Tiago Farina (foto), Diretor Jurídico e Coordenador do Núcleo de Advocacy do Instituto Oncoguia, comenta em artigo sobre a importância do preenchimento adequado do relatório médico para que o paciente consiga usufruir dos direitos que lhe são garantidos por lei.
Por Tiago Farina, Diretor Jurídico e Coordenador do Núcleo de Advocacy do Instituto Oncoguia
Passado o impacto inicial do diagnóstico de câncer, o paciente se depara com um mar de possíveis benefícios legais que podem lhe garantir mais segurança financeira, dignidade e qualidade de vida. Não são poucos os direitos: saque do FGTS, isenção de impostos, prioridade em processos administrativos e judiciais, auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, liberação de rodízio de veículos, gratuidade do transporte público, quitação do financiamento imobiliário, entre outros.
Para usufruir de parte desses benefícios, basta comprovar o diagnóstico de câncer; para outra parte, exige-se o cumprimento de outros requisitos, como incapacidade para o trabalho ou prova de sequelas que geram deficiências ou que limitam a condição de saúde do paciente. É o caso do direito à isenção de impostos para compra de veículo. A lei exige que se comprove a existência de algum tipo de deficiência. Pacientes ostomizados, por exemplo, se enquadram nessa condição, o mesmo ocorrendo com mulheres mastectomizadas que, devido a retirada dos linfonodos, passam a ter limitações no movimento dos braços.
No município de São Paulo, o paciente com câncer pode ter direito à gratuidade do transporte público se comprovar estar em tratamento de radioterapia, cobaltoterapia ou quimioterapia (exceto oral).
Apesar dos diferentes requisitos exigidos pela legislação para garantia de um ou de outro direito, há um documento em particular que sempre, invariavelmente, é exigido: o relatório médico (também conhecido como atestado médico).
O relatório médico é documento de fé pública e faz parte integrante do atendimento. Ou seja, é direito do paciente solicitá-lo e obrigação do médico assistente fornecê-lo[i].
Sem um relatório médico adequadamente elaborado o paciente terá imensa dificuldade para obter a concessão dos direitos que a lei lhe garante.
Ainda hoje, contudo, há médicos que não creditam ao atestado seu devido valor. É justamente por essa desvalorização que muitos profissionais, mesmo inconscientemente, não dedicam a devida atenção ao preenchê-lo, gerando inúmeros inconvenientes ao paciente com câncer, já bastante fragilizado pelo próprio diagnóstico da doença.
Levantamento realizado pelo CREMESP no interior de São Paulo[ii] sobre os principais motivos de recusa e devolução de atestados, identificou problemas elementares na elaboração do documento, como falta de assinatura, nome e CRM do profissional, letra ilegível, ausência da especificação sobre dias de afastamento, dentre outros.
O Conselho Federal de Medicina estabelece que, a pedido do paciente ou de seu representante legal, o médico deve atestar em relatório médico[iii]: o diagnóstico, os resultados dos exames complementares, a conduta terapêutica, o prognóstico, as consequências à saúde do paciente (inclusive sequelas que geram limitações e deficiências), o provável tempo de repouso estimado necessário para a sua recuperação. Além disso, o profissional pode sugerir o afastamento, readaptação ou aposentadoria, ponderando ao paciente, que essa decisão caberá ao médico perito[1].
Nunca é demais lembrar que os dados precisam ser registrados de maneira legível (produzi-lo em computador é uma boa maneira de resolver isso) e que a identificação do emissor deve ser feita mediante assinatura e carimbo ou número de registro no Conselho Regional de Medicina.
Diversos órgãos públicos responsáveis pela análise e concessão de benefícios legais, percebendo as imperfeições dos relatórios médicos recebidos, criaram formulários padronizados de relatórios médicos, esperando com isso reduzir o risco de o paciente perder ainda mais tempo e energia decorrente de irregularidades formais dos documentos. Apesar disso, alguns médicos ainda se recusam a preencher tais formulários alegando que são complexos e trabalhosos.
Trabalhoso ou não o seu preenchimento, o atestado médico é parte integrante do ato médico, sendo direito inalienável do paciente, podendo constituir-se falta ética, sujeita a penalidades, embaraços para seu fornecimento.
Moral da história: a atenção que o médico dá ao preenchimento dos relatórios e atestados médicos é fundamental para que o paciente usufrua dos direitos que a lei lhe garante.
Referências:
i - Código de Ética Médica (Art. 91).
Ii - Atestado médico: prática e ética - CREMESP, 2013, disponível em http://bit.ly/1UKmoI4
iii - Resolução CFM 1658/02
1 - Resolução CREMESP 126/05