Onconews - Cronoterapia com temozolomida em pacientes com glioblastoma

camilla yamada lacog BXEstudo liderado por pesquisadores da Universidade de Washington traz evidências preliminares do benefício de sobrevida global conforme o período de administração de temozolamida em pacientes com glioblastoma. Camilla Yamada (foto), oncologista da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo, comenta os resultados do trabalho publicado na Neuro-Oncology Advances.

“Estudos pré-clinicos e in-vitro tem avaliado a importância do ciclo circadiano no metabolismo, regulação do ciclo celular e reparo do DNA e, provavelmente, na eficácia dos tratamentos oncológicos através da transcrição de genes e expressão de proteínas a depender do horário do dia”, esclarece Camilla.

Os pacientes com glioblastoma sobrevivem, em média, 15 meses após o diagnóstico, e menos de 10% sobrevivem por mais de cinco anos. Enquanto ensaios clínicos em andamento investigam novas potenciais, o estudo sugere que um pequeno ajuste no tratamento padrão atual - administrar quimioterapia pela manhã em vez de à noite - poderia adicionar alguns meses de sobrevida aos pacientes. “A cronoterapia é uma abordagem inovadora para melhorar a sobrevida por meio da entrega programada de tratamentos anticâncer de acordo com o ritmo diário do paciente”, destaca a publicação.

Este estudo retrospectivo avaliou pacientes com diagnóstico de glioblastoma multiforme entre 1º de janeiro de 2010 a 31 de dezembro de 2018 na Escola de Medicina da Universidade de Washington submetidos ao tratamento padrão que consiste em cirurgia seguido de radioterapia concomitante à temozolomida e temozolomida de manuntenção- administrada em cápsula oral - pela manhã ou à noite, dependendo da preferência dos oncologistas. O método Kaplan Meier e o modelo de regressão de Cox foram utilizados ​​para análises de sobrevida global (SG), e o método do escore de propensão foi responsável por corrigir potenciais vieses de estudo observacional. O método do tempo de sobrevida média restrita (RMST) foi realizado onde a suposição de risco proporcional foi violada.

Foram analisados 166 pacientes com GBM, com uma mediana de acompanhamento de 5,07 anos. A mediana de sobrevida global para todos os pacientes no estudo foi de cerca de 15 meses após o diagnóstico. Os pacientes que receberam temozolamida pela manhã demonstraram maior sobrevida global em comparação com aqueles que recebrram temozolomida à noite (mediana de SG, 95% CI = 1,43,1,12 ~ 1,92 vs. 1,13,0,84 ~ 1,58 anos) com uma diferença significativa de RMST no ano 1 (-0,09, IC 95%: -0,16 ~ -0,018).

No subgrupo de pacientes com tumores metilados MGMT, a sobrevida mediana com a quimioterapia matinal foi ainda mais pronunciada, com incremento em 6 meses, com diferenças significativas de RMST nos anos 1 (-0,13, 95% CI = -0,24 ~ -0,019) a 2,5 (-0,43, 95% CI = -0,84 ~ - 0,028). A superioridade da temozolamida matinal nos anos 1, 2 e 5 (todos p <0,05) entre todos os pacientes foi apoiada pela regressão da diferença de RMST após o ajuste para fatores de confusão.

“Em geral, pacientes com esse tipo de tumor tendem a responder melhor à temozolomida em geral. Para os 56 pacientes com tumores metilados MGMT, a sobrevida global média foi de cerca de 25 meses e meio para aqueles que tomaram a droga pela manhã e cerca de 19 meses e meio para aqueles que tomaram à noite, uma diferença de cerca de seis meses, que foi estatisticamente significativa”, esclarecem os autores. “A temozolomida foi aprovada para tratar o glioblastoma em 2005 com base em uma melhora de 10 semanas na sobrevida. Portanto, qualquer melhora na sobrevida além de dois meses é bastante significativa”, observam.

Para Camilla, esse é um trabalho muito interessante ao demonstrar pela primeira vez em seres humanos com GBM uma diferença em sobrevida global somente com a alteração do horário de administração do quimioterápico (manhã vs noite), sem nenhum tratamento adicional. “A despeito de ser um trabalho com muitos vieses para se mudar as recomendações em diretrizes (estudo retrospectivo, desbalanço entre os grupos, metodologia estatística utilizada para reduzir fatores confundidores entre outros), o racional da cronoterapia é real e nos instiga em sugerir o horário preferencial na administração dos tratamentos oncológicos, já que pode ter benefício numa doença tão agressiva”, observa.

“Essa estratégia já está sendo avaliada em protocolo randomizado de fase 2 (NCT02781792), que analisará prospectivamente o impacto em sobrevida global e diferenças em toxicidade entre as 2 estratégias”, afirma.

Referência: Anna R Damato, Jingqin Luo, Ruth G N Katumba, Grayson R Talcott, Joshua B Rubin, Erik D Herzog, Jian L Campian, Temozolomide chronotherapy in patients with glioblastoma: a retrospective single institute study, Neuro-Oncology Advances, 2021;, vdab041, https://doi.org/10.1093/noajnl/vdab041