Estudo da American Cancer Society demonstrou que pacientes com câncer que relataram maior satisfação na comunicação com seu provedor de cuidados em saúde recebem cuidados mais eficientes, com menos visitas ao consultório e melhores resultados do tratamento. O trabalho foi publicado no Journal of National Comprehensive Cancer Network (JNCCN). “Estudos como esse reforçam a comunicação adequada como ferramenta fundamental no tratamento oncológico”, afirma o médico geriatra e paliativista André Filipe Junqueira dos Santos (foto), vice-presidente da Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP).
"O estudo sugere que quando a comunicação dos prestadores de cuidados em câncer é eficaz, os pacientes são mais propensos a seguir o aconselhamento médico e os protocolos de medicação", disse o autor principal, Ashish Rai, Pesquisador de Sobreviventes e Serviços de Saúde na American Cancer Society. “Sobreviventes de câncer diferem de outros pacientes em relação às necessidades e expectativas sobre a comunicação com seu médico. Geralmente são idosos e mais propensos a apresentar outras comorbidades. Ser diagnosticado com câncer e receber informações complexas sobre tratamento, custos e prognóstico podem causar ansiedade. Além disso, existe o medo de uma possível recorrência. Todos esses fatores podem tornar os sobreviventes de câncer particularmente sensíveis em sua percepção sobre bons cuidados ou comunicação”, acrescentou.
Os pesquisadores utilizaram dados do Medical Expenditure Panel Survey (MEPS) entre 2008 e 2014 para acompanhar os resultados de 4.588 sobreviventes de câncer; 2.257 tinham entre 18 e 64 anos (mediana de 54 anos); os outros 2.321 participantes tinham 65 anos ou mais (mediana de 75 anos).
A satisfação com a comunicação foi medida pelo Consumer Assessment of Healthcare Providers and Systems (CAHPS), em conjunto com os dados do MEPS. Os pacientes usaram uma escala de quatro pontos variando de "nunca" a "sempre" para rastrear se seus provedores (1) ouviam com atenção, (2) forneciam explicações de maneira facilmente compreensível, (3) mostravam respeito pelo que o paciente tinha a dizer, e (4) dispendiam tempo suficiente na consulta com o paciente. Uma escala global de zero a dez graus de satisfação também foi considerada em uma pontuação composta e rastreada ao longo de 12 meses. Os resultados foram analisados com base no número de visitas ao departamento de emergência, visitas ao consultório e gastos totais com a saúde (incluindo medicação e custos extras).
Resultados
Em ambos os grupos etários, o maior grau de satisfação foi associado a menos comorbidades, menos consultas e ausência de visitas ao departamento de emergência no primeiro ano, sugerindo que circunstâncias de saúde mais complexas impactaram negativamente a percepção dos pacientes sobre sua comunicação.
Entre os pacientes idosos, a maior satisfação no ano 1 foi associada a melhor saúde mental no segundo ano (tercil 1 [T1]: margem preditiva [PM], 27,1%; tercil 2 [T2]: PM, 35,5%; P = 0,013; tercil 3 [T3]: PM, 37,0%; P = 0,005) e estado geral de saúde (T1: PM, 30,3%; T3: PM, 38,9%; P = 0,007). Maior satisfação foi associada com menor número de consultas no segundo ano (T1: PM, 7,42 visitas; T3: PM, 6,26 consultas; P = 0,038) entre os não idosos; e menor gasto em saúde no ano 2 (T1 [PM, $34.071; T3: PM, $26.995; P = 0,049) entre os idosos.
“A comunicação não envolve somente a transmissão de informação, mas uma escuta ativa e compassiva do indivíduo acometido pelo câncer, oferecendo a ele a possibilidade de manifestar outros aspectos acometidos pela doença e que muitas vezes não são abordados em uma consulta padrão”, observa André, que coordena o Serviço de Cuidados Paliativos da Unidade de Emergência do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (HCFMRP-USP), e atua no Instituto Oncológico de Ribeirão Preto (InORP).
O especialista cita um estudo publicado no Journal of General Internal Medicine2 que observou que os médicos descobriam os motivos e preocupações dos pacientes em apenas 36% das consultas. Os motivos e preocupações dos pacientes eram mais frequentemente descobertos na assistência primária à saúde do que em consultas com especialistas (49% vs. 20%; P = 0,058). “Em 27 das 40 (67%) consultas, o médico interrompeu após 11 segundos, em média, com algumas interrupções ocorrendo até mesmo três segundos após o início da consulta. O treinamento em boa comunicação deve ser visto um pilar de qualidade no atendimento médico”, ressalta.
Referência:
1 - Determinants and Outcomes of Satisfaction With Healthcare Provider Communication Among Cancer Survivors - Ashish Rai, PhD; Xuesong Han, PhD; Zhiyuan Zheng, PhD; K. Robin Yabroff, PhD; and Ahmedin Jemal, PhD - J Natl Compr Canc Netw 2018;16(8):975–984 doi: 10.6004/jnccn.2018.7034
2 - Eliciting the Patient’s Agenda- Secondary Analysis of Recorded Clinical Encounters - Naykky Singh Ospina, MD, MSc1,2, Kari A. Phillips, MD3, Rene Rodriguez-Gutierrez, MD, MSc2,4,5, Ana Castaneda-Guarderas, MD6, Michael R. Gionfriddo, Pharm D, phD7, Megan E. Branda, MS8,9, and Victor M. Montori, MD MSc2 J Gen Intern Med. 2018 Jul 2. doi: 10.1007/s11606-018-4540-5