Os resultados do estudo randomizado internacional de fase III TOPAZ-1 mostraram que a adição do inibidor de checkpoint durvalumabe à quimioterapia com gemcitabina e cisplatina melhorou significativamente a sobrevida global em pacientes com câncer do trato biliar avançado. “O TOPAZ-1 é o primeiro estudo de fase III a mostrar que a adição de imunoterapia à quimioterapia padrão pode aumentar a sobrevida no câncer do trato biliar, sem novos eventos adversos graves”, disse Do-Youn Oh, professora da Faculdade de Medicina da Universidade Nacional de Seul e autora principal do estudo, selecionado para apresentação oral no ASCO GI 2022. Quem analisa os resultados é o oncologista Duilio Rocha Filho (foto), chefe do Serviço de Oncologia Clínica do Hospital Universitário Walter Cantídio (UFC-CE) e membro do Conselho Científico do Grupo Brasileiro de Tumores Gastrointestinais (GTG).
O câncer do trato biliar é um tumor raro, heterogêneo e de mau prognóstico. Relatos sobre características imunogênicas do câncer do trato biliar sugerem que a inibição de checkpoint pode resultar em respostas imunes antitumorais, e atividade clínica limitada foi observada com agentes únicos em configurações avançadas. Em um estudo de Fase II, o inibidor de PD-L1 durvalumabe + gemcitabina e cisplatina (GemCis) mostrou atividade antitumoral promissora no câncer do trato biliar avançado.
Nesse estudo duplo-cego, pacientes não tratados previamente para câncer do trato biliar irressecável, localmente avançado, recorrente ou metastático, foram randomizados 1:1 para receber durvalumabe (1500 mg a cada 3 semanas [Q3W]) ou placebo + GemCis (Gem 1000 mg/m2 e Cis 25 mg/m2 nos dias 1 e 8 Q3W) por até 8 ciclos, seguido por durvalumabe (1500 mg Q4W) ou placebo até progressão da doença ou toxicidade inaceitável.
A randomização foi estratificada pelo status da doença (inicialmente irressecável, recorrente) e localização do tumor primário (colangiocarcinoma intra-hepático (55%), colangiocarcinoma extra-hepático (19%), e câncer de vesícula biliar (25%)). O estudo foi realizado nos EUA e em 17 países, incluindo os da Europa e da América do Sul. Quase 55% dos inscritos eram de países da Ásia, incluindo Coréia do Sul, Tailândia, Japão e China. O endpoint primário foi a sobrevida global (SG; endpoints secundários incluíram sobrevida livre de progressão (SLP), taxa de resposta objetiva (ORR) e segurança.
Resultados
No cut off de dados para esta análise provisória (11 de agosto de 2021), 685 pacientes foram randomizados para durvalumabe + GemCis (n=341) ou placebo + GemCis (n=344;). O endpoint primário foi alcançado: durvalumabe + GemCis melhorou significativamente a sobrevida global em comparação com placebo + GemCis (hazard ratio [HR], 0,80; 95% [CI], 0,66–0,97; p=0,021).
“O risco de morte para pacientes que receberam durvalumabe foi 20% menor em comparação com aqueles que receberam o placebo. Após um ano e meio no estudo, 35,1% dos pacientes que receberam durvalumabe ainda estavam vivos em comparação com 25,6% para placebo; em dois anos, a taxa foi de 24,9% vs 10,4%, respectivamente”, destacam os pesquisadores.
A sobrevida livre de progressão (SLP) também melhorou significativamente com durvalumabe versus placebo, com risco 25% menor de progressão da doença para aqueles que receberam a imunoterapia (HR, 0,75; 95% CI, 0,64–0,89; p=0,001). A taxa de resposta objetiva (ORR) foi de 26,7% com durvalumabe e 18,7% com placebo.
Os eventos adversos mais comuns foram anemia (experimentada por 48,2% dos pacientes), neutropenia (31,7%) e náusea (40,2%). Eventos adversos relacionados ao tratamento de grau 3/4 (TRAEs) ocorreram em 62,7% dos pacientes que receberam durvalumabe e 64,9% dos pacientes que receberam placebo. TRAEs levaram à descontinuação de qualquer medicação do estudo em 8,9% dos pacientes que receberam durvalumabe e 11,4% daqueles que receberam placebo.
“Em pacientes com câncer do trato biliar avançado, durvalumabe + GemCis melhorou significativamente a sobrevida global e sobrevida livre de progressão em comparação com placebo + GemCis com segurança gerenciável, indicando que a combinação pode representação um novo padrão de tratamento de primeira linha”, concluíram os autores.
O estudo recebeu financiamento da AstraZeneca, e está registrado em ClinicalTrials.Gov, NCT03875235.
Primeiro avanço na terapia de primeira linha do câncer avançado de vias biliares em mais de 10 anos
Por Duilio Rocha Filho, chefe do Serviço de Oncologia Clínica do Hospital Universitário Walter Cantídio (UFC-CE) e membro do Conselho Científico do Grupo Brasileiro de Tumores Gastrointestinais (GTG).
Os autores do estudo TOPAZ-1 mostraram um ganho de sobrevida mediana de 11,5 meses para 12,8 meses no braço que recebeu quimioterapia com durvalumabe, um resultado estatisticamente significativo. Além disso, houve um impacto em sobrevida livre de progressão e em taxa de resposta com a terapia combinada, sem aumento de toxicidade.
Apesar do impacto modesto na mediana, a diferença entre as curvas aumenta ao longo do tempo de seguimento. Após 2 anos, a diferença encontrada na taxa de sobrevida é clinicamente expressiva: 25% dos pacientes tratados com durvalumabe seguem vivos, comparado com apenas 10% no grupo controle.
O desenho do estudo determinava a descontinuação da quimioterapia após oito ciclos, após os quais os pacientes sem progressão seriam tratados com durvalumabe de manutenção, no braço experimental, e placebo, no grupo controle. Curiosamente, a diferença de sobrevida somente se torna aparente após seis meses de tratamento - portanto, depois da interrupção da quimioterapia. Isto levanta a hipótese do benefício estar sendo conduzido pela fase de manutenção com durvalumabe. Parece improvável, contudo, que a continuação da quimioterapia no grupo controle além do 8º ciclo viesse a eliminar a diferença encontrada entre os braços de tratamento.
Algumas observações podem ser feitas a partir das análises de subgrupo do estudo. O benefício parece mais evidente no grupo de pacientes asiáticos, que correspondeu a mais da metade da população do TOPAZ-1 - entre os pacientes não asiáticos, o hazard ratio observado com a adição de durvalumabe foi de 0,89. Além disso, o subgrupo com tumor primário em vesícula pareceu se beneficiar menos da adição da imunoterapia, uma informação que deve ser interpretada com cautela devido ao pequeno número de pacientes com esse perfil.
Em resumo, o estudo TOPAZ-1 representa o primeiro avanço na terapia de primeira linha do câncer avançado de vias biliares em mais de 10 anos e, provavelmente, será o novo padrão de tratamento. Dito isto, é preciso ponderar que a diferença entre os braços não impressiona e que a adição de durvalumabe acrescenta um custo expressivo ao tratamento. A exploração de biomarcadores será importante para refinar a população de maior benefício.
Referência: Abstract 378 - A phase 3 randomized, double-blind, placebo-controlled study of durvalumab in combination with gemcitabine plus cisplatin (GemCis) in patients (pts) with advanced biliary tract cancer (BTC): TOPAZ-1.
First Author: Do-Youn Oh, MD, PhD
Meeting: 2022 ASCO Gastrointestinal Cancers Symposium
Session Type: Oral Abstract Session
Session Title: Oral Abstract Session B: Cancers of the Pancreas, Small Bowel, and Hepatobiliary Tract
Track: Hepatobiliary Cancer
Subtrack: Therapeutics
Abstract #: 378
Clinical Trial Registry Number: NCT03875235
DOI: 10.1200/JCO.2022.40.4_suppl.378