Inibidores de mTOR e corticosteroides representam um regime imunossupressor favorável para indivíduos com transplante renal com carcinoma espinocelular cutâneo (CEC) avançado recebendo imunoterapia. É o que sugere estudo de fase I com cemiplimabe reportado no Journal of Clinical Oncology (JCO). “Estamos cada vez mais próximos de conseguir oferecer o melhor tratamento disponível para os pacientes com CEC de pele em condições de imunossupressão”, diz Carolina Cardoso (foto), oncologista do Grupo de tumores cutâneos e músculo-esqueléticos do Grupo Oncoclínicas, que comenta os resultados.
A imunossupressão crônica é necessária para prevenir a rejeição de órgãos, mas pode atenuar a resposta antitumoral com inibidores de PD-1 em indivíduos transplantados. Participantes que receberam transplante de órgãos sólidos foram excluídos dos ensaios de imunoterapia, devido à preocupação com a rejeição do aloenxerto, apesar do risco aumentado de câncer de pele.
Cemiplimabe foi aprovado para o tratamento de carcinoma espinocelular cutâneo localmente avançado ou metastático. Neste estudo de fase I, este imuno-oncológico foi avaliado em receptores de transplante renal com CEC avançado. Os participantes foram expostos a inibidor de rapamicina alvo em mamíferos (mTOR), com redução gradual de dose, e corticosteroides em dose pulsada (prednisona 40 mg uma vez ao dia, no dia anterior e nos dias 1-3 de cada ciclo, seguido de 20 mg uma vez ao dia nos dias 4-6, depois 10 mg uma vez por dia até o dia anterior de cada ciclo subsequente). Os pacientes receberam cemiplimabe 350 mg por via intravenosa uma vez a cada 3 semanas até 2 anos e foram avaliados quanto à resposta a cada 8 semanas. O endpoint primário foi a taxa de rejeição renal e os principais endpoints secundários incluíram taxa e duração da resposta e sobrevida.
Os resultados relatados no JCO mostram que, entre os 12 pacientes tratados, nenhuma rejeição ou perda renal foi observada. Em cinco dos 11 pacientes avaliáveis foi observada resposta ao cemiplimabe (46%; IC 90%, 22 a 73), incluindo dois com respostas duradouras por mais de um ano. O seguimento mediano foi de 6,8 meses (variação de 0,7 a 29,8).
Em relação à segurança, eventos adversos de grau 3 ou superior relacionados ao tratamento ocorreram em cinco pacientes (42%), incluindo diarreia, infecção e distúrbios metabólicos. Um paciente morreu de angioedema e anafilaxia atribuídos ao cross-taper do inibidor mTOR.
Diante desses achados, os autores concluem que o inibidor de mTOR e os corticosteroides representam um regime imunossupressor favorável para receptores de transplante renal com carcinoma espinocelular cutâneo avançado recebendo imunoterapia. Esta combinação resultou em respostas antitumorais duráveis sem eventos de rejeição renal.
O estudo em contexto
Por Carolina Cardoso, oncologista clínica do Grupo de tumores cutâneos e músculo-esqueléticos do Grupo Oncoclínicas
Pacientes transplantados são considerados parte de um grupo de risco para desenvolvimento de neoplasias cutâneas, aumentando em até 250 vezes o risco deste tipo de câncer quando comparados à população em geral. Além disso este é um perfil populacional excluído dos principais trials clínicos que fizeram uso da imunoterapia, que é um tratamento revolucionário para tal tipo de tumor.
Sendo assim, temos uma urgência em entender como podemos garantir um tratamento eficaz para pacientes portadores de CEC de pele e ao mesmo tempo reduzir os riscos de rejeição do transplante. O estudo em questão abre as portas para entendermos melhor sobre este cenário, que é crucial no manejo de pacientes com neoplasias cutâneas, especialmente CEC de pele em imunossuprimidos.
É bom saber que estamos cada vez mais próximos de conseguir oferecer o melhor tratamento disponível para os pacientes com CEC de pele em condições de imunossupressão com riscos mais baixos de rejeição do rim enxertado. Além do mais, conhecendo o comportamento dos pacientes transplantados renais em uso de Cemiplimabe, podemos abrir portas para estudarmos com mais segurança sobre o uso da medicação em outros cenários de imunossupressão e em transplantados de outros órgãos. É um grande início e representa um passo importantíssimo para os pacientes com CEC de pele localmente avançado ou metastático.
Esse estudo foi financiado pela Regeneron Pharmaceuticals e está registrado na plataforma ClinicalTrials.gov: NCT04339062.
A íntegra do artigo no JCO está disponível em acesso aberto.
Referência: Glenn J. Hanna et al., Cemiplimab for Kidney Transplant Recipients With Advanced Cutaneous Squamous Cell Carcinoma. JCO 0, JCO.23.01498. DOI:10.1200/JCO.23.01498