Os cirurgiões Glauco Baiocchi e Reitan Ribeiro (foto), membros do Grupo Brasileiro de Tumores Ginecológicos (EVA/GBTG), analisam os estudos que concentram as atenções no encontro anual da Society of Gynecologic Oncology (SGO 2019), que aconteceu entre os dias 15 e 19 de março em Honolulu, Havaí (EUA).
Por Glauco Baiocchi e Reitan Ribeiro
Uma das sessões plenárias foi dedicada aos inibidores de PARP (iPARP). Como os estudos publicados nos últimos anos têm demonstrado robusta eficácia e benefício em sobrevida dos iPARP para as pacientes com câncer de ovário epitelial, o objetivo dos estudos passa a também predizer tolerabilidade e qualidade de vida, assim como o momento ideal do uso e mecanismos de resistência.
Foram apresentados resultados parciais do estudo PRIMA/GOG3012 referentes ao ajuste de dose do niraparib baseado no peso (<77kg) ou plaquetas (<150mil), sendo a dose iniciada de 200mg. O PRIMA é um estudo fase III finalizado e não apresentado que avaliou o uso de niraparib vs. placebo como manutenção no tratamento primário do câncer de ovário independente de mutação BRCA. Esse subgrupo de pacientes apresenta maior risco de toxicidade com uso da dose de 300mg, baseado em experiência prévia do estudo NOVA. Com ajuste primário da dose foi demonstrado uma redução de 80% em plaquetopenia grau 4 e transfusões, assim como redução significativa de toxicidade hematológica e não hematológica grau ≥3.
No cenário da recidiva, também foram avaliados peso e plaquetas como preditor de redução de dose do niraparib no estudo QUADRA, que avaliou o uso de niraparib como monoterapia em pacientes politratadas ≥4 linhas. A redução da dose (300mg para 200mg) precoce não sugeriu impacto negativo em sobrevida e confirma a individualização de dose baseada no peso (<77kg) ou plaquetas (<150mil).
Uma análise exploratória do estudo ARIEL3 (rucaparib na recidiva platina sensível) buscou avaliar o papel da idade na eficácia e segurança do uso do rucaparib. Não houve diferença em relação à sobrevida livre de doença quando comparadas as faixas de idades de <65 anos, 65-74 e ≥75 anos. O perfil de segurança encontrado foi igual entre os grupos, porém com aumento do ajuste de dose para idade ≥65 anos.
Foi apresentada uma importante análise do estudo NOVA (niraparib de manutenção na recidiva platina sensível) de qualidade de vida em relação ao tempo sem sintomas ou toxicidade (TWiST) que sugere que as pacientes que usaram o iPARP tiveram um tempo maior livre de sintomas ou toxicidade relacionada a fadiga, náusea e vômitos quando comparado ao grupo placebo.
Ainda na sessão de inibidores de PARP, outro interessante estudo multi-institucional de Essel et al. avaliou o uso pela segunda vez de iPARP em 22 pacientes que já tinham usado iPARP na recidiva. Os resultados sugerem que a exposição ao iPARP não significa resistência ao iPARP em tratamento posterior.
Na sessão de Late Breaking Abstracts, quatro estudos merecem destaque. Em dois deles foi avaliado o uso de imunoterapia no câncer de ovário. No estudo JAVELIN Ovarian 200 (Avelumab ± Doxorrubicina Lipossomal vs. Doxorrubicina Lipossomal isolada no câncer de ovário platino resistente/refratário), o uso do imunoterápico avelumab junto à doxorrubicina lipossomal mostrou atividade baixa (taxa resposta 13%) e não houve impacto em sobrevida. Já no estudo uni-institucional, fase II, Zsiros et al. avaliaram o uso combinado de pembrolizumabe, bevacizumabe e ciclofosfamida oral no câncer de ovário recidivado (75% platino resistente). Foram incluídos 40 casos e os resultados sugerem ser um esquema com boa qualidade de vida, taxa de resposta global de 40%, doença estável em 55% dos casos e com controle de doença em 6 meses de 65%.
Outros 2 importantes estudos mostraram seus resultados parciais. O WISP (EUA; n=190/270) e o TUBA (Holanda; n=384/510) têm como objetivo avaliar a viabilidade, segurança e qualidade de vida (incluindo escala de arrependimento) da estratégia da realização de salpingectomia com ooforectomia redutora de risco postergada para pacientes com mutação germinativa de BRCA. Ambos mostraram diminuição de preocupação a favor da salpingectomia e a taxa de arrependimento global foi baixa. Ambos não são estudos randomizados e o método a ser realizado era escolhido pelas pacientes.
No estudo TUBA foi encontrado 1 caso de câncer oculto no grupo de salpingectomia (1/255) e 1 caso no grupo de salpingooforectomia (1/109), escala de arrependimento semelhantes e resultado de qualidade de vida ainda não apresentado. No estudo WISP a escala de arrependimento, apesar de baixa, foi maior para o grupo de salpingooforectomia, sendo esse ainda relacionado com maiores sintomas de menopausa. No estudo WISP nenhum câncer de ovário foi encontrado em ambos grupos. Nos 2 estudos não houve aparecimento de câncer de ovário no intervalo entre a salpingectomia e ooforectomia postergada, mostrando-se viáveis e seguros para continuidade. Importante lembrar que não é recomendada a salpingectomia com ooforectomia postergada fora de estudo clínico e está sendo planejado um estudo internacional (n=3.000) subsequente.
Por fim, foram apresentados os resultados com seguimento atualizado do importante estudo LACC, fase III que avaliou a cirurgia minimamente invasiva vs. aberta no câncer do colo do útero. Os resultados mostraram clara manutenção de maior sobrevida livre de doença e sobrevida global a favor da cirurgia via aberta.