram na dose diária de 400 mg até progressão da doença ou interrupção por outra razão.
O endpoint primário foi a taxa de resposta global, avaliada por uma comissão independente. A eficácia foi examinada quando os pacientes completaram 36 semanas de venetoclax, experimentaram progressão da doença ou interromperam a participação no estudo.
Os objetivos secundários incluíram resposta completa e resposta parcial, tempo para a primeira resposta, duração da resposta, sobrevida livre de progressão, sobrevida global, proporção de pacientes que realizaram transplante de células-tronco hematopoiéticas e segurança.
Métodos e resultados
Um total de 107 pacientes foram inscritos no grupo principal (junho de 2013-junho de 2014). A mediana de idade foi de 67 anos (37-85) anos; 65% eram do sexo masculino. A média de regimes anteriores foi de 2 (1-10). 78 pacientes (72,9%) tinham recebido antes fludarabina (F), sendo que 34 (37,4%) eram refratários; 54 (50,5%) receberam bendamustina (B) anteriormente, e 27 (50%) foram refratários. Com exceção de um paciente, todos tinham deleção do 17p. Entre 83 pacientes, 60 (72,3%) tinham mutação no TP53. A partir do cut-off de dados (30 de abril de 2015), o tempo médio de estudo foi de 12,1 meses (0.03-21.5) meses.
A taxa de resposta global foi de 79,4% (IC 95%: 70,5% -86,6%).De todos os respondentes, 84,7% mantiveram a resposta aos 12 meses. Mais de 20% dos respondedores tinham células de leucemia indetectáveis após a terapia. Mais de 10% dos pacientes obtiveram respostas "profundas" (ou seja, nenhuma doença detectável ou apenas nódulos mínimos restantes na medula óssea), um preditor de remissão a longo prazo que não havia sido previamente relatado nessa população.
O tempo médio da primeira resposta foi de 0,8 meses (0.1-8.1); tempo médio para resposta completa foi de 8,2 meses (3,0-16,3). Mediana global de duração da resposta, sobrevida livre de progressão e sobrevida global não foram alcançados. As taxas de sobrevida livre de progressão e sobrevida global aos 12 meses foram 72,0% e 86,7%, respectivamente.
A toxicidade foi aceitável nesta população de paciente de risco extremamente alto. Os eventos adversos em ≥20% dos pacientes foram neutropenia (43%), diarreia (29%), náusea (29%), anemia (27%), e fadiga (22%). Eventos adversos de graus 3/4 em ≥10% pacientes foram neutropenia (40%; 25 grau 4), anemia (18%), e trombocitopenia (15%). 22,4% dos pacientes tiveram neutropenia de qualquer grau no início do estudo. Infecção ≥ grau 3 ocorreu em 20% dos pacientes, sendo a pneumonia a mais comum (5%).Entre 11 mortes, sete foram devido à doença progressiva, e quatro devido a eventos adversos.
Os resultados sugerem que venetoclax é uma opção promissora para esta população de pacientes com LLC muito difícil de tratar caracterizada pela deleção do 17p.
“Os resultados do Venetoclax são impressionantes nos casos recidivados e refratários de leucemia linfocítica crônica. No entanto, sua maior importância ao lado dos medicamentos que atuam na sinalização da célula B, é sua eficácia em pacientes com mutações p53 e deleção do cromossomo 17", esclarece Hamerschlak.
O especialista lembra que casos como esses eram selecionados exclusivamente para transplantes de medula óssea, o que nem sempre é possível devido a idade avançada dos pacientes. "O estudo RESONATE 2 mostra que este medicamento é altamente eficaz neste subgrupo de pacientes. Interessante notar que a principal complicação deste medicamento, que é a síndrome de lise tumoral, comprova, a sensibilidade das células tumorais a este medicamento. Enfim, estamos vivendo uma nova época da leucemia linfocítica crônica", comemora.
Tabacof acrescenta que o estudo mostrou uma alta taxa de respostas de início rápido e de forma geral duradouras. “Aproximadamente 80% dos pacientes responderam ao venetoclax e 85% mantiveram a resposta com um ano de acompanhamento. Os efeitos colaterais foram manejáveis, consagrando o venetoclax como um dos principais medicamentos do moderno arsenal para o tratamento da LLC”, conclui.
Referência: Venetoclax (ABT-199/GDC-0199) Monotherapy Induces Deep Remissions, Including Complete Remission and Undetectable MRD, in Ultra-High Risk Relapsed/Refractory Chronic Lymphocytic Leukemia with 17p Deletion: Results of the Pivotal International Phase II Study [LBA-6]