A ASCO GU abriu a agenda científica da oncologia com os destaques do panorama geniturinário. Dois estudos apresentados durante a sessão oral de câncer de próstata demonstraram a efetividade da radioterapia hipofracionada. “Estes dois estudos mostraram resultados de não inferioridade tanto no controle local da doença, como com relação à toxicidade", explica Eduardo Weltman (foto), presidente da Sociedade Brasileira de Radioterapia (SBRT).
"O aumento na precisão da dose com técnicas conformadas por IMRT e VMAT e a maior confiabilidade no posicionamento do paciente e na detecção dos órgãos internos com as diversas técnicas de IGRT têm permitido aumentar o tamanho da fração de radioterapia (hipofracionamento) e, consequentemente, diminuir o número de dias de tratamento”, acrescenta.
Em pacientes de baixo risco, estudo1 apresentado por W. Robert Lee, da Duke University School of Medicine, concluiu que que em homens com câncer de próstata de baixo risco, a radioterapia hipofracionada não é inferior ao esquema convencional. Em outro estudo, David P. Dearnaley, do Royal Marsden NHS Foundation Trust, mostrou que em 62 meses o tratamento hipofracionado de 60 Gy em 20 frações não é inferior a 74 Gy em 37 frações e é superior ao tratamento hipofracionado de 57 Gy em 19 frações.
“Uma especulação radiobiológica é que o uso de frações maiores poderia ser mais efetivo no tratamento do câncer de próstata por se tratar de um tumor de resposta tardia, mas isto ainda está por ser provado”, acrescenta o especialista.
A radioterapia externa com IMRT, utilizando fracionamento convencional, tem alcançado resultados satisfatórios no tratamento do câncer de próstata, tanto no controle local da doença como na sua baixa toxicidade. “Entretanto, com o fracionamento convencional de 1,8 Gy a 2 Gy por dia, cinco dias por semana, até uma dose total entre 74 Gy e 78 Gy, o tempo que ela leva para ser aplicada, envolvendo 7 a 9 semanas de tratamento, tem sido um grande problema para os pacientes, frequentemente com dificuldade de locomoção ou atividades pessoais que impedem a regularidade em comparecer à radioterapia”, afirma Weltman.
Segundo o oncologista Fábio Schutz, do Centro Oncológico Antônio Ermírio de Moraes (COAEM), em teoria, a técnica de hipofracionamente permite tratar mais pacientes, visto que o tempo total de tratamento é menor. “Isto é importante, pois desta maneira pode-se reduzir os custos totais do tratamento e reduzir a fila de espera”, diz.
NRG Oncology RTOG 0415
Entre abril de 2006 a dezembro de 2009, W. Robert Lee e colegas designaram aletoriamente (1:1) 1115 homens com câncer de próstata de baixo risco (estágio clínico T1-2a, Gleason ≤ 6, PSA <10) para uma escala convencional (73,8 Gy em 41 frações por 8,2 semanas) ou para um esquema hipofracionado (70 Gy em 28 frações por 5,6 semanas).
O ensaio foi concebido para estabelecer com poder estatístico de 90% e alfa = 0,05 que o esquema hipofracionado resulta em 5 anos de sobrevida livre de doença, não inferior à escala convencional por mais de 7% (taxa de risco (HR) <1,52). Os endpoints secundários incluíram sobrevida livre de recorrência bioquímica e sobrevida global.
Resultados
1101 homens elegíveis foram randomizados: 547 para a escala convencional de radioterapia e 554 para o esquema hipofracionado. O seguimento médio foi de 5,9 anos. As características no baseline não foram diferentes entre os braços de tratamento.
No momento da análise,185 eventos de sobrevida livre de doença foram observados; 99 no braço de RT convencional e 86 no braço de RT hipofracionada. A sobrevida livre de doença estimada em 7 anos foi de 75,6% (95% CI 70,3, 80,1) no braço convencional e 81,8% (77,5, 85,3) no braço de RT hipofracionada.
O hazard ratio (HR) da sobrevida livre de doença (C/H) foi 0,85 (0,64, 1,14). A comparação de recorrência bioquímica (HR=0,77, (0,51, 1,17)) e da sobrevida global (HR=0,95, (0,65, 1,41)) também atingiram os critérios de não-inferioridade do protocolo.
Toxicidades gastrointestinais de graus ≥ 3 foram 3% no braço da radioterapia convencional versus 4,6% no braço hipofracionado, sendo o risco relativo de hipofracionada vs. convencional de 1,53, (95% CI 0,86, 2,83). Toxicidade geniturinária de grau ≥ 3 foi de 4,5% no braço convencional versus 6,4% no hipofracionado (risco relativo= 1.43 (0.86,2.37).
Os autores concluíam que em homens com câncer de próstata de baixo risco, 70 Gy em 28 frações em 5,6 semanas não é inferior a 73,8 Gy em 41 frações por 8,2 semanas.
Clinical trial information: NCT00331773
Estudo CHHiP
O estudo CHHiP2, apresentado por David P. Dearnaley,explorou a possibilidade de hipofracionamento para câncer de próstata localizadoutilizando dois diferentes grupos de tratamento: 60 Gy em 20 frações ao longo de 4 semanas e 57 Gy em 19 frações ao longo de 3,8 semanas. A dose padrão para radioterapia primária no câncer de próstata é 74 Gray (Gy) em 37 frações em um período de 7,4 semanas.
Pacientes com câncer de próstata localizado N0 T1b-T3a foram randomizados (1:1:1). O endpoint primário foi falha bioquímica de PSA ou recorrência clínica do câncer de próstata. Os endpoints secundários incluíram toxicidade aguda (avaliada até 18 semanas após o tratamento) e efeitos colaterais tardios em 5 anos por RTOG, LENT-SOM e resultados relatados por pacientes.
Métodos e resultados
3.216 pacientes foram randomizados entre 2002 e 2011; 1065 (74 Gy), 1074 (60 Gy), 1077 (57Gy). As características no baseline foram bem equilibradas em todos os grupos: idade média de 69 anos; grupos de baixo risco NCCN 15%, risco intermediário 73%, e alto risco 12%. Com seguimento médio de 5,2 anos, a taxa livre de progressão em cinco anos (95% CI) foi de 88,3% (86,0%, 90,2%) para 74 Gy; 90,6% (88,5%, 92,3%) para 60Gy: e 85,9% (83,4, 88,0) para 57Gy.
Mais eventos adversos foram observados com 57Gy em comparação com 60Gy; HR57/60: 1,44, 90% CI (1,18, 1,75), log-rank p=0,003. Não foi observada diferença significativa na toxicidade RTOG aguda de bexiga ou intestino entre as escalas de radioterapia hipofracionada.
Em conclusão, os autores observaram que com 62 meses, o tratamento hipofracionado de 60 Gy em 20 frações não é inferior a 74 Gy em 37 frações e é superior ao tratamento hipofracionado de 57 Gy em 19 frações. O tratamento de 60 Gy em 20 frações é associado a um pequeno aumento dos efeitos secundários intestinais tardios em comparação com 57 Gy.
Clinical trial information: ISRCTN97182923.
Referências:
1 - NRG Oncology RTOG 0415: A randomized phase III non-inferiority study comparing two fractionation schedules in patients with low-risk prostate cancer - J ClinOncol 34, 2016 (suppl 2S; abstr 1)
2 - Comparison of hypofractionated high-dose intensity-modulated radiotherapy schedules for prostate cancer: Results from the phase III randomized CHHiP trial (CRUK/06/016) - Citation: J Clin Oncol 34, 2016 (suppl 2S; abstr 2)