Entre os 10 tipos de câncer mais prevalentes na população brasileira, seis deles, incluindo câncer de mama na pré e pós-menopausa, colorretal e próstata, estão associados a alimentação inadequada, excesso de gordura corporal, sedentarismo e consumo de bebidas alcóolicas. O alerta integra a publicação ‘Dieta, nutrição, atividade física e câncer: uma perspectiva global’, lançada pelo Instituto Nacional do Câncer dia 16 de outubro. O documento é uma tradução adaptada do III Relatório de Especialistas desenvolvido pelo Fundo Mundial de Pesquisa em Câncer (WCRF) e pelo Instituto Americano para Pesquisa em Câncer (AICR), e inclui dados epidemiológicos e recomendações que consideram o cenário brasileiro.
O objetivo é contribuir para a redução da incidência de câncer por meio de padrões saudáveis de alimentação e atividade física, além de subsidiar políticas públicas.
Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) apontam que de 30 a 50% dos casos de câncer poderiam ser prevenidos por modos de vida mais saudáveis. “Nessa porcentagem, além da exposição ao tabaco, radiação solar e algumas infecções, também estão incluídas a alimentação saudável, a manutenção do peso corporal adequado e a prática de atividade física”, esclarece Maria Eduarda Melo, da Coordenação de Prevenção e Vigilância (Conprev) do INCA.
O cenário preocupa. Nos últimos anos, ocorreu um crescimento no consumo de alimentos ultraprocessados, acompanhado pelo aumento na prevalência de sobrepeso e obesidade na população. “De acordo com os inquéritos nacionais, enquanto, na década de 1970, 24% da população adulta apresentava excesso de peso, na primeira década de 2000, os valores quase dobraram, com 41% da população adulta apresentando sobrepeso e obesidade. Dez anos depois, esses valores saltaram para 57%, sendo que aproximadamente 82 milhões de brasileiros com mais de 18 anos estão acima do peso adequado”, destaca o documento.
A nutricionista observa ainda que os cânceres atribuíveis à má alimentação, consumo de bebida alcóolica, inatividade física, excesso de peso e ao não aleitamento materno impõe uma carga econômica significativa para o país. “Em 2018, os gastos do Governo Federal com o tratamento oncológico, tanto ambulatoriais, quanto hospitalares, foram em torno de 3,5 bilhões de reais. Destes, aproximadamente 537 milhões de reais são gastos atribuíveis à má alimentação, ao consumo de bebida alcóolica, inatividade física, excesso de peso e não aleitamento materno. Esses valores dão a dimensão da importância do investimento nos diferentes níveis de prevenção do câncer”, diz.
Leandro Fórnias Machado de Rezende, professor-adjunto do Departamento de Medicina Preventiva da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo, explica que aproximadamente 27% dos casos de câncer e 34% das mortes por câncer poderiam ser evitados mediante a redução de fatores de risco relacionados a estilo de vida. “A alimentação inadequada corresponde a 5% dos casos de câncer no Brasil (22 mil casos), aproximadamente 5% dos casos são atribuíveis ao excesso de peso e obesidade (21 mil casos), consumo de álcool 3,8% (16 mil casos) e falta de atividade física 2,5% (10 mil casos)”, esclarece. “As ações de prevenção ainda estão essencialmente pautadas na prevenção secundária, mas esses números reforçam a necessidade de enfocar a prevenção primária”, ressalta.
Entre as recomendações presentes no documento estão a manutenção do peso corporal saudável, dentro dos limites recomendados de IMC; atividade física como parte da rotina diária; alimentos de origem vegetal como base da alimentação; evitar o consumo de alimentos ultraprocessados, bebidas açucaradas e fast food; limitar o consumo de carne vermelha a até 500 gramas por semana; evitar o consumo de carnes processadas, bebidas alcoólicas; amamentar, sempre que possível, até dois anos ou mais, oferecendo somente leite materno nos primeiros seis meses; e não fazer uso de suplementos alimentares para prevenção do câncer.
Segundo os especialistas, existem benefícios quando as recomendações são seguidas de forma isolada, mas é importante que os profissionais de saúde possam trabalhar as recomendações de uma forma integrada. “Cada uma das recomendações tem relevância para as outras e há interações entre as exposições que elas abordam. Recomendações integradas promovem um padrão saudável de alimentação e atividade física propício para a prevenção do câncer, outras DCNTs e obesidade”, concluem.