Gustavo Prado (foto), pneumologista do Incor e do ICESP, abordou o tabagismo e carga de morte por câncer e mostrou que 15% de todos os gastos da área da saúde são empregados no tratamento e reabilitação de doenças relacionadas ao tabaco.
A carga que o tabagismo impõe à sociedade do ponto de vista de morbimortalidade é de 7 milhões de óbitos, de acordo com dados do Global Burden of Disease1 e uma repercussão em anos de vida ajustados para disfunção e incapacidade de 170 milhões, principalmente às custas de doenças cardiovasculares, neoplasias, infecções e doenças respiratórias crônicas, tanto em homens quanto em mulheres. Quando se fala em neoplasias, o câncer de pulmão vem como principal causa, com até 80% dos casos associados ao tabagismo2.
"Estimativas apontam que 15% de todos os gastos envolvidos na área da saúde - o equivalente a 1% do PIB – acabam sendo empregados no tratamento e reabilitação de doenças relacionadas ao tabaco." |
O impacto sobre os sistemas de saúde é brutal. Estimativas apontam que 15% de todos os gastos envolvidos na área da saúde - o equivalente a 1% do PIB – acabam sendo empregados no tratamento e reabilitação de doenças relacionadas ao tabaco, sem contar dados de absenteísmo laboral, gastos da previdência e outros gastos indiretos3.
Gustavo Prado, que apresentou o tema no 4º Simpósio Internacional Oncoclínicas discorda com a visão ainda bastante difundida de que o tabaco é lucrativo. “Basta analisar um conjunto limitado de dados, que considera 15 doenças tabaco-relacionadas, para constatar que não há lucro algum. A arrecadação com impostos pagos pelo setor do tabaco é de 6,3 bilhões enquanto os gastos anuais com despesas de saúde chegam a 21 bilhões 4.
Em outra frente, os números mostram que, apesar do sucesso de diversas políticas de controle e combate ao tabagismo no âmbito populacional (como as políticas nacionais, responsáveis pela redução na prevalência de tabagismo em adultos de 35% ao final da década de 1980 para abaixo de 15%, atualmente), individualmente experimentamos um progresso muito lento nas taxas de sucesso no tratamento farmacológico e comportamental dos fumantes.
A consequência no mundo real é que a imensa maioria dos pacientes chega aos serviços de saúde com estadios avançados, entre III e IV, em uma realidade que indica um prognóstico ruim e convida a pensar em modelos potencialmente capazes de apontar cenários mais promissores.
Prevenção e rastreamento
“Prevenção, redução do tabagismo, ao lado de medidas populacionais de controle, restrição, banimento, aumento da taxação, educação para a população, oferta de tratamento e outras tantas ações ilustram intervenções possíveis para reduzir a prevalência do tabagismo”, explica. Se no câncer de pulmão, a ênfase é na prevenção, como podemos aliar essas diferentes estratégias em uma política de rastreamento?”, propõe o especialista.
O ponto de intersecção leva à estratégia de rastreamento, que tem justamente o objetivo de Identificar os doentes em fase pré-clínica, assintomática, preferencialmente através de um teste com baixo risco de complicação, de forma preventiva. O National Lung Screening Trial5 avaliou uma amostra de 53.454 pessoas com carga tabágica de pelo menos 30 maços/ano e os resultados mostraram que o rastreamento teve impacto de 20% na redução de risco de morte por câncer de pulmão.
National Lung Screening Trial
Braços | N |
Nódulos ≥ | Câncer | Mortes por câncer | Redução de risco |
TCBD | 26455 |
18.146 | 1060 |
346 | 20% |
RX |
26232 |
5043 | 941 |
425 | referência |
“Houve um stage shift, com mais diagnósticos de casos precoces do que tardios, evitando o viés de overdiagnosis. A cada round que o exame era realizado, o valor preditivo aumentava”, destacou Prado.
Em termos de farmacoeconomia, os dados apresentados pelo especialista a partir de evidências da literatura mostram que o custo por QALY varia de US$18,45 mil dólares/ano a US$64 mil dólares por ano de vida salvo e em torno de de 80 mil dólares/ano de vida ajustado pela qualidade, ainda acima do ICER (razão incremental de custo-efetividade, que é o valor obtido quando dividimos o custo adicional de uma determinada intervenção pelo efeito desta intervenção na população avaliada) sugerido pela OMS, que recomenda como custo-efetivas as medidas de políticas públicas que custem até o valor de 1 PIB per capita para cada ano de vida ajustado para qualidade ganho na população em questão.
“Ainda é um programa caro, precisamos ver como implementar de forma efetiva e aliada à cessação do tabagismo”, concluiu.
Referências
1 -GBD, The Lancet, Vol.388, Nº 10053, Oct 2016
2 - Ann.Epidemiol. 2015 Mar (25)3 188-192;Lancet, 2003.362:847-852
3 - Ekpu and Brown. Tobacco Use insights 2015;8-1-35
4- ACTBr, 2012
5 – New England J Med 2011;365;396-409