Grupos brasileiros estudam alternativas que podem baratear o custo dos cuidados com o câncer. Abordagens buscam promover maior agilidade no diagnóstico do melanoma e economia nas técnicas de marcação e localização de tumores de mama.
Um smartphone ou uma câmera digital simples, aliados a um software compatível com qualquer computador, podem facilitar o rastreamento do melanoma ao realizar uma pré-triagem para encaminhamento ao especialista. A metodologia, desenvolvida no mestrado de David Antônio Sbrissa Neto (foto), pesquisador do Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da USP, consiste em um banco de 143 imagens (69 melanomas e 74 não-melanoma - nevos melanocíticos displásicos ou não), que permite o reconhecimento de padrões das lesões via computador.
A demanda partiu da dermatologista Ana Gabriela Salvio, profissional do Departamento de Tumores da Pele do Hospital Amaral Carvalho de Jaú (HAC), e coordenadora do Programa Contínuo de Prevenção do Melanoma do hospital. “Pensamos em um modelo de diagnóstico precoce justamente para utilizar nesses programas de prevenção. Por enquanto, nosso rastreamento depende do dermatologista ter conhecimento em dermatoscopia, o que acaba restringindo um pouco nossa atuação. A ideia desse projeto seria possibilitar que clínico geral, o médico de família, que muitas vezes não tem como foco a dermatologia, pudesse verificar lesões suspeitas com mais segurança e facilitar a triagem entre lesões benignas e malignas”, explica Ana Gabriela.
As imagens foram cedidas pelo Hospital Amaral Carvalho e pelo A.C.Camargo Cancer Center, em São Paulo. Ainda não é possível a alimentação do banco de imagens por outros centros de câncer, mas os autores do projeto acreditam que com a evolução do protótipo esse seria um caminho interessante. “Quanto mais imagens tivermos, melhor será a acurácia do sistema”, afirma David.
Como funciona
São tiradas fotos das lesões suspeitas e é feito um recorte delimitando a área. A partir daí, o computador processa informações daquela lesão específica e faz uma análise da curvatura das lesões melanocíticas para verificar as diferenças entre um nevo e um melanoma. Essas características são comparadas com o material do banco de dados, indicando tratar-se de uma lesão maligna ou benigna. David explica que o objetivo é fazer uma pré-triagem dos casos que aparentemente seriam os mais críticos, para que a biópsia possa ser feita de maneira mais assertiva. “É como um atalho para encaminhar mais rápido ao especialista aquelas lesões que necessitam de uma análise mais aprofundada. De maneira nenhuma a tecnologia vai substituir a avaliação humana. É um facilitador que busca suprir a carência de especialistas, agilizar o processo e baratear o custo”, explica David.
No futuro, a ideia é disponibilizar o software gratuitamente para postos de saúde e centros detratamento de câncer. “O método conseguiu especificidade de 73% e sensibilidade de 89%, o que faz dele um instrumento promissor. Ainda é preciso mais pesquisas, aplicar em populações maiores. Temos um novo estudo sendo desenhado para aplicarmos esse software na população-alvo do nosso programa de prevenção do melanoma”, adianta Ana Gabriela.
Sementes radioativas
Outro projeto de pesquisa busca melhorar a técnica de localização radioguiada em pacientes com câncer de mama, diminuindo custos e proporcionando mais agilidade e conforto à paciente. No método usual, primeiro a paciente faz uma biópsia e, caso seja necessária uma cirurgia, ela tem de retornar ao hospital e fazer novamente a localização da lesão, seja com a colocação de uma agulha ou de uma substância radioativa. “Ela precisa vir várias vezes ao hospital, tendo um custo relativamente alto, tanto da agulha quanto da colocação do fitato, do tecnécio”, explica o mastologista Sergio Mendes, do Hospital Beneficência Portuguesa, em São Paulo.
O projeto de Mendes em parceria com outros profissionais do hospital e com a participação do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN) propõe substituir essa agulha, ou a substância, pelo implante de sementes de iodo – 125. Produzida no Brasil, a tecnologia da semente radioativa é desenvolvida pelo IPEN e utilizada no câncer de próstata para localizar a área que vai receber radioterapia, mas seu uso em tumores de mama é inédito. “Quando a paciente faz a biópsia, a semente já é implantada utilizando a mesma cânula. Não precisa voltar ao hospital, fazer outro exame, injetar tecnécio. Se o cirurgião julgar necessária a operação, ele localiza a semente com o equipamento gama-probe intra-operatório e retira a lesão”, afirma Mendes. Por outro lado, se na avaliação for determinado que a lesão não deve ser retirada, a semente marca o local da biópsia, como hoje é feito com o clipe metálico.
Vantagens
Além do conforto para as pacientes que diminuem a quantidade de tratamentos invasivos, a semente proporciona maior precisão da área de marcação. A sensibilidade do probe comparado ao fitato foi de 0,5 cm contra 2,0 a 2,5 cm, respectivamente, oferecendo uma segurança maior de localização da lesão e permitindo que se faça uma cirurgia menos agressiva. O custo é outra vantagem da técnica. “Essa semente custa em torno de R$90 e os valores dos procedimentos de tecnécio e colocação da agulha giram em torno de R$600, podendo chegar a mil reais. É um custo alto. No âmbito do sistema público de saúde isso pode representar uma economia muito grande”, afirma.
O método é especialmente eficaz em pacientes com tumores avançados que irão receber quimioterapia neoadjuvante. Nessas pacientes, a semente é colocada no centro do tumor e em nódulos axilares. Em um grande número de casos, com o tratamento neoadjuvante, o tumor deve reduzir ou desaparecer, principalmente o nódulo axilar. Durante o tratamento cirúrgico, a semente permite ao cirurgião saber exatamente onde estava aquela lesão na mama e qual linfonodo estava comprometido. “A semente dura de 6 a 7 meses, o que permite que se faça todo o tratamento. Ao voltar para o centro cirúrgico ela ainda está radioativa e conseguimos localizar as lesões”, diz Mendes.
O método já foi utilizado em 30 pacientes com 100% de localização da lesão e permitindo a centralização da semente na peça operatória, o que facilitou o estudo de margens. “Nossos resultados mostram que o implante de semente radioativa nas lesões de mama é econômico, de rápida curva de aprendizado, seguro e diminui o número de procedimentos”, concluiu Mendes.