Onconews - Braquiterapia intersticial no tratamento do câncer de mama

Robson_Ferrigno_NET_OK_2.jpgA edição de janeiro de 2017 do periódico Lancet Oncology publicou os resultados de um estudo multicêntrico de 16 Instituições de sete países europeus, prospectivo e randomizado, que comparou tratamento adjuvante do câncer de mama com braquiterapia intersticial e radioterapia externa de toda a mama1. Robson Ferrigno (foto), Coordenador dos Serviços de Radioterapia da Beneficência Portuguesa, comenta com o trabalho exclusividade para o Onconews.

O estudo, chamado “GEC – ESTRO trial”, incluiu 1328 mulheres a partir de 40 anos de idade com câncer de mama invasivo inicial ou in situ (estádios 0 a IIA) entre 2004 e 2009. Com seguimento mediano de 6,6 anos, os autores reportaram incidência semelhante nos dois grupos de toxicidades graus 2 ou maior em cinco anos (p=0,12). O resultado cosmético bom e excelente, tanto pela avaliação da própria paciente como pela visão do médico foi semelhante nos dois grupos e sempre acima de 90%. A única diferença encontrada, estatisticamente diferente, foi a incidência de toxicidade tardia cutânea graus 2 e 3 em cinco anos maior nas pacientes tratadas com radioterapia externa de toda a mama (10,7% versus 6,9%; p=0,020).
 
Comentários
 
Trata-se de um estudo fase III prospectivo e randomizado, portanto, com nível 1 de evidência. Um ano antes, na edição de janeiro de 2016, o periódico Lancet publicou os resultados de não inferioridade desse estudo com relação ao controle local e sobrevida global2.
 
A braquiterapia intersticial é uma das técnicas de radioterapia parcial da mama (RPM), além da radioterapia intra-operatória, braquiterapia com balão intracavitário (mammosite) e radioterapia conformada do quadrante acometido. É realizada através da introdução de catéteres no leito operatório, por dentro dos quais será inserido um material radioativo, no caso o Irídio 192, que liberará radiação de forma concentrada na área do implante.
 
Vários estudos retrospectivos da literatura mostram que não há diferença entre irradiar toda a mama ou apenas o quadrante ou leito tumoral nos casos de câncer de mama inicial tratados com cirurgia conservadora. O principal estudo randomizado publicado sobre esse assunto é de Budapest. Trata-se de uma experiência uni Institucional da Hungria que randomizou 258 pacientes com câncer de mama inicial tratadas com cirurgia conservadora entre radioterapia de toda a mama e RPM com braquiterapia intersticial ou radioterapia externa localizada no quadrante (31% das pacientes). Os resultados com seguimento mediano de 10,2 anos foram publicados em 2013 no periódico Radiother Oncol3. O controle local, sobrevida global e sobrevida livre de doença foram semelhantes nos dois grupos de tratamento. O resultado cosmético foi melhor no grupo de pacientes tratadas com RPM, porém, no braço controle, a radioterapia utilizada para irradiar toda a mama foi realizada com técnica antiga e sem tecnologia que permita, como atualmente, distribuir a dose de forma homogenia em toda a mama.
 
As melhores candidatas para RPM, conforme recomendações das principais Sociedades de especialidade americanas, são as com idade a partir de 50 anos, tumores primários até 2 cm, sem extensão intraductal, axila negativa e com receptores de estrógeno positivo.
 
O estudo GEC – ESTRO é atualmente o mais importante sobre RPM devido ao grande número de pacientes, porém, ainda possui seguimento curto para conclusões mais seguras a respeito da segurança da estratégia da braquiterapia com relação ao controle local e sobrevida ao longo prazo. Com relação aos resultados cosméticos e de toxicidade tardia, pode-se com certeza considerar a estratégia da RPM com braquiterapia como aceitável e com a vantagem da toxicidade cutânea tardia ser ligeiramente menor.
 
A principal vantagem da braquiterapia intersticial adjuvante no câncer de mama é o tempo de tratamento mais curto. A liberação de dose é feita ao longo de cinco dias úteis, quando a paciente recebe as inserções do material radioativo duas vezes ao dia.

A principal desvantagem desse procedimento é fato de ser invasivo e gerar desconforto para a paciente durante os cinco dias que permanece com os cateteres inseridos. Uma limitação do método, principalmente no Brasil, é a ausência de fontes pagadoras, principalmente entre a grande maioria das mulheres no Brasil que se encontram no âmbito do SUS. Entre as usuárias de planos de saúde, tal tratamento não se encontra no rol de procedimentos da ANS. Portanto, ao se optar pela estratégia da braquiterapia intersticial, há um custo financeiro adicional para a paciente, variável de acordo com a Instituição.
 
Com base nos dois estudos randomizados publicados (1 – 3), a braquiterapia intersticial adjuvante, após tratamento conservador, para tratamento do câncer de mama em estádios iniciais, é uma opção aceitável e, uma vez que há disponibilidade dessa técnica, deve-se conversar com a paciente sobre os prós e contras de tal método.
 
Referências:
 
1 - Polgar C, Hildebrandt G, Kaver-Dorner D, et al. Late side-effects and cosmetic results of accelerated partial breast irradiation with interstitial brachytherapy versus whole-breast irradiation after breast-conserving surgery for low-risk invasive and in-situ carcinoma of the female breast: 5-year results of a randomised, controlled, phase 3 trial. Lancet Oncol 2017. Published online January 13, 2017
 
2 - Strnad V, Ott OJ, Hildebrandt G, et al. 5-year results of accelerated partial breast irradiation using sole interstitial multicatheter brachytherapy versus whole-breast irradiation with boost after breast-conserving surgery for low-risk invasive and in-situ carcinoma of the female breast: a randomised, phase 3, non-inferiority trial. Lancet 2016; 387: 229–38.
 
3 - Polgar C, Fodor J, Major T, et al. Breast-conserving therapy with partial or whole breast irradiation: ten-year results of the Budapest randomized trial. Radiother Oncol 2013; 108: 197–202. 

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