Publicado no periódico Acta Dermatovenerologica Croatica (ADC), estudo de revisão1 de pesquisadores brasileiros do Instituto Nacional do Câncer (INCA) buscou traçar um panorama do melanoma da mucosa, uma forma rara de neoplasia que representa 1% dos casos de melanoma. O trabalho identifica vários aspectos relacionados à epidemiologia da doença, diagnóstico tardio e dificuldades no tratamento. O estomatologista Daniel Cohen (foto) é o primeiro autor do trabalho.
Os melanomas de mucosa (MM) são tumores primários malignos originados de melanócitos localizados nas membranas mucosas da cavidade nasal e seios acessórios, cavidade oral, lábios e faringe, vulvar, vaginal ou útero, anorretal ou basicamente qualquer outra parte do forro da superfície da mucosa.
Ao contrário dos melanomas cutâneos, o melanoma da mucosa não está associado à exposição à radiação ultravioleta. Esses melanomas geralmente ocorrem em locais ocultos, que em combinação com a falta de sinais específicos precoces, contribuem para o atraso no diagnóstico e mau prognóstico da doença.
Estadiamento
Uma classificação TNM específica está disponível apenas para lesões cutâneas e oculares, e existe um sistema simples para melanoma da mucosa de cabeça e pescoço baseado em 3 estágios: estádio I: doença limitada ao sítio primário; estádio II: doença com metástase linfonodal cervical; e estádio III: doença com metástase à distância2.
Os autores ressaltam a necessidade da implementação de sistemas de estadiamento apropriados para outros locais de melanoma da mucosa, não apenas para fornecer estadiamento adequado, mas também planejamento de tratamento e prognóstico para os pacientes3.
Tratamento
A ressecção de margem livre dos tumores é geralmente difícil devido à localização complicada das lesões e à natureza multifocal da doença4. A ressecção cirúrgica é frequentemente a primeira abordagem para os tumores primários, embora a utilidade da cirurgia de linfonodos e da radioterapia não esteja bem estabelecida5. No entanto, a radioterapia pode ser usada como tratamento adjuvante; nos casos em que as lesões são irressecáveis, a radioterapia definitiva pode ser considerada.
“Apesar do manejo locorregional agressivo, a doença recorrente é comum e o tratamento permanece desafiador. Novas técnicas moleculares, como o sequenciamento completo do exoma, tornaram-se rotineiras para auxiliar o tratamento do paciente e mostram-se extremamente promissoras no tratamento de doenças raras e geralmente fatais, como os melanomas da mucosa”, afirmam os autores, que destacam ainda a terapia-alvo contra mutações ativadoras de c-KIT, frequentemente vistas em MMs, e a imunoterapia como modalidades de tratamento promissoras.
Uma revisão sistemática com metanálise do tratamento do MM do trato respiratório superior revelou que a ressecção cirúrgica com radioterapia pós-operatória continua sendo o padrão-ouro para o controle locorregional. Nenhum estudo investigou a qualidade de vida, a mortalidade relacionada ao tratamento ou à morbidade.
Fatores prognósticos e resultados do tratamento
Vários fatores de risco independentes para a progressão da doença devem ser considerados, como sexo masculino (p = 0,047), estágio avançado do tumor (p = 0,001), doença nodal (p = 0,001) e ressecção incompleta (p = 0,001). Os MMs do trato genital feminino apresentam a maior sobrevida global (P = 0,030), juntamente com os pacientes sem ulceração (P = 0,004).
Fatores de risco multivariados para sobrevida global são estágio de metástase ao diagnóstico (P = 0,002) e ressecção incompleta do tumor primário (P = 0,001). Entre todos os melanomas de mucosa, os melanomas anorretais estão associados ao pior prognóstico6.
“A triagem de mutações nos genes NRAS, KIT e BRAF no MM pode se mostrar benéfica no futuro próximo, embora não haja evidências sólidas sobre seu real potencial, bem como novas terapias-alvo em melanomas cutâneos7”, observam os autores.
Referências:
1 - An Update on Mucosal Melanoma: Future Directions - Daniel Cohen Goldemberg, Luiz Claudio Santos Thuler, Andreia Cristina de Melo - Acta Dermatovenerol Croat. 2019 Mar;27(1):11-15.
2 - Ascierto PA, Accorona R, Botti G, Farina D, Fossati P, Gatta G, et al. Mucosal melanoma of the head and neck. Crit Rev Oncol Hematol. 2017;112:136- 52.
3 - Mihajlovic M, Vlajkovic S, Jovanovic P, Stefanovic V. Primary mucosal melanomas: A comprehensive review. Int J Clin Exp Pathol. 2012;5:739-53.
4 - Ballester Sanchez R, de Unamuno Bustos B, Navarro Mira M, Botella Estrada R. Mucosal melanoma: an update. Actas Dermosifiliogr. 2015;106:96- 103.
5 - Tacastacas JD, Bray J, Cohen YK, Arbesman J, Kim J, Koon HB, et al. Update on primary mucosal melanoma. J Am Acad Dermatol. 2014;71:366-75.
5 - Heppt MV, Roesch A, Weide B, Gutzmer R, Meier F, Loquai C, et al. Prognostic factors and treatment outcomes in 444 patients with mucosal melanoma. Eur J Cancer. 2017;81:36-44.
7 - Dréno M, Georges M, Espitalier F, Ferron C, Charnolé A, Dréno B, et al. Sinonasal mucosal melanoma: A 44-case study and literature analysis. Eur Ann Otorhinolaryngol Head Neck Dis. 2017;134:237- 42.