Em pacientes com carcinoma de células renais (RCC, da sigla em inglês), metástases cerebrais tiveram expressão gênica distinta de tumores primários ou metástases em outros órgãos, e menor infiltrado de células imunes antitumorais, como aponta estudo destacado no encontro anual da associação americana para a pesquisa em câncer (AACR). O oncogeneticista José Cláudio Casali da Rocha (foto) comenta os resultados.
“O cérebro está se tornando um local metastático comum de progressão da doença em pacientes tratados com inibidores do checkpoint imune”, explicou Elshad Hasanov, da Universidade do Texas MD Anderson Cancer Center e principal autor do trabalho. ”Para desenvolver melhores tratamentos para esses pacientes, primeiro precisamos entender a biologia das metástases cerebrais e identificar os fatores que estão levando à supressão imunológica no cérebro”, disse ele.
Neste estudo, Hasanov e colegas compararam os microambientes tumorais de metástases cerebrais com aqueles de tumores primários e outros locais de metástase, usando 27 amostras de tecido (cerca de 200 mil células) de pacientes com carcinoma de células renais. As amostras coletadas foram congeladas ou fixadas em formalina e embebidas em parafina (FFPE) para preservação, compreendendo 14 amostras de metástases cerebrais, oito de tumores renais primários e cinco compatíveis com metástases extracranianas. Os pesquisadores usaram uma combinação de sequenciamento de RNA de núcleo único de amostras congeladas e transcriptômica espacial de FFPE para caracterizar a expressão gênica e as interações celulares.
A análise revelou que, em comparação com tumores primários ou metástases extracranianas, as metástases cerebrais tiveram maior infiltrado de células neuronais e gliais no microambiente tumoral, interações previamente associadas à progressão e metástases. Para os pesquisadores, a interação das células neuronais e gliais com as células imunes pode ter concorrido para suprimir a atividade imune antitumoral, através de imunossupressores presentes nas interações ligante-receptor. “Estabelecemos um atlas unicelular multitecido de metástases cerebrais de RCC, identificando 9 aglomerados principais de células malignas e estromais imunes e 37 secundários”, resumem.
O microambiente tumoral das metástases cerebrais apresentou menos células T de proliferação, células B de memória, células dendríticas e monócitos em relação a tumores primários e metástases extracranianas. Além disso, as células T e os macrófagos no cérebro foram mais propensos a expressar uma assinatura do gene M2 imunossupressor.
Os autores descrevem que as células tumorais no cérebro ainda apresentaram maior expressão de amiloide sérica A1, que promove efeitos imunossupressores em macrófagos, maior atividade dos promotores de crescimento das proteínas VEGFR e FGFR4 e maior expressão de genes que lhes permitiram se adaptar ao ambiente cerebral, incluindo genes-alvo MYC e genes envolvidos na sinalização mTORC1, na transição epitelial-mesenquimal, no metabolismo ácido graxo, na fosforilação oxidativa e resposta a espécies reativas de oxigênio.
Hasanov et al. ainda revelam que as células tumorais de metástase cerebral expressavam ligantes e receptores que induzem a proliferação de células tumorais, tanto em células autócrinas como em parácrinas.
”As características imunossupressoras identificadas em nossa análise têm o potencial de servir como biomarcadores ou alvos terapêuticos para pacientes com carcinoma de células renais que metastatizou para o cérebro. Esperamos que os resultados deste estudo contribuam para a concepção de melhores terapias para esses pacientes”, destacam.
Casali ressalta que já era sabido que implantes metastáticos, independente do sítio, precisam se adaptar às condições do ambiente para crescer. “Esse estudo translacional do M.D Anderson Cancer Center explorou particularmente as metástases renais para SNC, onde os componentes estromais e fisiológicos únicos do SNC, formados por células da glias e neuronais, são absolutamente diferentes de outros sítios de metástases. O fato de o SNC ser um verdadeiro “santuário” protegendo as metástases renais dos efeitos revolucionários da imunoterapia levou os pesquisadores a tentarem desvendar nos compartimentos únicos celulares a expressão dos genes de adaptação e as vias de sobrevivência tumoral. O estudo mostra a complexidade do processo de plasticidade adaptativa das células metastáticas para escapar dos efeitos citotóxicos do tratamento imunoterápico e que potencialmente poderiam ser alvos para futuros tratamentos”, observa.
As limitações do estudo incluem seu desenho retrospectivo e o pequeno tamanho da amostra. Além disso, amostras de metástases cerebrais foram obtidas de pacientes que haviam sido submetidos a tratamento com dexametasona antes da craniotomia, o que pode ter influenciado os resultados.
Referência: 5788: Single-cell and spatial transcriptomic mapping of human renal cell carcinoma brain metastases uncovers actionable immune-resistance targets - Elshad Hasanov et al.
Sessão: Spatial Considerations of the 3D Tumor Microenvironment
Data: Tuesday, April 18, 2023, 2:30 pm - 4:30 pm