Onconews - Consumo de carne vermelha e mutações associadas a danos no DNA em pacientes com câncer colorretal

alexandre palladino inca bxPela primeira vez, um estudo identificou uma assinatura mutacional alquilante nas células do cólon vinculada ao consumo de carne vermelha e às mutações causadoras do câncer. "Sem dúvida é um dado importante e abre possibilidade para abordagens promissoras em prevenção e diagnóstico precoce", observou Alexandre Palladino (foto), chefe da oncologia clínica do Hospital do Câncer I (INCA). O trabalho foi publicado na Cancer Discovery, periódico da American Association for Cancer Research (AACR).

Em 2015, a Agência Internacional de Pesquisa sobre o Câncer (IARC) declarou que a carne processada é cancerígena e que a carne vermelha é provavelmente cancerígena para humanos. Experimentos em modelos pré-clínicos sugerem que o consumo de carne vermelha pode promover a formação de compostos cancerígenos no cólon, mas uma ligação molecular direta ao desenvolvimento do câncer colorretal em pacientes ainda não foi demonstrada. “Falta uma demonstração de que o câncer colorretal tem um padrão específico de mutações que pode ser atribuído à carne vermelha", diz Giannakis. "Identificar essas mudanças moleculares nas células do cólon que podem causar câncer não apenas apoiaria o papel da carne vermelha no desenvolvimento do câncer colorretal, mas também forneceria novos caminhos para a prevenção e tratamento do câncer", acrescenta.

Para identificar alterações genéticas associadas à ingestão de carne vermelha, Giannakis e colegas sequenciaram o DNA de tecidos normais e tumorais correspondentes de 900 pacientes com câncer colorretal que participaram de um dos três estudos de coorte prospectivos nacionais, o Nurses Health Studies e o Health Professionals Follow-Up Study. Todos os pacientes forneceram informações sobre suas dietas, estilo de vida e outros fatores ao longo de vários anos antes do diagnóstico de câncer colorretal.

Resultados

A análise dos dados de sequenciamento de DNA revelou a presença de várias assinaturas mutacionais no tecido do cólon normal e canceroso, incluindo uma assinatura alquilante não anteriormente descrita no câncer colorretal. Essa assinatura alquilante foi significativamente associada com a ingestão pré-diagnóstico de carne vermelha, processada ou não, mas não se associou com a ingestão de aves ou peixes ou com outros fatores de estilo de vida. O consumo de carne vermelha não foi associado a nenhuma das outras assinaturas mutacionais identificadas neste estudo.

Além disso, esta assinatura foi mais abundante no cólon distal, previsto para alvejar as mutações driver de câncer KRAS p.G12D, KRAS p.G13D e PIK3CA p.E5454K, e associada a uma sobrevida pobre.

Usando um modelo preditivo, os pesquisadores identificaram os genes KRAS e PIK3CA como alvos potenciais de mutação induzida por alquilação, e descobriram que os tumores colorretais com mutações driver KRAS G12D, KRAS G13D ou PIK3CA E545K, que são comumente observadas no câncer colorretal, tiveram maior enriquecimento da assinatura alquilante em comparação com tumores sem essas mutações.

A assinatura alquilante também foi associada à sobrevida do paciente: os pacientes cujos tumores tinham os níveis mais altos de danos alquilantes tinham um risco 47% maior de morte específica por câncer colorretal em comparação com pacientes com níveis mais baixos.

“Se os médicos pudessem identificar indivíduos que são geneticamente predispostos a acumular danos alquilantes, esses indivíduos poderiam ser aconselhados a limitar a ingestão de carne vermelha como forma de prevenção personalizada. Além disso, a assinatura mutacional alquilante pode ser usada como um biomarcador para identificar pacientes com maior risco de desenvolver câncer colorretal ou para detectar câncer em um estágio inicial. Por causa de sua associação com a sobrevida do paciente, a assinatura alquilante também pode ter potencial como um biomarcador prognóstico. No entanto, estudos futuros são necessários para explorar essas possibilidades”, afirmou Giannakis. 

Palladino observa que a associação de consumo de carne processada e de câncer colorretal já está bem estabelecida e existem indícios que sugerem a associação da ingestão de carne vermelha com esta neoplasia. "Este estudo é importante porque consegue associar uma assinatura mutacional no câncer colorretal com a ingestão de carne vermelha, sugerindo fortemente que, pelo menos nestes pacientes, esta associação existe. Mais estudos precisam ser realizados para avaliarmos melhor o impacto desta informação e sua utilidade nas orientações de prevenção do câncer colorretal", conclui. 

O estudo foi financiado pelo National Institutes of Health, the Stand Up To Cancer Colorectal Cancer Dream Team Translational Research Grant (co-administrado pela AACR), the Project P Fund, the Cancer Research UK Grand Challenge Award, the Nodal Award do Dana-Farber Harvard Cancer Center, the Friends of the Dana-Farber Cancer Institute, the Bennett Family Fund, e Entertainment Industry Foundation através do National Colorectal Cancer Research Alliance e Stand Up To Cancer.

Referência: Discovery and features of an alkylating signature in colorectal cancer - Carino Gurjao, Rong Zhong, Koichiro Haruki, Yvonne Y. Li, Liam F Spurr, Henry Lee-Six, Brendan Reardon, Tomotaka Ugai, Xuehong Zhang, Andrew D. Cherniack, Mingyang Song, Eliezer M. Van Allen, Jeffrey A. Meyerhardt, Jonathan A. Nowak, Edward L. Giovannucci, Charles S. Fuchs, Kana Wu, Shuji Ogino and Marios Giannakis - Cancer Discov June 17 2021 DOI: 10.1158/2159-8290.CD-20-1656