Estudo de mundo real com participação do Instituto Nacional do Câncer (INCA) buscou avaliar características clínicas e resultados de pacientes de quatro instituições oncológicas brasileiras que recebem paclitaxel adjuvante e trastuzumabe (regime APT) para câncer de mama HER2-positivo em estágio inicial. O trabalho tem como pesquisador sênior o oncologista José Bines (foto), do INCA, e mostrou resultados menos favoráveis do que os observados no ensaio clínico que embasou o regime APT.
O ensaio APT estabeleceu paclitaxel e trastuzumabe (TH) como padrão de tratamento adjuvante para câncer de mama HER2-positivo em estágio inicial com tamanho de tumor ≤ 3 cm e até uma micrometástase linfonodal. Este estudo de fase II de braço único demonstrou resultados favoráveis a longo prazo, com taxa de sobrevida livre de doença invasiva (IDFS) em 3 anos de 98,7% (IC 95% 97,6 – 99,8%). Em uma análise atualizada, as taxas de IDFS e sobrevida global (SG) em 10 anos foram de 91,3% (IC 95% 88,3 – 94,4%) e 94,3% (IC 95% 91,8 – 98,3%), respectivamente.
Neste estudo de mundo real, o objetivo foi caracterizar a população que recebe o regime APT na prática clínica e avaliar se os resultados estão alinhados com os observados no ensaio clínico principal.
A análise incluiu pacientes com câncer de mama HER2 positivo em estágio inicial
tratados entre 2015 e 2023 em quatro instituições oncológicas brasileiras, compreendendo hospitais públicos e privados. Dados clínicos e demográficos, detalhes do tratamento e resultados foram coletados de registros eletrônicos. O endpoint primário considerou as taxas de sobrevida livre de doença invasiva (IDFS) no período de 3 e 7 anos. Endpoints secundários incluíram sobrevida global (SG) e fatores associados ao IDFS. A análise de sobrevida empregou o método Kaplan-Meier e os fatores prognósticos foram avaliados por regressão de Cox.
Os resultados foram baseados em 133 pacientes tratados com regime APT, com mediana de 56 anos de idade (variação de 20 a 83). Bines e colegas descrevem que a maioria tinha tumores grau 2 (63,4%) ou grau 3 (34,3%), sem invasão angiolinfática (76,3%) e sem carcinoma de mama de tipo especial (92,4%), com receptor de estrogênio positivo (69,9%), receptor de progesterona positivo (55,6%) e doença com linfonodo negativo (94,7%). A distribuição do estadiamento tumoral foi a seguinte: T1a (12%), T1b (23,3%), T1c (49,6%) eT2 (13,5%). A maioria dos pacientes (95,4%) recebeu o regime APT conforme recomendações, enquanto 3,8% receberam por contraindicação a outras terapias.
Em um seguimento mediano de 45,8 meses, 8 pacientes (5,8%) sofreram um evento de doença invasiva ou morte por qualquer causa: 5 (3,8%) tiveram recorrência à distância, 1 (0,8%) teve recorrência local e 2 (1,5%) faleceram sem recidiva. Esses eventos ocorreram em pacientes que receberam o regime APT de acordo com indicações padrão, exceto para um paciente com doença N+ e um contraindicado para outro regime. A taxa de recorrência de acordo com o estágio T é apresentada na tabela abaixo. A taxa de IDFS de 3 anos foi de 100% (IC 95% não aplicável). Todos os eventos ocorreram após o período de 3 anos, resultando em uma taxa de sobrevida livre de doença em 7 anos de 80,8% (IC 95% 62,7–90,7%).
Não foram identificados fatores prognósticos relacionados à IDFS. Quatro pacientes morreram durante o período do estudo, produzindo uma taxa de SG em 7 anos de 88,0% (IC 95% 61,6–96,6%).
“Embora as características iniciais desta coorte se assemelhem às do ensaio APT,
os resultados a longo prazo observados no cenário do mundo real foram menos favoráveis”, concluem os autores, que destacam a importância de mais estudos para determinar as razões desta discrepância, sublinhando a necessidade de estudos maiores de dados do mundo real.
Taxa de recorrência de acordo com estágio T
T1a (n=16) | T1b (n=31) | T1c (n=66) | T2 (n=18) | T3 (n=2 | |
Local recurrence | 0 (0%) | 1 (3.2%) | 0 (0%) | 0 (0%) | 0 (0%) |
Distant recurrence | 0 (0%) | 1 (3.2%) | 4 (6.1%) | 0 (0%) | 0 (0%) |
Referência: PO3-17-05 - Clinical Characteristics and Outcomes of Patients Receiving Adjuvant Paclitaxel and Trastuzumab (APT regimen) for HER2-Positive Early-Stage Breast Cancer in Brazil: A Real-World Evidence