A onco-hematologista Laura Maria Fogliatto (foto), do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, fala dos principais resultados do estudo SGN 35-006 que embasou a aprovação de brentuximabe vedotina no retratamento de pacientes com linfoma de Hodgkin (LH) e linfoma anaplásico de grandes células sistêmico (LAGCs). “Teremos mais esta possibilidade de ajudar os pacientes a sobreviverem mais e com melhor qualidade de vida”, avalia a especialista.
A ANVISA ampliou a indicação de brentuximabe vedotina (Adcetris®), agora também aprovado para o retratamento de pacientes adultos com linfoma de Hodgkin e linfoma anaplásico de grandes células sistêmico (LAGCs) que progrediram ou são refratários ao tratamento primário e que tenham tido resposta positiva à terapia anterior com brentuximabe vedotina.
A decisão de aprovar o retratamento também foi adotada pela agência europeia, a EMEA, baseada nos dados de eficácia e segurança do estudo multicêntrico de fase 2 SGN35-006 - Parte A (Treatmentwith SGN-35 in patients with CD30-positive hematologicmalignancieswhohavepreviouslyparticipated in an SGN-35 study).
O estudo foi desenhado para avaliar o retratamento com brentuximabe vedotina em pacientes com linfoma de Hodgkin (n=20) ou LAGCs (8 pacientes) que recorreram após resposta anterior ao tratamento com o anticorpo droga-conjugado. Os objetivos primários foram segurança e resposta anti-tumoral. Os objetivos secundários foram duração do controle do tumor, incluindo tempo de resposta, sobrevida livre de progressão (SLP) e sobrevida global (SG).
Brentuximabe vedotina é um anticorpo-droga conjugado anti-CD30, que atua seletivamente na oncoproteína expressa no linfoma de Hodgkin clássico e no linfoma anaplásico de grandes células, bem como em outros subtipos de linfoma. É o primeiro tratamento aprovado pelo FDA para linfoma de Hodgkin desde 1977 e o primeiro especificamente indicado para o tratamento de LAGCs.
Os efeitos colaterais mais comuns experimentados com Adcetris® foram neutropenia, trombocitopenia, neuropatia sensorial e periférica, fadiga, náuseas, anemia, infecção respiratória superior, diarreia, febre, tosse e vômitos.
A cada ano, mais de 62 mil casos de Linfoma de Hodgkin são diagnosticados no mundo, aproximadamente 4 mil novos casos no Brasil – 60% em homens.
Quais os principais desfechos e os resultados apresentados pelo ensaio que embasou o retratamento?
Os resultados do estudo SGN35-006 foram publicados na Revista Journal of Hematology and Oncology em 2014 e os pacientes que participaram tinham feito parte do estudo de registro que deu origem a aprovação de brentuximabe vedotina (BV) em todo o mundo. Estes pacientes de Linfoma de Hodgkin (LH) e Linfoma Anaplásico de Grandes Células Sistêmico (LAGCs), que haviam utilizado BV e finalizado o tratamento em remissão parcial (RP) ou resposta completa (RC), quando recidivassem da doença, e em qualquer momento após o fim do tratamento anterior, poderiam realizar o retratamento nos mesmos moldes em relação à dosagem e números de ciclos. A principal hipótese do estudo foi documentar se os pacientes poderiam ter uma nova resposta ao tratamento e se este novo curso de ciclos de BV era seguro. A eficácia do retratamento nos 20 pacientes com LH avaliados foi de 30% de RC e 30% de RP, com a taxa de resposta objetiva (TRO) de 60%. A duração mediana da resposta foi 9,2 meses em pacientes que alcançaram a TRO. Já a eficácia do retratamento nos 8 pacientes com LAGCs (3 pacientes foram retratados duas vezes) com o total de 11 experiências de retratamento, resultaram em 6 RCs (55%) e 4 RPs (36%), para uma TRO de 91% segundo a nova bula aprovada e disponível no site da ANVISA. A duração mediana da resposta foi de 8,8 e 12,3 meses em pacientes que atingiram RO (RC + RP) e RC, respectivamente.
O que significa a oportunidade do retratamento para médicos e pacientes brasileiros?
Isso representa uma esperança para estes pacientes que recidivam após o 1º curso de tratamento com o BV. Os pacientes podem, pelos resultados dos estudos, novamente obter uma TRO e consequentemente melhor sobrevida livre de progressão da doença, sobrevida global e qualidade de vida. Outro ponto importante é que o retratamento pode levar o paciente a uma nova resposta e mais adequada antes do Transplante Alogênico de Células Tronco. O Transplante é uma modalidade de tratamento consolidada internacionalmente com resultados comprovados e melhores quando temos prévio ao Transplante uma remissão mais adequada (RP ou RC), o que pode acontecer segundo o estudo de retratamento SGN35-006. O transplante alogênico sempre faz parte do plano futuro para os pacientes recidivados/refratários e que têm um doador compatível e disponível.
Em resumo, o estudo confirma que brentuximabe vedotina não é só uma droga para induzir a remissão, mas também tem papel em pacientes politratados?
Sim, com certeza. O resultado do estudo de registro que aprovou o BV no mundo todo mostrou respostas nunca antes alcançadas no cenário de recidiva e refratariedade, tanto no LH como no LAGCs, com mediana de sobrevida de 40 meses. Além destes pacientes serem politratados, 71% deles eram refratários primários e 100% tinham recidivado pós – transplante autólogo, situação muito ruim e que em média leva a uma sobrevida mediana de 12 a 24 meses. Agora, com o estudo de retratamento SGN35-006 teremos mais esta possibilidade de ajudar estes pacientes a sobreviverem mais e com melhor qualidade de vida.
O que dizer do perfil de toxicidade?
Todo tratamento tem toxicidades. O perfil de toxicidade do BV é tranquilo e manejável. No estudo de registro do produto, as maiores complicações são relacionadas à neuropatia periférica motora e/ou sensorial, náuseas e fadiga, acometendo, respectivamente, 56, 34 e 32 % dos pacientes, todas elas, porém, de graus leve a moderado. No estudo de retratamento, esta neuropatia aumentou de frequência e intensidade, acometendo 69% dos pacientes. Porém, a maioria (85%) dos pacientes apresentou melhora ou resolução de seus sintomas neuropáticos até o final do tratamento. A iarréia também se tornou mais frequente e os pacientes com alterações pulmonares prévias de tratamentos quimioterápicos anteriores merecem uma atenção maior do médico, segundo a nova bula aprovada na ANVISA.
Qual o take home message para a onco-hematologia brasileira?
Apesar de o estudo ter um número pequeno de pacientes (20 de LH e 8 de LAGCs), os resultados são animadores com taxas de repostas objetivas de 60 e 91% nos LH e LAGCs respectivamente. Os pacientes têm uma nova possibilidade de maior tempo de sobrevida livre de progressão da doença, maior sobrevida global e maior qualidade de vida se compararmos aos tratamentos históricos que tínhamos com a poliquimioterapia no passado. Além disso, brentuximabe vedotina pode ajudar e muito na melhor remissão antes do transplante alogênico, estratégia esta importantíssima para todos os pacientes com este plano de tratamento. E, por fim, o BV é de fácil manejo de dosagem e dos efeitos colaterais apresentados na bula.