Um estudo randomizado de fase II (LBA 10000) apresentado na ASCO 2017 mostrou que a intervenção psicológica chamada Conquer Fear reduziu substancialmente o medo de recorrência imediatamente após sua aplicação, bem como após três e seis meses. Quem comenta os resultados do trabalho é a psico-oncologista Natalia Pavani (foto), do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (HAOC).
*Por Natália Pavani
Pacientes oncológicos passam por longos períodos sendo expectadores assíduos de sua condição de saúde. Frequentemente, e até diariamente, têm notícias sobre como estão o número de células que, até então, nem sabiam que existiam. Mais que isso, sabem como estas células se comportam dentro de parâmetros comparativos com a população saudável. Não obstante, eles passam longos períodos se sentindo protegidos e tratados – tanto pela disponibilidade de acesso à equipe de cuidados quanto pela ação, em seu organismo, das medicações rotineiras. Contudo, chega o dia em que é dito que estão curados! E que podem passar a ter uma vida qualitativa como a população geral (pautada em sensações), não mais em dados quantitativos, por exemplo, de seu hemograma.
Além do impacto que o processo de adoecimento por si só pode gerar na vida do sobrevivente de câncer, ele ainda é convocado a lidar com a ameaça da recidiva. Esta ameaça pode dificultar a continuidade do curso de sua vida, assim como a construção de novos objetivos. O medo da possibilidade da recidiva traz consigo a sensação de fracasso do tratamento anterior, assim como a angústia da possibilidade de reviver o sofrimento já experienciado. Desta forma, intervenções que visem minimizar o medo de recidiva em pacientes oncológicos se fazem necessárias.
A característica da intervenção Conquer Fear nos traz um enfoque metodológico que se mostrou mais eficiente do que as técnicas tradicionais de relaxamento já consagradas pela literatura científica no manejo de ansiedade, depressão e estresse. No entanto, devemos observar que a metodologia empregada, como apontada pelos próprios autores, deve ser ajustada para outras realidades. Isto, pois os pacientes têm uma agenda já atribulada de compromissos e há uma necessidade de garantir um melhor parâmetro de custo-efetividade nas ações com esta população. Inclusive, seria importante observar uma população de mesma coorte, mesmo diagnóstico e sem um distanciamento tão grande da data de alta médica (momento considerado como cura).
A Conquer Fear se propõe abordar de maneira ampla e objetiva os principais aspectos relacionados ao manejo do medo de recidiva em sobreviventes de câncer. De forma direta, ela visa capacitar os pacientes a aceitarem a possibilidade inerente de recidiva do câncer (questão muitas vezes negada ou negligenciada) e os ajuda a reconstruir objetivos pessoais que não necessariamente são aqueles que outrora lhe trazia sentido de vida (dado que a experiência do adoecimento tende a alterar as percepções do paciente sobre o mundo).
Por fim, somadas às contribuições de ajustamento e controle da atenção já evidenciadas por métodos tradicionais – como por exemplo o relaxamento – o programa também propõe uma vertente profilática sobre a necessidade de continuidade de acompanhamento e rastreamento do câncer, não eximindo o paciente desta responsabilidade (mesmo com medo).
*Autora:Natalia Pavani é pós-graduada em Psico-Oncologia pelo A.C. Camargo Cancer Center, com especialização em Cuidados Paliativos (em andamento) pela Casa do Cuidar. É Psicóloga Hospitalar do Hospital Alemão Oswaldo Cruz (HAOC).
Referência: Abstract LBA10000: Long-term results of a phase II randomized controlled trial (RCT) of a psychological intervention (Conquer Fear) to reduce clinical levels of fear of cancer recurrence in breast, colorectal, and melanoma cancer survivors. - Citation: J Clin Oncol 35, 2017 (suppl; abstr LBA10000) - Jane McNeil Beith et. Al.
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ASCO 2017